27/04/2024 - Edição 540

Poder

WhatsApp admite envio ilegal de mensagens em massa nas eleições de 2018

Publicado em 11/10/2019 12:00 -

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O WhatsApp admitiu pela primeira vez que a eleição brasileira de 2018 teve uso ilegal de envio massivo de mensagens, com sistemas automatizados contratados de empresas.

“Na eleição brasileira do ano passado houve a atuação de empresas fornecedoras de envios maciços de mensagens, que violaram nossos termos de uso para atingir um grande número de pessoas”, afirmou Ben Supple, gerente de políticas públicas e eleições globais do WhatsApp, em palestra no Festival Gabo.

Reportagens da Folha de S.Paulo do ano passado já haviam revelado a contratação durante a campanha eleitoral de empresas de marketing que faziam envios maciços de mensagens políticas. Uma dessas reportagens noticiou que empresários apoiadores do então candidato Jair Bolsonaro (PSL) bancaram o disparo de mensagens em massa contra Fernando Haddad (PT).

O TSE veda o uso de ferramentas de automatização, como os softwares de disparo em massa. Além disso, empresários contrataram disparos a favor e contra candidatos, sem declarar esses gastos à Justiça Eleitoral, o que configura o crime de caixa dois.

Bolsonaro chegou a apresentar uma ação ao TSE contra Haddad e a Folha, alegando que o então candidato do PT e sua vice, Manuela d’Ávila, teriam se aliado ao jornal para atacar sua campanha, principalmente com a reportagem que denunciou o impulsionamento de fake news em massa pelo WhatsApp. No entanto, a ação foi rejeitada por unanimidade pelo Tribunal.

TSE se acovarda

A jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo, foi pesadamente atacada e ameaçada de morte por sua reportagem, publicada em outubro do ano passado, que revelou que empresas de marketing foram contratadas por empresários apoiadores da candidatura de Jair Bolsonaro a fim de dispararem milhões de mensagens a seu favor e contra o adversário.

O envio em massa é considerado ilegal pelo Tribunal Superior Eleitoral e serviços eleitorais que não sejam declarados à Justiça podem configurar caixa 2. Por exemplo, a campanha do petista Fernando Haddad chegou a ser multada por impulsionar ataques contra Bolsonaro.

Mesmo com evidências gritantes, o corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Jorge Mussi, não parece interessado em descobrir quem estava por trás dos disparos de mensagens pró-Bolsonaro, nem quem pagou um bom dinheiro por elas. Não quis que os jornalistas da Folha responsáveis por investigações testemunhassem no processo (aberto pela candidatura de Haddad após reportagem do jornal), nem os donos das agências envolvidas ou mesmo representantes do WhatsApp. Mas aceitou uma testemunha indicada pela defesa do presidente, que prestou serviços para a sua campanha, em 2018, e trabalha, hoje, em sua assessoria de imprensa.

Surreal, mesmo para o roteirista desta pornochanchada chamada Brasil.

Ao mesmo tempo em que o sistema de Justiça atua para que a sociedade fique sem respostas quanto ao passado recente, o Congresso Nacional agiu para que tenhamos um futuro mais turvo ainda. No projeto através do qual afrouxaram as regras eleitorais, partidos autorizaram a si mesmos a usar dinheiro de fundo público para impulsionar conteúdo na internet. Considerando que o TSE não tem demonstrado ser capaz de criar mecanismos para mitigar a manipulação ilegal do debate público eleitoral por via digital, imagina como vai ser com a porta aberta por essa mudança na legislação.

O WhatsApp reconhece tudo isso, mas foi e será corresponsável pelas consequências disso, não é um observador externo e independente. Ao não estabelecer mecanismos eficazes para identificar e mitigar o impacto da difusão paga de conteúdo, contribui para o cenário de terra arrasada.

A lei brasileira afirma que todo o financiamento de campanha deve ser público, mas candidaturas continuam contando com empresários bilionários que fazem o serviço sujo por baixo do pano.

No final, tudo fica por isso mesmo. Candidatos são eleitos. Empresários têm seus interesses apaixonadamente defendidos. Agências de marketing levam uma fábula. Políticos e magistrados continuam como proprietários do país. Aplicativos e empresas de tecnologia ficam cada vez maiores.

A culpa pela chanchada política, econômica, social e de justiça? Repetindo o mantra de nosso presidente, é do mensageiro, que não conta a história que "deveria" contar. Com jornalistas presos e redações fechadas, talvez o país alcance a paz da ignorância suprema. Como na ditadura.


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