29/03/2024 - Edição 540

Poder

Aliados de Bolsonaro indicam parentes para cargos no governo

Publicado em 24/07/2020 12:00 -

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A indicação da filha de Braga Netto, ministro da Casa Civil, para uma vaga na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), frustrada após a divulgação, não seria algo inédito na gestão de Jair Bolsonaro. Em seu mandato, persiste a velha prática da nomeação de parentes de deputados, senadores e demais aliados em cargos do governo federal.

Em maio deste ano, o filho do senador Elmano Férrer (PODE-PI), Leonardo Férrer, tornou-se ouvidor na Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba). Ele teve um voto contrário da representante dos trabalhadores da companhia, que disse que o cargo deveria ser de um servidor de carreira.

Só na Funasa (Fundação Nacional de Saúde), entidade vinculada ao Ministério da Saúde, o governo nomeou em agosto passado a mulher do líder do PL, Wellington Roberto (PB), Deborah Roberto, e uma tia do deputado Gustinho Ribeiro (SD-SE), Maria Luiz Felix. Na superintendência do órgão na Paraíba, foi mantida a mãe do líder da maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Virgínia Velloso Borges ocupa o cargo desde 2017.

Procurado, Aguinaldo Ribeiro se restringiu a dizer, através de sua assessoria, que sua mãe foi nomeada no governo de Michel Temer. Wellington Roberto diz que a indicação de sua mulher é técnica:

“Ela é competentíssima, já trabalhou em vários órgãos aqui em Brasília e agora está na diretoria de saúde ambiental e fazendo um trabalho excelente. Está comunicando tudo ao presidente e colocando ordem por lá”.

Já o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), vice-líder do governo no Senado Federal, tem o filho, Sérgio Fernandes Ferreira, empregado em uma diretoria no Ministério do Turismo, mas nega qualquer tipo de favorecimento.

“Ele é jovem de boa formação e secretário-geral do partido. Tem vida independente e não sou eu que vou proibi-lo de atuar no governo, até porque já fiz isso durante toda minha trajetória”, afirma Izalci.

Em 17 de abril de 2019, o deputado Julio Cesar (PSD-PI) conseguiu a nomeação de sua irmã, Jacqueline Carvalho Maia, na Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). Ela é assessora da presidência da companhia, ligada ao Ministério da Agricultura.

“Eu já fui diretor administrativo da Conab em 2001, e conhecendo lá as pessoas consegui uma indicação dela. Não foi critério político, foi mais pela relação de amizade, por eu conhecer as pessoas”, diz.

Há ainda o caso da esposa do deputado federal Herculano Passos (MDB-SP), ex-vice-líder do governo, que ocupava uma secretaria no Ministério da Cidadania de maio do ano passado até fevereiro deste ano, quando saiu para disputar a prefeitura em Itu (SP). Segundo o deputado, ela foi nomeada por ter “competência técnica” e “notória experiência na área”.

O deputado Cláudio Cajado (PP-BA) também emplacou a indicação de sua mulher em um cargo no governo no ano passado. Superintendente da Funasa na Bahia de julho de 2019 até janeiro deste ano, Andreia Cajado deixou o cargo para assumir uma diretoria em uma agência no governo da Bahia. Ela é pré-candidata à prefeitura de Dias D’Ávila (BA).

“Ela tem uma atividade política independente da minha, foi prefeita três vezes, é bacharel em Direito e Geografia. A experiência dela exitosa como gestora pública foi que a levou para esse cargo”, diz Cajado.

O governo também negociou com Elmar Nascimento (BA) para manter seu irmão, Elmo Nascimento, como superintendente da Codevasf em Juazeiro (BA). Ele deixou o cargo em junho deste ano, também devido às eleições municipais.

Nepotismo cruzado

A nomeação de parentes de aliados não configura nepotismo, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso desde que não se trate de nepotismo cruzado — quando, em troca de uma indicação, o político nomeia também um parente de seu aliado.

O senador Elmano Férrer e o deputado Gustinho Ribeironão responderam aos contatos da reportagem. O deputado Elmar Nascimento se limitou a dizer que o irmão foi nomeado ainda no governo Temer.

Filha de Pazuello ganha cargo em empresa da prefeitura do Rio

A prefeitura do Rio de Janeiro nomeou Stephanie dos Santos Pazuello para a função de supervisora da Diretoria de Gestão de Pessoas da Empresa Pública de Saúde do Rio de Janeiro S.A, a RioSaúde. Ela é filha do ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello. A indicação está publicada no Diário Oficial do Rio de quinta-feira, 23.

A nomeação para o cargo de confiança tem data retroativa de 6 de julho e ocorre em meio à pandemia do novo coronavírus. A indicação da filha de um ministro do presidente Jair Bolsonaro ocorre também no momento em que o prefeito carioca, Marcelo Crivella (Republicanos), está em pré-campanha pela reeleição. Ele espera que a migração de dois dos três filhos políticos de Bolsonaro seja um trunfo no pleito, já que pesquisas mostram que ele tem mais de 70% de rejeição.

Análise

A crise do coronavírus foi implacável com os empregos. Excluindo-se os subempregados e os desalentados, há no olho da rua cerca de 13 milhões de brasileiros.

Mas, aos pouquinhos, vai ficando claro que, no lusco-fusco do convívio com o poder, as fardas são pardas. E o vício é apenas um nome que a virtude militar inventou para atrapalhar as vantagens dos outros.

Enganchar familiares no déficit público é um hábito tão arraigado que os aliados de Bolsonaro poderiam até evocar o direito consuetudinário, aquele baseado nos costumes. Bem verdade que o Supremo editou em 2008 uma súmula que proíbe o nepotismo. Mas sempre se poderá alegar que isso é coisa de toga comunista.


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