26/04/2024 - Edição 540

Poder

Ao antecipar 2022, Bolsonaro acerta o próprio pé

Publicado em 06/09/2019 12:00 -

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O PIB continua no chão? Há mais de 12 milhões de desempregados no país? O Tesouro Nacional foi à breca? Dane-se! Jair Bolsonaro só pensa naquilo: a reeleição.

No momento, o capitão concentra-se na demolição de potenciais adversários no centro e à direita. Ataca João Doria e Luciano Huck. Vira Sergio Moro, já bem passado, na frigideira. Sonha com uma disputa que reproduza o cenário polarizado de 2018, de preferência com um petista no córner adversário.

O flerte de Bolsonaro com a reeleição não é apenas um erro. É uma temeridade. Na recentíssima campanha eleitoral, o recandidato havia jurado que não disputaria um segundo mandato. Dissera que a reeleição tem sido "péssima" para o país, pois os governantes "se endividam, fazem barbaridade, dão cambalhota" para se reeleger.

De repente, Bolsonaro desistiu de pegar em lanças por uma reforma política que acabe com a "barbaridade". Pior: apaixona-se pela irresponsabilidade fiscal. Aponta a "ejaculação precoce" de Doria enquanto engrena uma campanha antes de descer do palanque da disputa anterior.

Em condições normais, seria apenas constrangedor assistir a um presidente que acabou de se eleger com a promessa de ser o coveiro de velhos hábitos políticos comprometendo o seu governo com uma disputa pelo Poder que, além de prematura, pode ser paralisante. Quando isso ocorre nos primeiros meses de uma Presidência precária, o constrangimento evolui para a insanidade.

Se em 2022 Bolsonaro tiver realizações para expor na vitrine e boa aprovação popular, haverá gente na rua pedindo a sua permanência. Resta saber quando pretende parar de atirar contra o próprio pé. Político que não ambiciona o poder vira alvo. Mas político que só ambiciona o poder erra o alvo. Hoje, a única ambição que Bolsonaro deveria acalentar é ambição de trabalhar.

Irresponsabilidade

O dinheiro público, quando é torrado às custas do endividamento do Estado, não traz felicidade. Ao contrário, conduz ao inferno da irresponsabilidade fiscal crônica. Mas isso, curiosamente, está deixando de ser uma questão financeira que Jair Bolsonaro leve a sério. Ao sinalizar a intenção de furar o teto de gastos, o presidente, que admite não entender de economia, desautoriza Paulo Guedes, o ministro a quem ele dizia ter confiado uma "carta branca" para recolocar as finanças públicas nos trilhos.

Está entendido, uma vez mais, que a carta do Posto Ipiranga não é branca e que o compromisso de Bolsonaro com o ajuste fiscal vale só até certo ponto. O ponto de interrogação. O presidente reclama que as despesas obrigatórias estão subindo e o dinheiro que sobra para o governo gastar chegará a zero em três anos. É verdade. Há três maneiras de lidar com o problema: a desejável (cortar gastos), a impensável (aumentar impostos) ou a inacreditável (chutar o balde). Bolsonaro flerta com a terceira alternativa. Faz isso porque está mais preocupado com as urnas de 2022 do que com os cofres do Tesouro.

Em duas oportunidades, Paulo Guedes sinalizou que sua paciência tem limites. Em março, num debate no Senado sobre Previdência, o ministro disse que se o presidente e o Congresso não quisessem o serviço que ele se dispõe a entregar, ele demonstraria que não tem apego ao cargo. Em maio, Guedes declarou numa entrevista: se a reforma virar uma reforminha, "pego um avião e vou morar lá fora". O ministro está longe de entregar o serviço que prometeu. Parte desse serviço é convencer o presidente de que, sem prosperidade, não haverá a popularidade que conduz à reeleição.


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