19/04/2024 - Edição 540

Brasil

Enquanto lideranças indígenas denunciam à ONU violações de Direitos Humanos, no Brasil, povo Guarani sofre quatro ataques

Publicado em 20/09/2019 12:00 -

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Na mesma semana em que lideranças do povo Guarani de quatro países da América Latina estão na ONU para denunciar as graves violações de Diretos Humanos que vêm sofrendo, no Brasil, pelo menos quatro terras indígenas do povo Guarani sofrem atraques num período de cinco dias, deixando entre os feridos idosos e crianças.

Entre os dias 16 a 20 de setembro lideranças indígenas do Brasil, Argentina, Paraguai e Bolívia e membros do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) estão em Genebra, Suíça, e participam da 42ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU (Organizações das Nações Unidas), com o objetivo de denunciar as violações ocorrentes nas fronteiras onde estão presentes os povos Guarani.

As denúncias parecem não intimidar, e a violência direta soma-se à omissão por parte dos Estados Nacionais frente aos Guarani, especialmente ao não garantir o reconhecimento e a demarcação de suas terras tradicionais. Tal condição têm gerado um ambiente de crise humanitária e de violência generalizada, expondo muitas destas comunidades ao enfrentamento físico por seus direitos básicos de existência e consequentes assassinatos de suas lideranças.

Na quarta-feira (11) e na madrugada de quinta-feira (12), capangas de proprietários rurais com terras incidentes sobre territórios tradicionais, contratados a partir de empresas de segurança, atacaram um grupo Guarani Kaiowá durante invasão ao tekoha Ñu Vera, em Dourados (MS). Dois Guarani Kaiowá ficaram feridos por tiros de bala de borracha, um deles após ser alvejado pelas costas, na altura do ombro. “Começa sempre com muito tiro nos barracos e depois os jagunços vêm e destroem tudo”, conta uma liderança das cerca de oito retomadas que juntas com Ñu Vera ocupam áreas que fazem limite com às aldeias Bororo e Jaguapiru, na Reserva Indígena de Dourados.

No sábado, 14, a retomada Mbya Guarani da Terra de Areia, no Rio Grande do Sul, foi alvo de ataques. Homens armados com pistolas e fuzis invadiram a comunidade, ameaçaram a todos e exigiram aos indígenas que abandonem a área. Após as ameaças, invadiram as casas e reviraram tudo. Os sujeitos não identificados se apresentaram como policiais e disseram que receberam uma denúncia de invasão. A área, porém, é pública.

No dia seguinte, 15, os ataques se deram na retomada Guarani Mbya da Ponta do Arado, em Belém Novo próximo à capital, Porto Alegre, sofreu mais uma investida a tiros de indivíduos não identificados a partir da Fazenda Arado Velho, área sobreposta ao território tradicional reivindicado pelos indígenas.

A comunidade fica às margens do rio Guaíba, área assediada por empreendimentos imobiliários. Desde que retomaram a terra, em junho de 2018, os Mbya Guarani sofreram atentados a tiros, são ameaçados de morte e tiveram seus direitos de ir e vir cerceados pelos que se dizem donos do empreendimento imobiliário e que pretendem construir na região um condômino de luxo onde para abrigar famílias de classe média alta.

Ainda nesta semana, o povo Mbya Guarani, desta vez da terra Guadjayvi, localizada em Charqueadas, também no Rio Grande do Sul, recebeu ameaças de homens armados. Segundo informações do Cimi Regional Sul, área concedida pelo estado para usufruto dos indígenas, será diretamente impactada pela Mina Guaíba, da COPELMI, que pretende explorar carvão na região. Segundo o Cacique Claudio Acosta, na sexta-feira, 13, “um grupo homens se dizendo ‘seguranças’ da COPELMI, se colocaram em frente à aldeia Guadjayvi e comunicaram aos indígenas que não deveriam se movimentar no local porque estavam correndo risco de levarem tiros de arma de fogo”.

Os quatro casos retratam a extrema situação de violência que os Guarani enfrentam em seus territórios e vêm sendo denunciados no âmbito das Nações Unidas.

Casos como estes parecem se conectar com os demais episódios de violências praticadas contra as comunidades Guarani. Na avaliação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Regional Sul, parecem ações planejadas que buscam intimidar as comunidades que fazem as denúncias, pois seus territórios são visados por projetos de megamineração, especulação imobiliária e expansão do agronegócio.

“Parece, ao nosso entender, tratar-se de milicianos que prestam serviço aos opositores dos direitos indígenas no Brasil, tendo em vista impor, pela força bruta, ações contra as lutas pela terra”, afirma, em nota, o regional.

Se de um lado as afrontas pela força bruta violam os direitos dos povos indígenas, de outro as manobras jurídicas tendem a criminalizar as manifestações e denúncias que os Guarani têm realizados, sejam elas nacionais ou internacionais.

Em abril desse ano, no oeste do Paraná, os Avá-Guarani chegaram a ser impedidos de realizar manifestação em vias públicas. O interdito proibitório movido pela Advocacia-Geral da União (AGU) previa o recolhimento de crianças e jovens, multa de R$ 5 mil/hora por pessoa, prisão em flagrante e crime de desobediência, caso os Avá-Guarani descumprissem a ordem e realizassem manifestação em vias públicas.

Outra situação similar, ainda no Paraná, ocorreu em julho, após lideranças Guarani realizavam um ato em frente à prefeitura de Guaíra, município que fica na fronteira do Brasil com o Paraguai, onde reivindicavam o acesso à Educação de qualidade. Na ocasião, os Guarani sofreram mais um interdito proibitório que os impedia de se manifestar no Paço Municipal e demais setores da administração pública, assim como proibia-os de utilizar arco e flecha e demais instrumentos tradicionais pertencentes ao povo.

Separados por fronteiras nacionais, os Guarani, um dos maiores povos do continente americano, estão massivamente presentes nas terras baixas da América do Sul. Com territórios que abrangem quatro países diferentes, somam mais de 285 mil pessoas, distribuídas em cerca de 1.500 comunidades e vivem em constante ameaças, violência das mais diversas formas, racismo, deslocamentos forçados, assassinatos e suicídios.


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