19/03/2024 - Edição 540

Ágora Digital

Incontinência verbal

Publicado em 13/03/2020 12:00 - Victor Barone

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

É dramaticamente irônico que o presidente Jair Bolsonaro tenha dito que o coronavírus não passava de uma “pequena crise”, uma “fantasia” criada pela “grande mídia”, e apenas dois dias depois um dos contaminados no Brasil venha a ser justamente o secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten. Vítima da “fantasia”? Vítima da imprensa?

O fato é que, agora, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já declarou pandemia, os casos e mortes se multiplicam rapidamente por todos os continentes, as Bolsas despencam, eventos nacionais e internacionais são cancelados, um atrás do outro, e as escolas estão sendo fechadas.

A curiosidade é por que o presidente perde todas as chances de ficar calado. Fantasia? O coronavírus já atingiu centenas de milhares de pessoas no mundo, com perto de 5 mil mortes. No Brasil, já havia em torno de 80 casos confirmados e mais de 1.400 suspeitos em vários Estados e no DF.

A Bovespa já foi suspensa quatro vezes nesta semana, com as maiores quedas desde 1998, enquanto o dólar chegou a bater em R$ 5. É para brincar com uma coisa dessas? Ou para imitar seu ídolo Donald Trump? Ou para aproveitar para jogar descrédito sobre a mídia? Melhor do que isso seria o Planalto e o Ministério da Economia seguirem o exemplo do Ministério da Saúde. Mostrar serviço, atenção, presteza. Não é essa a sensação, nem em Brasília nem no mercado.

Em meio a tudo isso, é muito preocupante, sim, que Wajngarten tenha viajado no mesmo avião do presidente e tido contato o tempo todo com ministros e assessores da comitiva presidencial a Miami. Para constrangimento geral, ele também participou do jantar de Trump para Bolsonaro na restrita Mar-a-Lago e ainda tirou foto com Trump e o vice Mike Pence com aquele boné ridículo do “Brasil great again”. Já imaginaram se ele sai contaminando a cúpula da Casa Branca?

É óbvio que Wajngarten é uma vítima, um paciente, totalmente isento de qualquer responsabilidade, mas, na prática, o presidente, a primeira-dama Michelle, o filho Eduardo, ministros e assessores da Presidência estão numa situação delicada. Não precisa isolamento, mas monitoramento e evitar aglomerações, reuniões, apertos de mão, abraços e beijos. Logo, o governo brasileiro está em “home working”.

A situação ainda vai piorar muitíssimo, antes de atingir o pico e começar a melhorar. Por enquanto, os contaminados são pessoas que estavam na Ásia, na Europa, particularmente na Itália, e têm acesso ao que há de melhor em saúde no Brasil. O problema será quando os “ricos” começarem a passar o vírus para os “pobres”. Esse será o grande teste, não apenas da saúde pública no Brasil, mas também das autoridades brasileiras, a começar do presidente e do Congresso. Não é fantasia e não se pode brincar com vida e morte.

Aliás, e se usassem para o secretário o que Abraham Weintraub usou para a educadora Priscila Cruz, após suspeita do coronavírus? Citando a Bíblia, ele comemorou: “O Senhor nosso Deus os destruirá”. Sorte que há poucos Weintraub para coisas assim.

Poir Eliane Cantanhêde

Os chamados “influenciadores” da extrema-direita brasileira saíram do negacionismo para teorias da conspiração catastrofistas sem nenhuma escala ao tratar nas redes sociais a respeito da pandemia de coronavírus. Teses como a de que o novo coronavírus é um experimento do governo chinês para acabar com os Estados Unidos sucederam no mesmo dia deboches do tipo de que o coronavírus não seria mais grave que gripes anteriores e ninguém tinha razão para se preocupar.

A mudança de tom de Donald Trump, que anunciou medidas restritivas depois de dizer que não havia motivo para preocupação, parece ter virado a chave da “alt-right” brasileira. Seria apenas engraçado se essas pessoas não tivessem algum poder de convencimento sobre uma parcela da população, justamente os bolsonaristas mais arraigados, que estão ainda dispostos a sair às ruas no domingo, se aglomerando em transporte público e depois em avenidas, para protestar a favor do governo e contra o Congresso.

Além dos propagadores de teses esdrúxulas, também há procuradores da República usando as redes sociais para fazer comparações sem pé nem cabeça entre a epidemia de Covid-19 e outros fenômenos. Thaméa Danelon, ex-coordenadora da Lava Jato em São Paulo, estabeleceu um paralelo entre o surto e a corrupção, não se sabe se para incentivar as pessoas a irem mesmo às ruas no domingo.

Apesar dos primeiros exames apontarem que Jair Bolsonaro não está infectado com coronavírus, o presidente da República fará novos testes e deve permanecer em isolamento. Segundo o Estadão, a medida será necessária devido ao tempo em que esteve ao lado do secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, que contraiu a doença durante a viagem aos Estados Unidos. Segundo o cardiologista Leandro Echenique, Bolsonaro deverá passar também mais alguns dias em isolamento. “Ele segue de quarentena até o começo da próxima semana no Palácio do Alvorada. Precisa ficar isolado pelo menos sete dias depois do contato”.

A língua nervosa dos Bolsonaro não se aquieta. O correspondente da Fox News John Roberts afirmou no Twitter que Eduardo Bolsonaro falou à Fox que um segundo exame feito pelo presidente Jair Bolsonaro teria testado negativo para o coronavírus.

Antes, a Fox noticiou que Eduardo teria confirmado que Bolsonaro testou positivo. Eduardo desmentiu, afirmou que o pai havia testado negativo e negou ter falado com veículos da imprensa. O presidente também negou a informação. Na esteira, atacou a mídia e afirmou que ela dissemina “fake news”.

Depois que o presidente e o filho desmentiram a notícia de que um primeiro teste de Bolsonaro teria dado positivo para o coronavírus, o jornalista do canal americano afirmou na rede social: “Depois de falar à @FoxNews  que seu pai teve um teste preliminar POSITIVO para coronavirus, Eduardo Bolsonaro agora afirma à @FoxNews que o teste era NEGATIVO. Bolsonaro afirma que está em contato com a Casa Branca.”

MORRE GUSTAVO BEBIANNO

O ex-secretário-geral da Presidência Gustavo Bebianno morreu na madrugada deste sábado (14), aos 56 anos, em seu sítio em Teresópolis. Segundo o filho João Candido Bebianno, que o socorreu, o pai teve um infarto e chegou a ser socorrido no hospital da cidade serrana do Rio, mas não resistiu.

Na semana passada, ele teve a candidatura à Prefeitura do Rio de Janeiro lançada pelo PSDB, partido ao qual se filiou depois de romper com Jair Bolsonaro e deixar o PSL, do qual chegou a ser presidente nacional durante a campanha presidencial.

Bebianno vinha fazendo críticas ao presidente, à sua família e ao governo desde que foi demitido do ministério, em abril do ano passado. Sua última entrevista foi ao Roda Viva, da TV Cultura, ocasião em que reforçou a acusação de que uma das razões para que tivesse caído em desgraça no bolsonarismo foi o fato de ter freado o propósito de Carlos Bolsonaro de instalar uma “Abin paralela” no Palácio do Planalto. A partir das declarações do ex-ministro, a revista Crusoé produziu uma reportagem de capa a respeito do tema.

Antes de enveredar pela política como um dos principais coordenadores da campanha de Bolsonaro, Bebianno atuou, como advogado, em um dos principais escritórios do País, do criminalista Sergio Bermudes. Era faixa-preta em jíu-jitsu e conheceu Bolsonaro, de quem e tornou advogado, amigo e conselheiro, em 2017.

Em suas entrevistas posteriores à demissão, ainda demonstrava muita mágoa pela maneira como foi fritado e ofendido pelo presidente os filhos.

Também dizia ser alvo de ameaças anônimas graças às críticas e acusações que passou a fazer. Ele repetiu essa informação na última entrevista, no dia 2 deste mês.

Por Vera Magalhães

VERGONHA EDUCACIONAL

A cada dia que Abraham Weintraub permanece como ministro da Educação, desmoraliza-se esta que é uma das principais – se não a principal – forças motrizes para o desenvolvimento sustentável e para a redução da brutal desigualdade no País. Consumido por desvarios persecutórios e pendor revanchista que só sua alma é capaz de explicar, Weintraub parece não dispor de tempo em seu dia útil para dedicar às questões que realmente interessam à causa da educação, supondo, evidentemente, que o ministro seja capaz de diagnosticá-las. Em vez disso, Weintraub lança-se numa cruzada permanente contra tudo e contra todos que discordam de suas visões e de seus métodos, incluídos num mesmo balaio a mídia profissional, o Congresso, os partidos políticos e estudiosos das políticas públicas para a área de educação.

Nos últimos dias, o ministro manteve-se bastante ocupado com ataques ao Movimento Todos pela Educação, uma organização que há anos dedica-se a debater a formulação de políticas educacionais, com relevantes serviços prestados ao País. O Todos pela Educação é uma entidade apartidária que congrega profissionais de todas as orientações político-ideológicas. A uni-los, a visão da educação como vetor primordial para o avanço de uma nação.

Pelo Twitter, o ministro Weintraub acusou o Movimento Todos pela Educação, em especial a presidente da organização, Priscila Cruz, de encampar uma “articulação” para a sua queda. “Foi Priscila Cruz, presidente do Todos pela Educação, quem organizou o evento de hoje (anteontem) para apresentar alternativas ao que estamos fazendo no MEC. Lembrando, Priscila Cruz, fã de Paulo Freire, quer estratégia para me derrubar”, escreveu o ministro.

O evento ao qual Abraham Weintraub fez alusão é o Encontro Anual Educação Já, que contou com a presença do secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), além de deputados, senadores, secretários estaduais de Educação e dirigentes das principais ONGs voltadas à educação no País. O ministro foi convidado para o evento em Brasília, mas não participou. Preferiu alimentar suas teorias conspirativas nas redes sociais a contribuir para o debate acerca das políticas educacionais.

Não seria necessária uma “estratégia” para “derrubar” o ministro da Educação. Os resultados apresentados por Abraham Weintraub – ou melhor, a falta deles – falam por si sós. Para que fosse substituído, bastaria que seu chefe, o presidente Jair Bolsonaro, quisesse ter entre seus auxiliares diretos um ministro da Educação, e não só um vulgar propalador de suas próprias convicções. O presidente já advertiu que as críticas feitas a Weintraub, a depender de onde venham, são estímulos para mantê-lo no cargo. Ou seja, a inação do ministro da Educação, além de suas ofensas e grosserias, são mais propensas a lhe valer uma medalha de honra ao mérito do que admoestações, quiçá demissão.

O Encontro Anual Educação Já teve de ser suspenso porque Priscila Cruz estava sob suspeita de contaminação pelo novo coronavírus, o que foi descartado postrriormente (leia abaixo). Diante disso, Weintraub celebrou. “Para fechar o bloco de informações sobre Priscila Cruz e sua ONG Todos pela Educação: CORONAVÍRUS!!!”, escreveu o ministro no Twitter. “Eu sou a antítese de Priscila Cruz”, prosseguiu Abraham Weintraub. Está claro. Priscila Cruz tem caráter.

Por Estadão

O Instituto Educadores, formado por ex-secretários de Educação, publicou uma nota de repúdio ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, na qual endossa o editorial do Estadão (leia trechos acima), chamado “Um homem doente”, que analisa como o titular do MEC desmoraliza uma das principais forças motrizes para o desenvolvimento sustentável e para a redução da brutal desigualdade no País.

O QUE PENSA O BRASILEIRO

Umapesquisa inédita da Quaest Consultoria indica que os brasileiros são contra a adoção de medidas extremas como solução para os impasses políticos atuais: 50% dos entrevistados são contra fechar o Congresso Nacional, 33% se disseram a favor da medida radical e 17% não quiseram ou não souberam responder. De acordo com o levantamento, a maioria dos pesquisados, 49%, não apoia um eventual impeachment de Jair Bolsonaro, ante 39% favoráveis à abreviação do mandato do atual presidente; 12% não souberam ou não quiseram responder.

Os brasileiros entrevistados se disseram muito preocupados com o destino do Brasil: 61%. Apenas 20% afirmaram estar otimistas. Isso porque a pesquisa foi feita um pouco antes da turbulência nas bolsas de valores do mundo inteiro, incluindo a de São Paulo. A percepção quanto ao governo Bolsonaro mudou pouco: 30% o avaliam como positivo, 35% como negativo e 34% consideram a gestão regular (1% não quis ou não soube responder). “A pesquisa mostra um presidente de gueto, que se descolou da maioria, que fala pra seu fã-clube, mas que não consegue mais empolgar o eleitor mediano”, diz o cientista político Felipe Nunes, da Quaest.

FRAUDE GOVERNAMENTAL

Falando ao jornalista Ricardo Noblat sob a condição de não terem seus nomes revelados, dois ministros do Supremo Tribunal Federal coincidiram em dizer que o presidente Jair Bolsonaro corre o risco de abertura de processo de impeachment por crime de responsabilidade se insistir com a história de que houve fraude na eleição de 2018. Provas do que ele disse durante sua quarta viagem aos Estados Unidos em menos de um ano certamente lhe serão cobradas por partidos políticos – e, se for grande a pressão que eles exerçam, talvez pelo Procurador Geral da República, Augusto Aras, que, provocado, adiantou que não conhece provas de fraude.

Os dois ministros consideram que a declaração sobre fraude foi uma das mais graves feitas por Bolsonaro desde que assumiu o cargo. Nem por isso se surpreenderam com ela. Ainda como candidato, Bolsonaro ficou rouco de tanto repetir que não reconheceria o resultado da eleição se fosse derrotado. A quem interessa deixar a Justiça sobre suspeita? – perguntou um dos ministros. E ele mesmo respondeu: interessa a quem quer enfraquecer a democracia para substitui-la por um regime autoritário ou para governar de maneira autoritária. Bolsonaro não nega a falta que lhe faz uma ditadura.

Por Ricardo Noblat

Se Jair Bolsonaro diz que houve fraude na eleição presidencial que ganhou, o que dirá se perder a próxima? Em conversas reservadas com alguns dos seus auxiliares, ele já adiantou o que pretende dizer nesse caso. Se perder para um candidato de esquerda ou apoiado por ela, não reconhecerá o resultado da eleição – e, aí, seja o que Deus quiser. O que Deus quiser, não. Melhor deixar Deus fora disso. Bolsonaro imagina que terá força para ficar onde está para além de 2022.

Manobra vagamente parecida foi tentada pelo ex-presidente Jânio Quadros, eleito com larga margem de vantagem no final de 1960. Jânio viveu às turras com o Congresso e surpreendeu o país renunciando ao cargo apenas oito meses mais tarde. Seus ministros militares tudo fizeram para demovê-lo da ideia. Jânio voltou a São Paulo levando escondida a faixa presidencial. Estava certo de que o povo se rebelaria e que ele acabaria de volta ao cargo com poderes para impor suas vontades ao Congresso. Nada disso aconteceu, mas a renúncia detonou uma grave crise institucional que por pouco não resultou num golpe militar. O golpe se daria três anos depois com a queda de João Goulart, que sucedera Jânio, e a instalação de uma ditadura de 21 anos.

Bolsonaro admite que se for derrotado por um candidato do centro seu plano naufragará, por isso quer enfrentar a esquerda outra vez. Seguirá atirando nela, mas empenhado em abater a pauladas qualquer nome do centro que possa lhe fazer sombra. Tal plano está longe de ser sofisticado, é claro. Mas é o que está na cabeça do presidente mais tosco que este país já teve.

Por Ricardo Noblat

O HOMEM BOMBA

Presidindo o Brasil há 14 meses sem oposição, Jair Bolsonaro alcançou uma façanha inédita: conseguiu consolidar-se como principal problema do governo. Repetindo: Bolsonaro virou o maior problema da gestão Bolsonaro. O capitão recebera delegação de quase 58 milhões de pessoas para resolver três grandes encrencas: retirar a economia do freezer, restaurar a moralidade e melhorar o serviço público.

Produziu tuítes, crises e um pibinho mixuruca de 1,1%. Coisa inferior aos fiascos de 2017 e 2018. Estabilizou a economia na mediocridade. Convive com a suspeição em casa e no ministério. Permitiu que se formassem filas de pobres no INSS e de miseráveis no Bolsa Família. Com boa vontade, pode-se dizer que Bolsonaro faz um razoável governo medíocre. Está separado do êxito pela expressão "por outro lado".

Bolsonaro interrompeu o presidencialismo de cooptação. Por outro lado, instituiu o presidencialismo de trincheira. Conseguiu brigar com seu partido, implodindo-o. Obteve do Congresso a reforma da Previdência. Por outro lado, conspira contra a agenda de reformas complementares. Um pedaço do ministério funciona. Por outro lado, outra ala da Esplanada oscila entre a insanidade e o Olavo de Carvalho, que muitos suspeitam ser a mesma coisa.

No início do segundo ano de governo, Bolsonaro continua sem oposição. Para suprir a ausência de opositores, conserva o hábito de criar suas próprias assombrações. Mas os espectros fictícios do presidente agora convivem com um fantasma real: o coronavírus. O mundo reduz suas previsões de crescimento econômico. O Brasil também. O ministro Paulo Guedes diz que a economia brasileira tem uma "dinâmica própria", e não será tão afetada. Tolice. Não há inimigo insignificante. Ainda que houvesse, ele se tornaria um portento quando associado a Bolsonaro, principal adversário de si mesmo.

Por Josias de Souza

Os ocupantes das principais posições do Legislativo e do Judiciário demonstram a disposição de deixar Jair Bolsonaro “falando sozinho” diante da clara estratégia do presidente de esticar a corda da crise institucional justamente no momento em que o País e o mundo vivem uma crise econômica e epidemiológica com o coronavírus. Parecem querer resolver o problema diretamente com Paulo Guedes, como se fosse coisa de “adultos”, praticamente relegando o presidente a uma situação de inimputabilidade.

Isso é uma forma inédita de se lidar com um presidente que decide governar estressando as instituições. Com outros que fizeram o mesmo, como Janio Quadros ou Fernando Collor, a situação acabou se encaminhando rapidamente para o expurgo. Mas com Bolsonaro é diferente, porque os Poderes temem que o clamor às ruas e ao fechamento dos demais Poderes agregue um componente de instabilidade social a uma crise que já é multifacetada e cuja extensão e gravidade ainda está por ser conhecida.

Resta saber se o presidente entenderá os ouvidos moucos que os demais líderes políticos fazem à sua escalada de abusos como licença para abusar ainda mais, como parece estar acontecendo a julgar pela sua aposta desta segunda-feira no descalabro, ao dizer com todas as letras que a eleição que lhe deu a vitória foi fraudada, ou chantagear abertamente o Congresso na questão dos PLNs que tratam da distribuição de recursos do Orçamento.

A cautela dos demais Poderes mostra uma dificuldade de lidar com um líder com as características de Bolsonaro: que não respeita as instituições e aposta na força que tem junto a uma parcela da sociedade, atiçada à base de rações diárias de tretas nas redes sociais.

A aposta em tentar domar a crise deixando Bolsonaro falar sozinho é arriscada também porque já não se tem segurança se o receituário de Paulo Guedes será suficiente para atravessar uma recessão global. As reformas que já estão no Congresso parecem não se encaixar ao que o momento pede, e a administrativa, que está para ser mandada, pode agravar os confrontos com a sociedade em vez de dirimi-los. A tributária, que poderia ser uma sinalização para atrair investimentos, segue sem consenso.

O temor de uma parcela do Congresso que ainda aposta em diálogo é que Bolsonaro, em sua escalada populista, acabe por rifar também Guedes em plena tempestade econômica, o que levaria a tática de tentar atravessar a crise deixando o presidente guerrear com moinhos de vento inviável.

Por Vera Magalhães

GUERRA ANTI-CULTURAL

Eles se casaram No dia 4, mas já dormem em quartos separados. Ainda que seduzido pela verve teatral dela, ele não suportou ter sua equipe de trabalho acusada por ela de abrigar “facções” em pleno Fantástico, ainda que soubesse de antemão do conteúdo da entrevista, e, como resultado, interviu no quintal dela. Barrou a nomeação de Maria do Carmo Brant de Carvalho da Secretaria de Diversidade Cultural, jogando no lixo a promessa de “carta branca” feito a ela. Filiada ao PSDB desde 1989, Maria do Carmo foi nomeada no governo de Michel Temer como secretária nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, indicada por Osmar Terra. Em 2014, ela atuou como coordenadora da área social do programa de governo do então candidato à Presidência, Aécio Neves. Segundo o Estadão apurou, ela estava disposta a sair do PSDB para assumir o cargo no governo Bolsonaro e preparava a carta de desfiliação quando teve a nomeação cancelada. A nova secretária da Cultura recebeu críticas públicas do ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, do escritor Olavo de Carvalho e do presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, subordinado a ela.

O presidente da Fundação Palmares, Sergio Camargo, está em pé-de-guerra com a recém-nomeada secretária especial de Cultura Regina Duarte após uma entrevista que a atriz deu no no último dia 8, em que ela classificou o autodenominado “negro de direita e antivitimista” como um problema a ser resolvido após a “poeira abaixar” em relação às polêmicas que envolvem Camargo. Nas redes sociais, Sergio Camargo ironizou o bom dia que desejou aos seguidores, e aproveitou para mandar um recado à secretária. “Bom dia a todos, exceto a quem chama apoiadores do Bolsonaro de facção e o negro que não se submete aos seus amigos da esquerda de “problema que vai resolver”.”, escreveu, mencionando trechos da entrevista da atriz ao Fantástico, da Rede Globo.

Na entrevista, Regina Duarte disse que a nomeação fez com que ela tivesse que encarar uma “facção” que queria ocupar a pasta, motivos pelos quais uma hashtag #ForaRegina já tinha sido criada e impulsionada por bolsonaristas. No dia da nomeação de Duarte, seis homens seguidores de Olavo de Carvalho, o guru ideológico do governo, foram exonerados de seus cargos na secretaria da Cultura, o que gerou ataques vindos inclusive de Olavo. Ao ser questionada sobre Sergio Camargo, cuja reputação remonta a falas que atacam o movimento negro, a política de cotas, a vereadora Marielle Franco e uma série de ironias em relação ao racismo no Brasil, a atriz afirmou que este é um “problema” que irá lidar mais tarde. “Voltamos aí a esta situação da política, que interfere no fazer cultural, na medida que temos uma pessoa que é um ativista mais do que um gestor público. Eu estou adiando esse problema porque esta é uma situação muito aquecida. Quero que baixe um pouco a temperatura e logo, logo a gente vai ver”, disse. Sergio Camargo chegou a ser impedido de assumir o comando da Fundação Palmares após uma decisão da Justiça Federal do Ceará considerar suas falas impróprias para o seu cargo. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), porém, derrubou a liminar que suspendia a nomeação do jornalista no começo de fevereiro.

Recentemente, Jair Bolsonaro publicou uma foto ao lado de Camargo, que foi republicada pelo ativista com o comentário de que estava “confirmadíssimo na presidência da Fundação Cultural Palmares”. No dia da nomeação de Regina Duarte, a atriz chegou a dizer que iria cobrar a carta branca que lhe foi oferecida ao aceitar o cargo na secretaria.

Geralda Gonçalves, conhecida como Geigê, foi convidada pelo Consulado Geral do Brasil em Miami para o encontro comunitário com o presidente. Ela, que ficou conhecida por realizar protestos em prol de Bolsonaro em Times Square, na cidade de Nova York, avalizou nomes como o de Alvim e do ex-presidente da Funarte, Dante Montovani, antes de suas nomeações. Ela aproveitou a entrevista de Regina Duarte ao Fantástico para criticar a atual ocupante do cargo. “Regina Duarte desrespeitou os 57,7 milhões de conservadores que elegeram Bolsonaro quando se referiu a eles como facção”, disse, postando foto ao lado da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) e do presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo. “Enquanto isso ela nomeia PSOL, peesedebistas e ex-servidores do governo Dilma. Quer o Humberto Braga na Cultura. E ainda somos chamados de facção?”, escreveu, mostrando o tipo de “conselho” que dará em seu novo encontro com Bolsonaro.

Na entrevista, Regina Duarte também afirmou acreditar que o dinheiro público deva ser usado seguindo diretrizes dadas pela orientação do governo, e disse não se incomodar com o apoio declarado de Jair Bolsonaro à ditadura, que chegou a censurar novelas em que a atriz atuou. “Eu acho que pra trás não existe, ninguém vive olhando pro retrovisor. Vamos ficar no presente e vamos olhar pra frente.”, reiterou em um momento. Depois, questionada sobre coibições à expressões artísticas diversas, a atriz complementou: “Eu acho que o dinheiro público deve ser usado de acordo com algumas diretrizes importantes, porque é o que população que elegeu esse governo espera dele. [O governo] governa pra todos. E todos estão livres pra se expressar. Contanto que busquem seus patrocínios na sociedade civil. Você não vai fazer filme pra agradar a minoria com dinheiro público.”, disse.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), comentou que fez uma promessa de evitar "falar mal" do ministro da Educação Abraham Weintraub, porque caso faça isso o ministro continuará no cargo. “Infelizmente, o debate com o governo não é do tamanho que gostaríamos, independente de gostarmos ou não do ministro. Eu prometi que não ia falar mal dele, porque senão ele não cai de jeito nenhum”, disse Maia ao comentar os trabalhos da comissão especial que analisa mudanças no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). A declaração foi feita em um evento promovido pela ONG Todos pela Educação. Não é a primeira vez que Maia crítica Weintraub. Em janeiro deste ano ele disse que o ministro "atrapalha o Brasil"  e que sua postura impede que novos recursos cheguem ao país. "Como faz para um investidor olhar um ministro da Educação desses? [Dessa maneira] O país não tem futuro", disse em palestra no Credit Suisse em São Paulo.

Mais tarde, no Twitter, Weintraub comentou o a fala de Maia. Ele compartilhou a notícia com a declaração do presidente da Câmara e escreveu: "Foi Priscila Cruz, presidente do Todos Pela Educação, quem organizou o evento de hoje para apresentar alternativas ao que estamos fazendo no MEC. Lembrando, Priscila Cruz, fã de Paulo Freire, quer estratégia para me derrubar".

O governador de São Paulo, João Doria, disse que o “melhor caminho para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, seria o sanatório”. Doria foi à capital para participar do evento da ONG “Todos pela Educação”, cancelado depois que a organizadora, Priscila Cruz, passou a ser suspeita de estar com coronavírus.

João Doria também criticou o estilo de governar do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e defendeu a busca por diálogo para atingir a recuperação econômica. "Ele [o presidente] tem que respeitar os votos que recebeu e os votos que não recebeu. Ele tem que governar para todos os brasileiros e não apenas para os seus seguidores, para os que votaram, ou os que são seguidores como bolsominions, ou entusiastas do presidente Bolsonaro. É preciso governar para todos os brasileiros. Esse é o sentimento que move uma democracia. Você não pode governar só para aqueles que você gosta, ou aqueles que gostam de você, governe para todos. Você também não governa através de manifestações, seja via imprensa ou seja via Whatsapp", disse.

BONS CRISTÃOS

Domingo retrasado, o Fantástico exibiu uma reportagem sobre a situação da população transsexual nos presídios brasileiros. Tocada pelo médico Drauzio Varella, a matéria contou a história de Suzy, trans que não recebia visitas há oito anos. O abraço dado pelo médico na detenta comoveu o público, que chegou a fazer campanha para que Drauzio se candidatasse à Presidência… Suzy foi condenada por estuprar e estrangular uma criança de nove anos. A emissora divulgou nota esclarecendo a escolha editorial: “O quadro do Dr. Drauzio Varella foi sobre uma situação que o Estado brasileiro precisa enfrentar: mulheres trans cumprem as penas pelos crimes que cometeram em meio a presos homens, o que gera toda sorte de problemas. O crime das entrevistadas não foi mencionado, porque este não era o objetivo da reportagem.” 

Drauzio Varella também se pronunciou, por meio de nota:

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, se posicionou sobre a polêmica. Segundo o ministro, Drauzio e a Globo não têm empatia ou compaixão com as crianças e famílias. “Antes que eu esqueça: desejo que vocês terminem no inferno!”, afirmou o integrante do governo de Jair Bolsonaro.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) também foi às redes sociais para pedir boicote à TV Globo após o programa Fantástico. “Nossa! Passada de pano 1.000°! Os caras do PT, PSOL e cia. têm que aprender com a GRobo!”, escreveu Eduardo no Twitter, após o Fantástico divulgar uma nota oficial de Drauzio Varella. Em outro tuíte, o deputado compartilha um vídeo de seu novo guru, Sikêra Jr., sobre o caso. Nele, o apresentador diz que vai falar sobre “o que você nunca viu” sobre o caso de Suzy no programa Alerta Nacional. ‌Em outro vídeo, desta vez publicado por Eduardo, ele pede o boicote à emissora e escreve: “entenda o caso do travesti Susy e como funciona a estratégia da Globo”. No vídeo, que mostra a reportagem do Fantástico com Varella, há legendas que chamam a transexualidade de “teoria” que foi “vitimada” propositalmente durante o programa.

A deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) foi às redes sociais para protestar contra a reportagem. A deputada se incomodou com a emissora por não ter divulgado o crime da detenta que foi abraçada por Drauzio Varella. “Insisto: o problema não foi o abraço! O problema foi a manipulação! O pior é a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) estimular o envio de cartas a uma pessoa condenada por estuprar e matar uma criança. Já enviei mensagem ao líder do Governo. A Secretaria precisa corrigir isso!”, escreveu Janaina no Twitter.

Finalmente, diante da pressão dos ótimos cristãos - sempre prontos a perdoar o próximo e a ter compaixão – Drauzo pediu desculpas à família da vítima de Suzy, mas deixou um recado aos fariseus e hipócritas.

Uma foto que foi escondida durante as eleições de 2018, em que o hoje senador Flávio Bolsonaro (sem partido – RJ) posa ao lado do coronel da Polícia Militar Pedro Chavarry Duarte caiu na rede após a propagação de ataques de bolsonaristas contra o médico Dráuzio Varella, que durante uma reportagem no Fantástico deu um abraço em uma transexual que estaria presa por homicídio de vulnerável. Ao lado de Flávio na foto, Pedro Chavarry Duarte foi preso em flagrante em 2016 por ter estuprado uma menina de apenas dois anos, que foi encontrada nua e aflita no banco de trás do seu carro. Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, no entanto, o abuso sexual de menores pelo militar, então com 65 anos, era recorrente. Duarte é investigado junto com outros 10 homens por usar uma casa na Zona Norte para abusar sexualmente dos irmãos. Segundo a Polícia Militar do Rio de Janeiro, uma criança e um adolescente, vítimas dos crimes cometidos por Chavarry e seu grupo, eram levadas para o local onde ocorriam os estupros vendadas e com fitas adesivas tapando suas bocas.

CARLOS, O TERRÍVI

Carlos Bolsonaro parece se esforçar para criar animosidades entre o governo de seu pai, Jair Bolsonaro, e seus aliados militares. O vereador carioca postou “indiretas” aos cabeças das Forças Armadas. A primeira veio no dia 8: “Tenho atuado como posso, entretanto é visível que o Presidente está sendo propositalmente isolado e blindado por imbecis com ego maior que a cara”, disse sem dar nome aos bois. Nos últimos tempos, Bolsonaro promoveu uma “militarização” de seu gabinete, em especial com a saída de Onyx Lorenzoni. Do atual núcleo duro no Palácio do Planalto, todos são militares: Augusto Heleno (GSI), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Braga Netto (Casa Civil). A mensagem ficou mais clara no dia 9. Em nova postagem, Carlos ataca “os positivistas”. A filosofia é associada ao pensamento militar no Brasil e foi inspiradora dos ideais da República. O “guru” Olavo de Carvalho, por exemplo, costuma atacar desafetos no seio do Exército por conta da ligação com o positivismo.

Carlos Bolsonaro também usou suas redes sociais para reclamar que o presidente “está sendo propositalmente isolado e blindado por imbecis com ego maior que a cara”. Carlos não se referiu a ninguém especificamente, mas deixou clara a sua insatisfação com a situação.

“Tenho atuado como posso, entretanto, é visível que o Presidente está sendo propositalmente isolado e blindado por imbecis com ego maior que a cara. Cagam para o Brasil. Graças a Deus e para o bem de nosso país, os avanços sobrepoem os vis. É uma luta inglória”, escreveu o filho do presidente.

Por Marcelo de Moraes

MESQUINHO

Ciro Gomes não poupou o presidente Jair Bolsonaro de críticas por conta da redução do atendimento do programa Bolsa Família no Nordeste, justamente a região mais pobre do País. “Este Bolsonaro é o mais mesquinho dos políticos que já vi. Perseguir os pobres de uma região por vingança é uma canalhice sem par!”, escreveu Ciro nas suas redes sociais.

Por Marcelo de Moraes

“Brasil é Boeing comandado por chimpanzé metido a engraçadinho”, afirmou Ciro Gomes. Para o ex-governador do Ceará e presidenciável nas eleições de 2018 pelo PDT, país é um “avião desgovernado em um céu extremamente perigoso”.

BRIGA DE CRENTE E TFP

O polemista e astrólogo Olavo de Carvalho disse que instituições como “igrejas evangélicas”, assim como “a Igreja Católica, o partido comunista, a maçonaria e as Forças Armadas”, são responsáveis por “tudo o que acontece de mau no Brasil”. O escritor ainda fez a ressalva de que essas entidades não são “necessariamente más”, mas que “demolir o prestígio” delas desarmaria “milhões de picaretas”.

O presidente da Frente Parlamentar Evangélica, o deputado Silas Câmara (Republicanos-AM), respondeu, considerado o guru ideológico do governo Jair Bolsonaro “muito desantenado da realidade”. “Coitado do Olavo, ele devia vir morar no Brasil para poder falar sobre o Brasil”, disse a VEJA Silas Câmara, líder do grupo parlamentar composto por 195 dos 513 deputados da Câmara. “O cara que não mora no Brasil, que está lá não sei onde nos Estados Unidos, vivendo outra realidade. Coitado, não sabe nem da história do Brasil, até porque a gente vive num país laico, num país que não tem nenhum tipo de vinculação de história política com presença de sectarismo religioso no poder, vem falar uma bobagem dessas. Tem que estar muito desantenado da realidade”, completou. Silas Câmara afirmou ainda que quem atrapalhou o presidente foram “pessoas como o próprio Olavo, que fica lá dos Estados Unidos dando pitaco aqui, tentando semear um comportamento que, na cabeça dele, pode ser em defesa de alguma coisa. Mas, na minha cabeça, é mais para proteger uma tese filosófica dele que na prática não funciona”, completou.

ATAQUES A IMPRENSA

A imprensa profissional foi alvo de cerca de 11 mil ataques por dia nas redes sociais em 2019, segundo mostrou relatório divulgado Pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). De acordo com o documento, o  número de casos de violência contra jornalista foi reduzido em 50,78% no ano passado, em relação a 2018. Foram 56 casos contra 78 profissionais. Entre eles, estão registros de agressões físicas, como socos e pontapés (24), ofensas (8), intimidações (6), ameaças (5), censuras (5), ataques/vandalismos (4), assédios sexuais (1), injúrias raciais (1), detenções (1) e roubos/furtos (1). Nas redes sociais, em 2019, 130 milhões de brasileiros com acesso ao Twitter produziram 6,2 bilhões de posts. Desse número, 39,2 milhões de posts citaram as palavras “mídia”, “imprensa”, “jornalista” e “jornalismo”. Segundo a pesquisa, desse conjunto, 3,2 milhões (10%) de publicações vinham de sites conservadores e continham palavras de baixo calão ou expressões que descredibilizam o trabalho da imprensa. Já 714 mil tuítes foram produzidos por canais de esquerda.

VAZA JATO

Nova reportagem da Vaza Jato revela que o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa em Curitiba, escondeu do Ministério da Justiça, à época comandado pelo petista José Eduardo Cardozo, a visita de uma comitiva de ao menos 15 pessoas do Departamento de Justiça dos Estados Unidos em outubro de 2015. “Os americanos não querem que divulguemos as coisas”, justificou Dallagnol, segundo a reportagem, em um bate-papo com um assessor de comunicação em 5 de outubro de 2015. Era a resposta ao aviso de que a “imprensa está em polvorosa com a vinda de agentes/promotores dos eua para cá esta semana”.

O então ministro ficou sabendo da visita após vazamento da informação pela imprensa, o que causou indignação na então presidenta, Dilma Rousseff e um pedido de esclarecimentos por um delegado do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) – divisão do Ministério de Justiça que faz a coordenação de cooperação internacional -, que foi ironizado por Dallagnol. “Os contatos estão sendo feitos de acordo com as regras nacionais e internacionais. Sugiro que sugira que o DRCI pare de ter ciúmes da relação da SCI/MPF com outros países rs”, ironizou o procurador da Lava Jato, em resposta a Vladimir Aras, procurador responsável pela cooperação internacional na Procuradoria Geral da República.

No encontro, os procuradores da Lava Jato – contrariando a Constituição – entregaram aos representantes do Departamento de Justiça dos EUA informações sobre a Petrobras e articularam à revelia um acordo para repatriar parte da multa bilionária imposta à estatal brasileira pela justiça estadunidense.

Leia a reportagem na íntegra

GENTE DE BEM

Uma confusão de trânsito em Natal viralizou nesta semana. Em dois vídeos (abaixo), uma família aparece sendo intimidada por um sujeito que se diz por integrante da corregedoria da Polícia Federal. Ele garante que está trabalhando à paisana. A mulher se desespera no banco do passageiro e uma criança chora atrás. “Fazer filmagem é crime”, fala o homem. Na verdade, tratava-se de um pastor chamado Diego Araújo, da Igreja Apostólica Fonte de Vida, cidadão de bem, bolsonarista. Araújo sumiu das redes sociais após a palhaçada. Um dia como outro no Brasil de Bolsonaro.

FRASES DA SEMANA

“Não cabe a nós dizer ‘vá ou não vá’. Existe uma recomendação, mas vocês é que são donos das ruas, não nós”. (Carla Zambelli, deputada federal, PSL-SP, 24 horas depois de o presidente Jair Bolsonaro sugerir o cancelamento das manifestações marcadas para amanhã.) 

“Em que pese a banda podre da imprensa já ter falado absurdos sobre [mim], agora falam da minha saúde. Mas estou bem, não precisarei de abraços do Drauzio Varella”. (Fabio Wajngarten, Secretario de Comunicação da presidência, horas antes de admitir que pegara o coronavírus)

“Queremos processo de confronto agora? Disputa política hoje? Ou hoje temos que estar juntos para dar uma solução para a população brasileira?” (Paulo Guedes, ministro da Economia, em lição de moral que deu a deputados e senadores reunidos com ele ontem à noite. Foi um desastre)  

“O Executivo não consegue governar porque o Congresso não deixa. Quando chamamos de ‘parlamentarismo branco’, é porque o Congresso quer fazer o papel do Executivo”. (Eduardo José Barbosa, general da reserva e presidente do Clube Militar) 

“Infelizmente, o debate com o governo não é do tamanho que gostaríamos, independente de gostarmos ou não do ministro. Eu prometi que não ia falar mal dele, senão ele não cai de jeito nenhum”. (Rodrigo Maia, presidente da Câmara, sobre Abraham Weintraib, ministro da Educação) 

“Você não vai fazer filme para agradar a minoria com dinheiro público. Todos estão livres para se expressar, contanto que busquem patrocínios na sociedade civil”. (Regina Duarte, secretária de Cultura, numa prova de perfeito alinhamento com as diretrizes do governo Bolsonaro)

Com informações de Leonardo Sakamoto, Josias de Souza, Ricardo Noblçat, Reinaldo Azavedo, Carta Capital, Outra Saúde, Sul 21, o Globo, BR-18, Folha de SP, Fórum, Veja, Dora Kramer, BRPolítico, Vera Magalhães, Marcelo de Moraes e Radar.

Leia outros artigos da coluna: Ágora Digital

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *