28/03/2024 - Edição 540

Entrevista

Santos Cruz: ‘Bolsonaro tem um estilo que pode deixar o pessoal mais irresponsável’

Publicado em 10/03/2020 12:00 -

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“Quando sai o avião pra África?”. Foi assim, sem nenhum segundo de hesitação, que o general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz reagiu quando recebeu, em 2013, um convite da ONU para comandar os milhares de capacetes azuis das forças de paz no Congo, então conflagrado. “Estava almoçando num boteco aqui da esquina quando um cara do Senegal me ligou. Saí de lá para comunicar à família”, contou.

A anedota emoldura a personalidade que o general de 67 anos, que também serviu no Haiti e até hoje é consultor das Nações Unidas para situações de conflito, gosta de cultivar. Ele é um dos únicos alto oficiais das Forças Armadas brasileiras a ter participado de um conflito aberto convencional. Na longa conversa com o jornal EL PAÍS, mostrou-se de prontidão para falar de qualquer tema, – ainda que esquivando-se dos decibeis —, de cenários de alarme no Brasil (não vê risco institucional, apesar de apontar “loucuras” no discurso bolsonarista).

O gaúcho de Rio Grande só mudou de tom quando o assunto foi sua breve e turbulenta passagem pelo Governo Bolsonaro, na Secretaria Geral da Presidência da República, quando foi alvo de uma virulenta campanha na Internet movida pelas alas mais radicais do bolsonarismo. Uma mensagem falsa atribuída a ele atacando o presidente chegou a ser mostrada ao próprio Bolsonaro. “Meu interesse é saber quem foi o falsário que fez isso, coisa de bandidinho vagabundo de Internet.”

Desde sua saída do Governo, Santos Cruz nunca mais falou com Bolsonaro. Do Twitter, e do alto do seu prestígio no Exército, tem enviado recados, como nesta entrevista. “A instituição Forças Armadas não tem ligação nenhuma com resultados de Governo, com atitudes de governantes”, diz ele, que não descarta concorrer a algum cargo eleitoral no médio prazo. Já sobre as polícias militares adverte: há um processo forte de politização que precisa ser detido.

 

O senhor se manifestou contra o uso da imagem de generais na convocatória de uma manifestação a favor do presidente Bolsonaro e contra o Congresso. Disse também que “o extremismo só interessa aos extremistas”. Inclui o general Heleno entre os extremistas?

Não… Isso eu falei em tese. Não me considero no direito de fazer a lista de quem é e quem não é [extremista]. Isso é o público que tem que analisar. Isso tem a ver com a disputa entre o Executivo e o Legislativo, uma questão orçamentária, aí a temperatura sobe e o pessoal fala mais alto. O artigo que escrevi atende a todos os setores, de direita e de esquerda. O extremismo sempre cria o oponente para poder se posicionar. Tem pessoas que são radicais e extremistas até pela personalidade, outras por ideologia, outras por interesse. Isso não ajuda o quadro geral.

O senhor considera o presidente Bolsonaro um extremista?

Não. Ele é obrigado a negociar com o Congresso. Não tem como. Mas ele tem um estilo e esse estilo pode deixar o pessoal mais irresponsável. É como torcida organizada. Tem milhões de corintianos, mas a Gaviões da Fiel é um núcleo entusiasmado. Quando você xinga o juiz, tem corintiano que pensa “tudo bem”, mas na Gaviões da Fiel eles vibram. Esse estilo do Bolsonaro, essas tiradas dele, etc têm uma sequência muito forte porque ele é o presidente, e tem pessoas que se entusiasmam.

Bolsonaro compartilhou vídeos pela manifestação que falam abertamente em fechar o Congresso. O presidente cruzou uma linha vermelha?

Mesmo que fique em cima da linha, você tem os poderes funcionando. Agora o mais importante é que teve reação do Legislativo, do Judiciário, teve reação social.

O senhor falou, citando os generais, que “estão confundindo o povo”. Qual o risco da convocatória? Vê risco institucional?

Não tem risco nenhum. Tem confusão. Você pega quatro generais de destaque, coloca foto e uma convocação ―não vou entrar no mérito da convocação, que entra na questão da liberdade de expressão e de associação. Mas aquela imagem fica parecendo que você tem uma instituição que está patrocinando aquele convite, e não é. São quatro oficiais de destaque, que já estão na reserva, que sem dúvida nenhuma não autorizaram aquilo. É muito ruim. Não cria risco, mas cria confusão na população.

Cria confusão também dentro da caserna, especialmente nas patentes mais baixas?

Não, porque essas pessoas conhecem os envolvidos, a situação. É mais pelo público em geral. Aí confunde. Dentro das Forças Armadas não tem efeito nenhum, dentro do Governo não tem efeito nenhum. Porque as pessoas sabem o posicionamento institucional. Eu, como militar, trabalhei no Governo e minha responsabilidade era individual. Não estava representando uma instituição.

Vou insistir na pergunta porque hoje há o maior número de militares do Governo desde a redemocratização. Há um general e um almirante na ativa, inclusive… Não confunde institucionalmente?

O pessoal da ativa está usando uma prerrogativa legal de que você poder ser cedido a outro poder. Eu, particularmente, acho que isso vai trazer um pouco de confusão. Continua não representando institucionalmente, mas pode criar confusão para um observador olhando de fora. Mesmo estando na ativa à disposição de outro poder, a responsabilidade é individual.

Muitos observadores apontam que o presidente está ancorando seu Governo no prestígio da instituição Forças Armadas. Esse vínculo tão forte não será prejudicial para as Forças Armadas a longo prazo?

Uma coisa precisa ficar bem esclarecida. Esse grande número de militares pode dar essa impressão para as pessoas, que não têm conhecimento institucional, de que tem um compromisso. E não tem nenhum. Eu não tenho status legal para falar pelas Forças Armadas nem pelo Exército, mas fiquei mais de 45 anos lá e eu posso dizer alguma coisa. Pode ter certeza: a instituição não tem ligação nenhuma com resultados de Governo, com atitudes de governantes. Não acredito que essa participação [de militares] tenha essa intenção. É uma opção do presidente porque ele vem desse meio, conhece muita gente, então facilita. Quando você convida um oficial, você não tem disputa partidária.

Há também uma preocupação com a contaminação do discurso bolsonarista nas patentes mais baixas. Tem ainda os chamados à intervenção militar, esse discurso de que os militares são a reserva moral da nação…

Não vejo nenhuma contaminação nas Forças Armadas, que eu conheço bem. [Sobre intervenção], você vê que isso não é coisa de militar, mas de civis, inclusive. A sociedade tem todos os tipos de preferência. E hoje, com a facilidade da mídia social, os grupos se expressam de maneira forte. A imprensa tradicional hoje compete com o WhatsApp…

Os soldados também leem redes sociais. Se ficam dizendo que vocês são a salvação, isso não pode ser um canto da sereia para algum grupo?

O importante é que a estrutura de liderança no Exército está muito em cima daqueles que têm poder de decisão. Essas pessoas têm cabeça no lugar, elas estão muito bem selecionadas e orientam a turma de baixo. Você pega hoje um tenente, um coronel, um sargento, e o pessoal é de alto nível. Sabe interpretar, o pessoal não cai no canto da sereia, é preparado. Tem uma missão constitucional. Mesmo um soldado que fica só um ano no Exército tem um plano de treinamento e percebe que aquela estrutura ali é sólida. Não é um canto [da sereia] de WhatsApp que vai desestabilizar as Forças Armadas. Não é assim, não.

Vamos falar de outro corpo militarizado importante, as polícias militares. Como ex-secretário nacional de Segurança do Governo Temer, como o senhor vê o motim que aconteceu no Ceará?

Meu pai era da Polícia Militar, embora eu não o tenha conhecido, porque ele faleceu quando eu nasci. Tive um irmão, tenho muitos amigos na polícia. A Polícia Militar tem essa denominação porque tem as características militares: disciplina, hierarquia e dedicação, honestidade de propósito, respeito às autoridades. O comportamento que a gente está tendo não é de militar. Você teve um desvirtuamento em várias coisas. Você não pode ser militar quando interessa e não ser quando não interessa. Tem coisas como a greve, abandonar suas funções, deixar a população exposta sem segurança pública, colocar um capuz para fazer suas manifestações… Eu não posso vir aqui como militar e dar uma declaração para você de capuz. O que que é isso?

Não pode alvejar um senador…

Aí é briga. Você não pode jogar um trator em cima do pessoal. Eu não entro nessas brigas pessoais. A partir da hora em que você tem sensatez, há sensatez generalizada. Neste caso, chama a atenção a parte comportamental, fora da disciplina, estragar os veículos, sair encapuzado. Vai contra a hierarquia, a disciplina, contra tudo. Quem infringiu a lei que pague de acordo com a lei.

Nos bastidores, os governadores se queixam porque nem Bolsonaro nem o ministro Sergio Moro condenaram o motim claramente, como o senhor acaba de fazer. Faltou essa condenação?

O que falo aqui não tem reflexo como autoridade. Em compensação, o que o presidente e ministro falam têm uma importância muito grande… As polícias têm vários problemas. Não têm uma lei orgânica nacional que regule o sistema de promoção da mesma forma, a formação. Tem que ter, e aí os Estados seguem. O profissionalismo foi afetado porque hoje você tem polícias onde se trabalha um dia e se descansa três. Isso daí não é descanso. Nesses três dias, uma pessoa normal, com força para trabalhar, vai fazer outra coisa, não vai ficar três dias esperando o próximo turno. Tem que resolver esse regime de trabalho. O pacote de assistência ao policial não é só salário. A parte social das polícias, de saúde, o emocional. Você tem polícias com cinco vezes mais taxa de suicídio do que a média social. Uma coisa é você ter esse pacote de soluções, outra coisa é aceitar esse tipo de conduta.

Perguntava sobre a falta de condenação porque analistas também apontam eco dos discursos governistas na radicalização de grupos de policiais. O senhor diz que as Forças Armadas não caem no canto da sereia do WhatsApp. As polícias também não?

As polícias militares estão sofrendo um processo mais forte de politização. Não é de hoje. Por causa de sindicalização, por causa da participação em política local. As Forças Armadas têm uma estrutura diferente. Nos Estados, às vezes você pode ser promovido muito rapidamente. No Governo Federal não é assim, é um sistema mais fixo e a influência é menor. Isso é uma coisa que tem que se tratar dentro das polícias para que elas não sofram de politização excessiva.

O senhor é a favor de ampliar o excludente de ilicitude, como o presidente fala, por meio de uma mudança legal?

Acho que não. Você tem quatro excludentes de ilicitude. Legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular do direito. Isso já pega tudo. O problema está às vezes na interpretação da autoridade judiciária. É mais de interpretação da autoridade judiciária e do Ministério Público.

Quando o senhor fala da atuação no Haiti (2007-2009), faz ênfase na meta de evitar dano colateral. Quando o discurso é sobre o policial ou militar terem a certeza de que não vão ser punidos caso aconteça alguma coisa, não inverte essa lógica?

Eu sou a favor de aumentar o preparo. No Haiti porque o preparo do pessoal era muito forte. Para cada batalhão que ia, o Governo mandava alguns milhões para facilitar aquele treinamento. Eu participei de combate onde gastamos milhares de tiros e não teve nenhum dano colateral. De vez em quando ainda tinha mulheres saindo de casa no meio do tiroteio com criança e ninguém atirava, porque o cara está com reflexo treinado. Os policiais do Rio de Janeiro são uns herois. Os caras subindo naqueles lugares sem capacete… aquilo é uma guerra. Ele tem família também. Esse cara tem que ser super treinado, tem que receber o melhor equipamento do mundo. Ter Inteligência [por trás]. E não é só problema policial, você precisa ter medidas administrativas para melhorar a situação da população. A população só está na mão do bandido pela falta de Estado. Uma omissão histórica do Estado.

Essas operações aéreas nos morros do Rio de Janeiro… o que o senhor, que tem experiência nisso, acha?

Tem que ter muito cuidado. O tiro do helicóptero é um tiro muito problemático, porque a dificuldade de precisão é muito grande. Agora também você não pode achar que um sujeito com fuzil na mão não é uma ameaça. Esse cara é uma ameaça social para todo mundo. O problema do Rio de Janeiro não é policial. A corrupção começava no palácio de Governo. E isso vai dando o mau exemplo para baixo. Como ter uma polícia perfeita com a corrupção lá em cima? No Tribunal de Contas, na Assembleia Legislativa? Não é assim.

A PF recentemente fez um relatório apontando que a mensagem atribuída ao senhor com ofensas ao presidente Bolsonaro foi forjada. O sr. já disse que pretende ir “até o fim” nesta investigação. O que significa?

Meu interesse é saber quem foi o falsário que fez isso, coisa de bandidinho vagabundo de Internet. É uma coisa que tem que ser combatida, não por minha causa —eu não tive prejuízo nenhum pessoal—, mas você não pode disseminar esse tipo de coisa na sociedade.

Ainda mais dentro do Palácio do Planalto.

Em lugar nenhum. Mas o que eu vou fazer prefiro não falar. Fui eu que solicitei à Polícia Federal [a análise das mensagens]. Aquilo não é só falso. Aquilo é medíocre, amador.

Bom, parece ter funcionado…

Não, acho que não. Porque a minha saída do Governo não tem nada a ver com isso. É aí que as pessoas confundem.

Então por que o senhor saiu do Governo?

Aí você tem que perguntar para o presidente. Ele que tem essa prerrogativa de convidar e dispensar. Nenhum governo no mundo começa e termina com o mesmo time de ministros. Quando eu fui trabalhar, era por um projeto. Você vai trabalhar porque você acha que pode ajudar. Não fui nem por status de ministro, que isso nunca me encantou. Onde eu cheguei ao máximo foi na minha profissão [no Exército]. Ministro é uma situação temporária. Nem é por necessidade financeira. Mas isso aí tem um limite, que é exatamente a decisão presidencial.

O senhor falou com o presidente depois da saída do Governo?

Não.

Voltaria a servir ao presidente?

Não, de jeito nenhum. Porque já tive minha chance. Nesse Brasil tem milhares de pessoas boas.

Em outras entrevistas o senhor já falou da influência de Carlos Bolsonaro…

Não falei especificamente dele. Eu evito falar de nomes, de pessoas. Tem gente que tem problema mental, tem gente que usa a Internet para terapia ocupacional, tem de tudo. Então hoje a gente tem que conviver com essa liberdade. Mas muita gente esqueceu que essa liberdade não elimina o Código Penal. Calúnia, injúria, difamação tudo isso continua valendo.

Se for comprovado que há pessoas do Palácio do Planalto envolvidas no caso contra o senhor, é um problema de Estado.

Aí é diferente. Se você tem pessoas em funções públicas, recebendo dinheiro público, é diferente. Mas tudo é coisa que precisa de comprovação. Estamos tratando de crime, não de política. Isso aí faz parte de um comportamento de milícia radical, de gangue de rua dentro do ambiente virtual. Satisfaz a um grupo de cães raivosos. Você percebe que é uma coisa montada, um comportamento de seita. Não significa nada.

O senhor falou em outra entrevista que via o Governo deixando de lado o combate à corrupção, que era uma bandeira de campanha. Por que o senhor acha isso?

Não falei que deixou de lado, falei que não pegou com a intensidade que poderia, já que era uma das grandes bandeiras.

O presidente deveria dar o exemplo no caso dos filhos dele, falando para abrir as portas para que eles sejam investigados? O Ministro do Turismo está denunciado, por exemplo. A denúncia já aconteceu, ele é réu.

Eu acho que a partir da hora que está sendo investigado, tem que esperar terminar a investigação. Seja contra quem for. (No caso do ministro), aí tem a promessa de campanha. Ele falou que se fosse denunciado, ele afastaria. Quando você não faz o que prometeu, tem que explicar por que não está fazendo. Mas aí é com o presidente, não vou entrar nessa..

Antes de trabalhar no Governo Bolsonaro, Santos Cruz já havia assumido a chefia de assuntos militares da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) no Governo Dilma. Foi também secretário nacional de Segurança Pública sob Temer. Nas últimas semanas, ele tem se movimentado para criar canais diretos de comunicação com a população. Além do Twitter, tem agora um canal no YouTube.

O senhor fala com desenvoltura de política. Li que tem convites de vários partidos. Vai disputar as eleições? Descarta concorrer em 2022?

Não descarto, mas não pensei ainda em nenhuma vertente política.

Como se definiria ideologicamente? Direita? Centro-direita?

Ideologicamente eu sou um clássico elemento de direita. Sou contra filosofia comunista, conheço os efeitos do socialismo tupiniquim demagógico. Sou contra extremismo. Sou contra essa divisão social de direita e esquerda, ter que estar em um extremo ou outro. A população brasileira quer equilíbrio. Nossa característica principal é de levar a vida. Não de levar a vida brigando.

O senhor já criticou o alinhamento automático do Brasil com os Estados Unidos em política externa. Quais custos podemos ter em termos de defesa?

Qualquer alinhamento automático não é bom, por filosofia. Você não pode se alinhar automaticamente com outro país, seja China ou Estados Unidos. O Governo pegou uma vertente muito forte pro lado dos Estados Unidos e isso não é bom. Você tem que analisar e não pode ter um comportamento ideológico, porque ele direciona você de tal forma que perde a capacidade de análise.

Na discussão atual, o que se sabe por uma reportagem da Folha, é que os americanos dizem que se o Brasil aceitar a empresa chinesa no leilão do 5G, o compartilhamento de tecnologia em defesa ficará comprometido.

Sim, mas você tem outras tecnologias de defesa que não só a americana. Isso é um jogo comercial, de política internacional. Eles não querem porque os chineses estão em um estado bem avançado de 5G. E o Brasil é um dos grandes mercados. Existem mecanismos para você fazer um cálculo, ver o que vale a pena e interessa estrategicamente, comercial e politicamente.

O Brasil historicamente mediou conflitos na região. O senhor acha que o Brasil perdeu, com o alinhamento automático aos Estados Unidos, uma capacidade de mediar, por exemplo, na Venezuela?

O Brasil não rompeu relações diplomáticas com a Venezuela. Teve um reconhecimento daquele [Juan] Guaidó… o Guaidó nem se confirmou como uma figura importante no cenário, né? Mas de qualquer jeito tem aqui uma embaixadora do Guaidó. Não se deve fechar portas e temos canais abertos.

Quais os maiores riscos para o Brasil no cenário internacional?

Não vejo o Brasil com grandes riscos internacionais. Vejo coisas internamente a que o Brasil precisa se dedicar muito, que é o combate à corrupção e à redução da desigualdade social. No preto no branco, a desigualdade social é uma dos fatores que mais agride o Brasil.

O senhor acha que falta essa menção à desigualdade no discurso do Governo?

Há algumas iniciativas, mas ainda é pouco. Você tem que ter um plano muito mais forte para reduzir a desigualdade. É um negócio muito sério. O Brasil tem supersalários inaceitáveis. Se você é centro-avante do Flamengo e ganha 500.000 o problema é teu. Paga imposto de renda e está tudo bem. O problema é quando é dinheiro público. Tem salários fantásticos, inimagináveis. Enquanto na base você tem discrepâncias muito grandes, que tem de ser reduzidas.

O senhor acha o PCC uma ameaça à soberania, já que agora eles dominam alguns pontos de fronteira no Paraguai?

Sem dúvida nenhuma. Tem que ser combatido. Começa a ter muito dinheiro e a querer financiar a política. Existiam boatos até deles financiarem os estudos de pessoas para serem juízes e promotores no futuro. Precisa investigar para ver se é verdade porque se não você daqui a pouco tem gente dentro do sistema, onde advogado, ao invés de ser advogado, é um membro da facção. Em São Paulo tiveram até que prender 25, 30 advogados porque não estavam fazendo um trabalho normal. O crime organizado pode entrar no financiamento de campanha em cidades pequenas na fronteira. O aparato policial precisa ser muito técnico para combater.

Para encerrar, quero falar da relação militares e civis na democracia. Hoje em dia existe uma preocupação de que essa exaltação do golpe de 64 ainda aconteça dentro dos quartéis…

O problema não é esse. O problema é tentar transferir para a realidade atual. Atualmente não tem sentido você imaginar. Naquela época teve. Era outro contexto.

O governo Temer quebrou a tradição, que vinha desde o governo de FHC, de nomear um civil para a Defesa. O senhor acha que precisa ser um militar?

Civil ou militar, o importante é escolher bem. Não pode ter desconfiança [com civil no comando]. Isso se chama atraso. Você não pode criar desconfiança entre um e outro. Isso é mediocridade. Estimular briga, desconfiança entre civil e militar, falar que o Congresso não presta… Isso é loucura. Acho que os militares interferiram corretamente em 1964, mas isso é um posicionamento histórico. Não é porque eu acho isso que eu vou achar que agora tem cabimento. Não, não tem cabimento. Agora não tem conexão nenhuma com a realidade. Fica mais na paixão do que na realidade. Não tem esse negócio de que nós somos a salvação da pátria. A salvação da pátria é todo mundo.


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