20/04/2024 - Edição 540

True Colors

Torcidas de futebol LGBT abrem espaço para falar sobre discurso de ódio nas escolas

Publicado em 27/11/2019 12:00 - Bianca Gomes – Estado de SP

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

Com medo de agressões físicas e verbais nos estádios de futebol, torcedores LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e transgêneros) deixaram as arenas oficiais e passaram a se organizar em torcidas livres nas redes sociais.

O cenário foi retratado na reportagem Com medo de violência nos estádios, torcidas LGBT usam redes sociais como arquibancadas, do repórter Gonçalo Junior, que mostrou como a homofobia está presente nas torcidas de futebol e como o público LGBT tem se movimentado para inverter esse cenário. No vídeo abaixo, Gonçalo fala sobre o processo de criação da matéria:

1) Carta do leitor

Antes reservada a uma parte delimitada no jornal impresso, a opinião dos leitores ganhou novos formatos com o advento da internet. Agora, além de não ser mais necessário ir ao correio para enviar um comentário, os espaços onde os leitores podem expressar suas opiniões também estão nos portais online de notícia. Sobre o assunto, é possível abordar as seguintes questões:

  1. Os alunos devem pesquisar sobre como eram os espaços dos leitores (conhecidos como “carta do leitor”) nos jornais de antigamente e como são hoje. Eles devem comparar os dois formatos e apontar o que mudou, refletindo se as mudanças foram positivas ou não. No caso do Estadão, edições passadas do jornal podem ser consultadas no Acervo (uma dica é inserir na busca “fórum dos leitores”). Hoje, é publicado também no online com uma versão maior do que a do impresso.
  2. Nas pesquisas de cartas em jornais, peça para que cada aluno escolha uma carta de leitor; ele deverá avaliar a opinião expressa e os argumentos utilizados. Depois, discuta com a classe a função que a “carta do leitor” desempenha (se é de crítica, por exemplo) e a importância que ela tem para um veículo de comunicação (principalmente se pode ajudar a melhorar o trabalho do jornalista).
  3. Aproveite o tema para trabalhar com os alunos o gênero textual carta, abordando a característica principal de haver sempre um emissor (remetente) e um receptor (destinatário).
  4. Por fim, os alunos deverão ler a reportagem “Com medo de violência nos estádios, torcidas LGBT usam redes sociais como arquibancadas” e escrever uma carta como as da seção carta do leitor, tendo como principal objetivo expressar a opinião sobre a matéria.

2) Liberdade de expressão e discurso de ódio

Apesar de os veículos terem adaptado o funcionamento da “carta do leitor” para o mundo digital, a opinião de quem lê as matérias pode ser publicada como, quando e onde as pessoas quiserem, fato que pode ser considerado uma maior democratização desses espaços. Mas é preciso ter responsabilidade com aquilo que se escreve, já que a internet e as redes sociais estão visíveis para qualquer um. Se houver tempo, essa atividade pode ser combinada com a anterior.

  1. Neste primeiro exercício, os alunos deverão analisar a relação entre os espaços de fala na internet e o discurso de ódio neste canal de comunicação. Um caminho possível é dividir os estudantes em grupos e pedir para que leiam e analisem, a partir de diferentes redes sociais (facebook, twitter, instagram, linkedin), os comentários na matéria do repórter Gonçalo Junior. Se o professor desejar, pode ampliar o exercício para outras matérias do mesmo tema.
  2. A partir da análise, proponha um debate acerca dos limites entre discurso de ódio e liberdade de expressão? Se houver tempo, os alunos podem ler alguns dos seguintes textos:
  • “Primeira Carta Sobre Tolerância”, do filósofo John Locke, considerada o marco da defesa da liberdade de expressão;
  • “Declaração de Direitos do Estado da Virgínia”, em que, pela primeira vez, a garantia da liberdade de expressão;
  • Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH): responsável por inspirar tantas outras e por garantir, em seu artigo 19, o direito à liberdade de opinião e expressão;
  • “Panorama sobre o discurso de ódio no Brasil”, documento da ONG Artigo 19, em que se define o discurso de ódio (página 1);
  • Podcast do canal Salvo Melhor Juízo sobre discurso de ódio no Brasil, em que se faz uma ligação interessante com polarização política e o aumento do número de refugiados
  1. Reflita com os alunos sobre o discurso de ódio presente nas matérias sobre o público LGBT. É importante que se discuta a criminalização da homofobia, em junho deste ano, o respeito à diversidade e a participação responsável na internet. Por último, eles deverão, juntos, criar uma campanha na escola contra o discurso de ódio. Eles podem preparar cartazes, cartilhas e panfletos sobre o tema ou então criar intervenções artísticas, utilizando teatro, dança ou música.
  2. Na primeira questão, os alunos perceberão que as redes sociais podem ser um lugar de liberdade de expressão, um importante espaço para unir pessoas em prol da mesma causa ou interesse, mas também podem ser utilizadas para disseminar um discurso de ódio. No caso das torcidas de futebol LGBT, elas foram fundamentais. Nesta atividade, os alunos deverão pesquisar em redes sociais sobre como as torcidas estão organizando movimentos contra a homofobia dos estádio; os estudantes podem, inclusive, procurar sobre os próprios times para que torcem. Depois da pesquisa, dedique um tempo da aula para os discentes compartilharem o que cada um encontrou.

3) Preconceitos no esporte

Ainda que o futebol seja considerado um símbolo da cultura brasileira, tanto os campos quanto às arquibancadas não são, ainda, espaços democráticos. A matéria sobre as torcidas LGBT é um exemplo disso, mas é possível pensar, por exemplo, no assédio que mulheres sofrem nos estádios e na pouca valorização do futebol feminino.

  1. Os alunos deverão analisar a campanha da Federação Paulista de Futebol (FPF) veiculada na transmissão televisiva da final do Campeonato Paulista Feminino, respondendo qual mensagem a ação quis mostrar com o placar.
  2. Divida a sala em grupos de 4 a 5. Cada grupo deverá analisar a cobertura da editoria de esportes de veículos jornalísticos diferentes. Uma proposta é estabelecer um recorte de período (por exemplo, nos últimos 7 dias) e pedir para os alunos contarem o número de notícias sobre futebol masculino e feminino. Dependendo do ano da turma, é possível pedir uma análise qualitativa também, do teor das matérias sobre futebol feminino (se são sobre campeonatos, premiações, diferenças salariais). Cada grupo deverá expor o resultado e discutir qual espaço na mídia o futebol feminino tem e como esse espaço é importante para dar mais visibilidade ao esporte.
  3. Diferença salarial: peça aos alunos que pesquisem (e tragam para a sala de aula) dados sobre a diferença de valor nas premiações de campeonatos mundiais do futebol masculino e feminino. A ideia é mostrar a eles que o dado deve ser buscado em fontes confiáveis, como o próprio site da fifa. O outro objetivo é falar sobre a diferença gritante de pagamento e como isso prejudica a evolução do esporte atualmente.
  4. Disponha a classe em um formato de roda e pergunte aos alunos por qual motivo o futebol feminino não é valorizado no Brasil. Depois da discussão, exiba em sala de aula o vídeo ‘Deixa Ela Competir’, que trata sobre o preconceito contra a mulher em outros esportes, além do futebol. Discuta com eles o fato de mulheres serem desencorajadas da prática desportiva ainda quando crianças. A ideia é que o espaço do diálogo fique aberto para relatarem suas experiências com o assunto. Elas, por exemplo, se passaram por essa situação. E eles se já inibiram alguma menina de jogar. Ao final, leve os alunos para uma quadra e proponha uma partida de futebol ou de outro esporte.

4) Decreto de Vargas

O futebol feminino foi proibido no País em 1941, durante o Estado Novo, de Getúlio Vargas, por meio do decreto 3.199. Uma ideia é organizar uma visita guiada ao Museu do Futebol e pedir para alunos coletarem todas as informações que eles encontrarem sobre a história do futebol feminino (provavelmente, uma delas será o próprio decreto). De volta à sala de aula, discuta as seguintes questões: existe, no museu, uma igualdade entre informações sobre futebol feminino e masculino? Em qual contexto o decreto de Vargas se deu? Por que o decreto proíbe as mulheres de praticarem alguns esportes, não todos? Isso está ligado a alguma imagem ou papel social que se esperava que elas devessem ter?

Se não for possível levar os alunos ao museu, existe a possibilidade de eles explorarem as exposições virtuais disponíveis nos sites (https://www.museudofutebol.org.br/pagina/exposicoes-virtuais e https://contraataque.museudofutebol.org.br/) e lerem a matéria Da proibição ao reinado de Marta: 30 anos da seleção feminina, do site Capitu, do Estadão.

5) Resumo de livro

A reportagem Com medo de violência nos estádios, torcidas LGBT usam redes sociais como arquibancadas nasceu da leitura do livro BICHA. Homofobia estrutural no futebol, escrita pelo jornalista do Estadão João Abel. No vídeo abaixo, ele dá dicas de como usar o tema em sala de aula:

O livro é um exemplo claro de como uma obra pode inspirar outros trabalhos, mesmo em outros formatos. Desse entendimento, os alunos deverão escolher um livro-reportagem para ler e produzir um trabalho a partir da leitura. Deixe aberta a possibilidade de qualquer formato: reportagem, minidocumentário, vídeo tipo booktuber, podcast, memes, histórias em quadrinhos (aqui uma boa referência).

6) Ofensas

Ao longo de todo especial, fica claro o peso do uso de certas palavras pejorativas para discriminar os homossexuais nos estádios brasileiros. Com isso em mente, proponha aos alunos que:

  1. Procurem na Internet as origens etimológicas das palavras “viado” e “bicha” para designar os homossexuais e, a partir dessas origens, busquem explicar por que esses termos costumam ser vistos pela comunidade LGBT como ofensivos.
  2. Procurem explicar por que o uso do termo “viado”, tanto no post do palmeirense William De Lucca quanto na declaração do gremista Sergio Cunha, não parece ser ofensivo. Como isso se relaciona ao processo de ressignificação da palavra “queer” pela comunidade LGBT?
  3. Em grupos de cinco, peça aos alunos para que façam, com tempo restrito a trinta minutos, uma lista com o máximo de elogios e outra com o maior número de xingamentos (sem qualquer restrição a termos de baixo calão) que forem capazes de lembrar. Normalmente, é muito mais fácil eles fazerem a lista de xingamentos. Discuta com seus alunos o porquê dessa maior facilidade na nossa sociedade.
  4. Peça aos alunos que separem os xingamentos que pertençam ao campo lexical da sexualidade e discuta com eles o porquê da fartura de xingamentos ligados a esta temática.

7) Proposta de redação

A partir da leitura do Especial Com medo de violência nos estádios, torcidas LGBT usam redes sociais como arquibancadas e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija um texto dissertativo-argumentativo em modalidade escrita formal da língua portuguesa sobre o tema “Estratégias de combate ao preconceito de gênero nos estádios brasileiros”, apresentando proposta de intervenção que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.

Proponha aos alunos que escrevam um texto de 30 linhas dividido em quatro parágrafos que respeitem a seguinte estrutura, apresentada no Manual de Redação do ENEM: TESE – ARGUMENTOS – PROPOSTA DE INTERVENÇÃO. Sendo o primeiro parágrafo composto pela exposição da sua tese (a melhor estratégia para combater preconceito de gênero nos estádios brasileiros) Os dois seguintes deverão ser compostos pela apresentação dos seus argumentos e o quarto e último por uma proposta de intervenção, entre as tantas que podem ser vislumbradas em muitas passagens do texto de Gonçalo.

8) Enquete

Na matéria sobre as torcidas LGBT, o repórter utilizou a enquete para saber o que os leitores achavam que deveria ser feito para diminuir ou acabar com os casos de homofobia nos estádios de futebol do Brasil. Divida os alunos em grupos de quatro e peça que façam enquetes sobre qualquer questão envolvendo os temas abordados na reportagem.

A enquete pode ser feita dentro da própria escola, entrevistando estudantes e funcionários, ou os alunos podem distribuir para outros conhecidos a partir de um formulário online do Google. Eles deverão apresentar os resultados em sala de aula, utilizando recursos gráficos.

Leia outros artigos da coluna: True Colors

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *