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Capitalismo atual faz ‘mais mal do que bem’, diz pesquisa

Publicado em 21/01/2020 12:00 -

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A maioria das pessoas ao redor do mundo acredita que o capitalismo, na sua forma atual, está fazendo "mais mal do que bem", diz pesquisa divulgada antes do início da reunião de líderes empresariais e políticos, o Fórum Econômico Mundial, que acontece em Davos, nos Alpes Suíços.

Foram ouvidas mais de 34 mil pessoas em 28 países, desde democracias liberais ocidentais como Estados Unidos e França até aquelas baseadas em um modelo diferente como China e Rússia. Do total de entrevistados, 56% concordaram que “o capitalismo como existe hoje faz mais mal do que bem ao mundo".

Este ano foi a primeira vez que o “Edelman Trust Barometer”, empresa de comunicação americaa que há duas décadas pesquisa dezenas de milhares de pessoas em suas instituições centrais, procurou entender como o próprio capitalismo era visto.

Os autores do estudo disseram que pesquisas anteriores já mostravam um crescente sentimento de desigualdade e isso os levou a perguntar se os cidadãos estavam começando a ter dúvidas sobre as democracias capitalistas do Ocidente.

"As pessoas estão questionando se o que temos hoje e o mundo em que vivemos é otimizado para que eles tenham um bom futuro," afirma David Bersoff, pesquisador principal do estudo produzido pela empresa de comunicações americana Edelman.

Lançada em 2000, a pesquisa foi criada para explorar as teorias do cientista político Francis Fukuyama, que após o colapso do comunismo declarou que a democracia capitalista liberal havia eliminado ideologias rivais e, portanto, representava "o fim da História".

Essa conclusão foi contestada por críticos que apontam para tudo, desde a crescente influência da China à disseminação de líderes autocráticos, protecionismo comercial e crescente desigualdade após a crise financeira global de 2007.

Progresso tecnológico e emprego preocupam

Entre os 28 países onde foi realizado o levantamento, a falta de confiança no capitalismo foi maior na Tailândia e na Índia, com 75% e 74%, respectivamente, com a França logo atrás, com 69%. A maioria prevaleceu em outros estados da Ásia, Europa, Golfo, África e América Latina.

Somente na Austrália, Canadá, Estados Unidos, Coréia do Sul, Hong Kong e Japão as maiorias discordaram da afirmação de que o capitalismo atualmente causava "mais mal do que bem".

A pesquisa confirmou um conjunto de preocupações já conhecidas, que variam de questões sobre o ritmo do progresso tecnológico e insegurança no emprego, a desconfiança da mídia e a sensação de que os governos nacionais não estavam à altura dos desafios do dia.

Bilionários

Os 2.153 bilionários do mundo possuem uma riqueza maior do que 4,6 bilhões de pessoas, aproximadamente 60% da população global. O dado revelado pelo novo relatório da Oxfam, lançado no último dia 19, evidencia que a concentração de renda chegou a nível recorde. 

O documento Tempo de Cuidar – O trabalho de cuidado mal remunerado e não pago e a crise global da desigualdade, demonstra ainda como as economias mundiais são sexistas. Isso porque, conforme a pesquisa, enquanto os donos das grandes fortunas acumulam cada vez mais riqueza, as mulheres são responsáveis por 75% do trabalho de cuidado não remunerado realizado no mundo. 

“O cuidado é alimentar, cozinhar, arrumar, cuidar da pessoa doente, da criança. Esse serviço todo é importante para a economia e não está sendo remunerado adequadamente ou, muitas vezes, não é remunerado. Na divisão do trabalho, a mulher é aquela que cuida e o homem é aquele que traz os recursos. Isso é antigo, mas muito presente na sociedade, em distintos países e cultura”, critica Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil.

Segundo o relatório, mulheres e meninas ao redor do mundo dedicam 12,5 bilhões de horas, todos os dias, ao trabalho de cuidado não remunerado. Se fossem remuneradas, isso significaria uma contribuição de, pelo menos, US$ 10,8 trilhões por ano para a economia global, o triplo do valor gerado pela indústria tecnológica, por exemplo.

Maia complementa que a desigualdade de gênero precariza ainda mais a condição de trabalho das mulheres fora de casa. Em todo mundo, 42% delas não conseguem um emprego porque ocupam todo o seu tempo com o trabalho de cuidado e do lar. Entre os homens, esse percentual é de apenas 6%. 

Outro dado publicado no novo levantamento da Oxfam se refere às mulheres que vivem em comunidades rurais e países de baixa renda. Elas dedicam até 14 horas por dia ao trabalho de cuidado não remunerado, cinco vezes mais que o homens. A organização também registra que as meninas que realizam um grande número dessas funções apresentam taxas de frequência escolar mais baixa. 

Para a porta-voz da Oxfam, as estatísticas mostram que a situação tende a piorar.

“A população mundial está envelhecendo e vai precisar de cuidados, de saúde e de assistência. Aqui no Brasil, os recursos para essas políticas públicas estão sendo reduzidos. O IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] diz que, até 2050, teremos 77 milhões de pessoas que vão precisar de cuidado, entre idosos e crianças. Se não tivermos um arcabouço de serviço público para atender, quem vai cuidar dessa população? De novo, as mulheres e as meninas”, avalia. 

Outros dados corroboram a avaliação de Maia sobre a perpetuação dessa estrutura desigual. Apenas 30% dos municípios brasileiros contam com instituições de assistência a idosos, localizados em sua maioria no sudeste do país, de acordo com informações levantadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ou seja, o cuidado continuará a ser feito informalmente pelas famílias, com o trabalho não remunerado de uma maioria esmagadora de mulheres. 

Um mundo para os 99%

O relatório Tempo de Cuidar também apresenta sugestões para que as desigualdades de gênero e de renda sejam enfrentadas. Entre elas, o desenvolvimento de legislações que protejam os direitos trabalhistas das trabalhadoras domésticas e cuidadoras – que representam 80% dos 67 milhões de indivíduos que trabalham na área. 

A Oxfam também recomenda a adoção de medidas para reduzir drasticamente o fosso entre ricos e pobres. Para isso, indica a tributação de grandes fortunas e o combate à sonegação fiscal com urgência, assim como o investimento dos governos em sistemas públicos de prestação de cuidados.

Katia Maia é enfática ao defender que uma reforma justa, que tribute os mais ricos e não os mais pobres, ajudaria diretamente a diminuir a opressão e exploração de mulheres e meninas. Ela argumenta que, por meio dos recursos que seriam tributados, o Estado teria maior capacidade de oferecer assistência social e serviços públicos de qualidade, diminuindo a sobrecarga que recai sobre os ombros das mulheres em todo o mundo.


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