25/04/2024 - Edição 540

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Bolsonaro e Salles ‘passaram a boiada’ no meio ambiente durante a pandemia, mostra levantamento

Publicado em 31/07/2020 12:00 -

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Um levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo em parceria com o Instituto Talanoa mostra que, durante a pandemia do coronavírus, o “passar a boiada” defendida pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, de fato aconteceu. Os dados mostram que o governo acelerou a publicação de atos relacionados ao setor nos meses de maior crescimento dos casos de covid-19 no país.

O Executivo publicou 195 atos no Diário Oficial —entre eles, portarias, instruções normativas, decretos e outras normas — relacionados ao tema ambiental. Nos mesmos meses de 2019, foram apenas 16 atos publicados.

Os atos do Executivo, de forma geral, servem para direcionar o cumprimento das leis e complementar sua aplicação. No entanto, a análise feita pelo estudo também aponta que uma parte dessas medidas infralegais tentou mudar o entendimento da legislação.

Algumas dessas medidas foram amplamente divulgadas pela imprensa e até questionada pelo MPF, mas algumas “boiadas” passaram despercebidas.

Um exemplo é a instrução normativa 4/2020 do Ministério do Meio Ambiente (MMA), que regula o pagamento de indenizações no caso de desapropriação de propriedades localizadas no interior de unidades de conservação.

Em artigo que trata da priorização de indenização para populações tradicionais em reservas ambientais, a instrução cria uma brecha que, na prática, facilita a expulsão de índios e quilombolas dessas áreas.

As “boiadas” do governo Bolsonaro estão concentradas em decretos e instruções normativas, segundo análise da Talanoa. Ao mesmo tempo, o governo tem dificuldade de fazer andar no Congresso projetos que podem fragilizar a área ambiental.

O levantamento da Folha e Talanoa foi feito por meio de extrações de dispositivos publicados no Diário Oficial que continham palavras-chave selecionadas. Para o tema meio ambiente, foram consideradas palavras como “extrativismo”, biodegradável” e “carga poluidora”.

Desmatamento da Amazônia pode crescer 28% neste ano

Em carta aberta encaminhada ao presidente do Conselho da Amazônia, o vice-presidente Hamilton Mourão, mais de 600 servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), alertam para um aumento de 28% no desmatamento consolidado na Amazônia entre agosto de 2019 e julho de 2020, em comparação com o mesmo período anterior.

A carta com a estimativa foi divulgada pela Associação Nacional de Servidores da Carreira de Especialista de Meio Ambiente (Ascema Nacional) no último dia 22. Além de se dirigir ao vice-presidente, ela também foi encaminhada ao presidente do IBAMA Eduardo Bim, ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEMAP), e ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli.

Os dados foram obtidos através das detecções feitas pelo Deter, o sistema de monitoramento do Inpe, que já haviam revelado um aumento de 49,7% no desmatamento na região amazônica entre agosto de 2018 e julho de 2019 em comparação com o período anterior. Se comparado o aumento do desmatamento desde ano com os números de 2017-2018, pode chegar a 72%.

Segunda a Ascema, até o dia 9 de julho, o desmatamento consolidado, comparado com o ano anterior, era 13% maior. Mas, faltam ainda 21 dias para o fim do período de medição e a tendência é que o número aumente. A área total desmatada na floresta pode chegar a 13 mil km².

“Se no mês de julho deste ano constatar-se a metade do desmatamento que tivemos em julho de 2019, fecharemos o Deter dos 12 meses com 8.672 km². Se a proporção entre o que é detectado com o Deter se mantiver na média de 66% do Prodes, podemos estimar um Prodes 2020 chegando na casa dos 13 mil km² de desmatamento na Amazônia, um aumento estimado de 28% em relação a 2019 e 72% em relação a 2018”, diz a nota.

Na manifestação técnica, os funcionários cobram proteção ao meio ambiente “somente é possível a partir de uma regulamentação ambiental adequada. Consideramos inaceitável que o cenário de pandemia seja utilizado como pano de fundo para o enfraquecimento da legislação ambiental, fazendo-se necessário, ao contrário, revisão da legislação criminal, com agravamento de penas para os crimes ambientais”.

Eles exigem também a revogação do artigo 4º do Decreto 10.341/2020, que instituiu a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), submetendo os servidores do Ibama à coordenação das Forças Armadas. A nota afirma que isso garantiria “autonomia institucional no que tange à seleção de alvos, ao emprego de estratégias e instrumentos de dissuasão estabelecidos na legislação”, refletindo em maior êxito das operações.

Na carta também tem uma crítica a eficácia da gestão financeira da GLO que, em apenas dois meses de duração, consumiu mais de R$ 124 milhões, 32% a mais do que o orçamento gasto pelo Ibama com fiscalização ambientais e combate a incêndios florestais nos 12 meses de 2019. O mesmo valor seria o suficiente para pagar o salário de 1.098 agentes de fiscalização ambiental por um ano inteiro.

Os técnicos do Ibama ressaltam que além da destruição ambientais, o avanço do desmatamento provoca prejuízos econômicos, como o enfraquecimento de relações com parceiros comerciais que adotam critérios de consumo sustentáveis, como por exemplo, o agronegócio, uma das principais fonte das exportações brasileiras, pode sofrer sanções caso os países compradores considerem que a produção é feita em áreas desmatadas ilegalmente.

“Impedir a destruição ambiental no Brasil possibilita inclusive o esvaziamento de pretextos para imposição de barreiras comerciais contra o Brasil. Seja como for, a conjugação de tais temas interessa à soberania nacional”, alertam os servidores do Ibama.


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