19/04/2024 - Edição 540

Poder

Bebianno: “Temo por uma ruptura institucional”

Publicado em 06/03/2020 12:00 -

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Em entrevista aos jornalistas da bancada do programa Roda Viva, da TV Cultura, no último dia 2, o ex-Secretário Geral da Presidência da República, Gustavo Bebianno, avaliou que o governo Bolsonaro “não deve terminar bem”.

A fala de Bebianno, que era o homem forte de Jair Bolsonaro até ser fritado por Carlos Bolsonaro e demitido em fevereiro do ano passado, se dá em meio às articulações para uma manifestação de bolsonaristas que pedirá o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) e que foi divulgada pelo próprio presidente.

“Com essa popularidade, essa vitória incontestável, Bolsonaro tinha a obrigação de estender a mão e arrefecer os ânimos. Se continuar no caminho que estamos não vai terminar bem”, disse.

“Eu temo por uma ruptura institucional (…) Tenho a expectativa de ver um país próspero, mas presidente mantém os ânimos aquecidos, essa agressividade, esses ataques à imprensa, qualquer pessoa que tem um milímetro de divergência é taxada de comunista… Vão fazer o que? Vão matar essas pessoas? O Brasil precisa de paz, como sempre foi. Se continuar nessa escalada não vai terminar bem”, reforçou o ex-ministro, que disse não ser capaz de avaliar se Bolsonaro terminará o governo ou não.

Abin paralela

Bebianno afirmou também que um delegado da Polícia Federal participou da tentativa de montagem de uma Agência Brasileira de Inteligência (Abin) paralela, por iniciativa do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). Questionado se o delegado seria o atual diretor da Abin, Alexandre Ramagem, Bebianno preferiu não responder. “Eu lembro o nome do delegado. Mas não vou revelar por uma questão institucional e pessoal”, afirmou o ex-ministro.

Bebianno disse que o episódio aconteceu nos primeiros meses do governo, quando Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) apareceu com os nomes de um delegado federal e de três agentes que fariam parte de uma suposta Abin paralela. Segundo Bebianno, ele e o então ex-ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz, demitido meses depois, desaconselharam o presidente, sob o argumento de que a medida poderia motivar impeachment.

Bebianno ainda acusou Carlos Bolsonaro de comandar um "gabinete de ódio" no Planalto, onde, segundo o ex-ministro, são fabricadas notícias falsas. “Eu disse ao presidente que as notícias falsas não podiam estar dentro do Planalto porque poderiam dar em impeachment. Mas a pressão que o Carlos faz é tão grande que o pai não consegue se contrapor ao filho. É como aquela criança que quer um presente no shopping, esperneia e o pai não tem pulso para dizer não”, contou Bebianno.

“Um belo dia o Carlos Bolsonaro aparece com um nome de um delegado federal e três agentes que seriam uma Abin paralela. Isso porque ele não confiava na Abin. O general Heleno (chefe do gabinete Institucional da presidência) foi chamado. Ficou preocupado. Mas ele não é de confronto e o assunto acabou comigo e o general Santos Cruz. Nós aconselhamos o presidente a não fazer aquilo porque também seria motivo de impeachment. Eu não sei se isso foi instalado porque depois eu acabei saindo do governo”, afirmou.

Um dos coordenadores da campanha de Bolsonaro ao Planalto, Bebianno foi o primeiro ministro demitido no governo, com apenas dois meses do início da gestão. A sua saída foi marcada por uma crise com suspeitas de candidaturas laranjas no PSL, legenda em que o presidente venceu a eleição. A situação se agravou ainda mais após Bebianno travar embates com Carlos Bolsonaro, seu desafeto declarado.

Bebianno acredita que a Abin paralela seria utilizada para montagem de dossiês e atacar adversários, inclusive jornalistas. Na visão dele, o presidente e seus filhos não confiam nem mesmo em seus ministros. “Eles não confiam em ninguém. No fundo, ele (Bolsonaro) não confia no general Heleno, nem no general Luiz Eduardo Ramos (ministro da secretaria de governo)”.

Bebianno não é o primeiro ex-aliado da família Bolsonaro a falar sobre a Abin paralela. Em dezembro, a deputada Joice Hasselman (PSL-SP) já havia dito a CPMI das Fake News que Carlos Bolsonaro quis criar uma agência paralela no Planalto para montagem de dossiês e grampos.

No programa, Bebianno também afirmou que Carlos Bolsonaro o atingiu covardemente pelas costas, sobretudo em ataques nas redes sociais. Ele classificou o filho do presidente como uma pessoa com agressividade despropositada, "com graves problemas mentais" e que merece tratamento.

Capitão Adriano é o Celso Daniel da família Bolsonaro

Em outro ponto polêmico da entrevista, Bebianno afirmou que a investigação sobre a morte do ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, acusado de chefiar o escritório do crime, grupo suspeito do homicídio da vereadora Marielle Franco, vai perseguir a família Bolsonaro como um "fantasma". Ele comparou o assassinato do PM ao caso do ex-prefeito petista de Santo André, Celso Daniel, em 2002, e que até hoje não foi esclarecido.

“O PT tem um grande fantasma que é o Celso Daniel. E agora a família Bolsonaro tem um fantasma que é o capitão Adriano.  Parece uma queima de arquivo. Quem teria interesse na morte dele? Não sei”, afirmou Bebbiano. 

O ex-ministro, que era um dos nomes mais próximos de Bolsonaro durante a eleição, afirmou nunca ter visto Adriano, embora tenha admitido que ouvia falar dele em alguns momentos. Adriano chegou a ser homenageado por Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e este ainda empregou a mãe e a mulher do PM em seu gabinete.

“Era um nome que era conhecido, tido como um policial linha de frente e linha dura. Eu não sabia que era miliciano – disse Bebbiano. – Era um nome que ouvia algumas vezes, mas não lembro em que circunstâncias. Era alguém com quem se tinha amizade”, afirmou Bebianno.

O ex-ministro ainda classificou como "estranha" a morte de Adriano em confronto com policiais na Bahia, em fevereiro. “É estranho. Parece queima de arquivo. Quem teria interesse na morte dele? Não sei. É preciso de uma investigação séria”, ressaltou.

Ao fazer uma avaliação do governo, Bebianno afirmou que as os ataques do presidente contra a imprensa e os outros poderes criam um ambiente de instabilidade e prejudicam a economia. 

“A minha grande crítica é que o presidente está atrapalhando. Se você pegar a agenda presidencial vai ver que ele (Bolsonaro) só pensa em reeleição. Ele praticamente não trabalha pelo país (…). O presidente precisa de uma postura mais litúrgica e mais serena. O Brasil precisa progredir e acho que o presidente está atrapalhando. Há um brasil do Paulo Guedes (ministro da Economia) e um do presidente”.


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