25/04/2024 - Edição 540

Poder

O meio ambiente que eles prometem

Publicado em 03/09/2014 12:00 -

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Bandeira que deu a Marina Silva 20 milhões de votos nas últimas eleições presidenciais, o meio ambiente é tema certo na agenda de campanha este ano. Uso racional da água, combate ao desmatamento, mudanças climáticas e licenciamento ambiental são questões abordadas nos planos de governo dos três principais candidatos à Presidência da República, Marina (PSB), Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB).

Enquanto Dilma reafirma seu compromisso em continuar lutando contra o desmatamento na Amazônia, Marina promete zerar o desmatamento líquido, equilibrando a derrubada da floresta com a recuperação de áreas degradadas e replantio de matas nativas. Já Aécio promete adotar medidas para frear a sanha das motosserras não apenas na Amazônia, mas também no Cerrado. Esse bioma, que ocupa grande parte do Brasil Central, já perdeu quase metade de sua cobertura original, não é monitorado como a Amazônia e, na avaliação de especialistas, sofre uma taxa anual de desmatamento duas vezes maior do que a registrada no Norte do país.

O último registro do governo dá conta de que 5.843 km de floresta amazônica foram derrubados em um ano. No ano passado, houve um aumento de 28% e este ano a taxa deve cair. A Amazônia já perdeu 18% de suas florestas originais.

Licenciamento Ambiental

A necessidade de simplificação do licenciamento ambiental de empreendimentos de infraestrutura também é considerada chave pelos três postulantes, embora os caminhos para a modernização do processo não sejam detalhados.

Atualmente, o licenciamento de uma hidrelétrica na Amazônia leva, na melhor das hipóteses, um semestre inteiro para ser concluído. E só com essa autorização é que o projeto pode começar a sair do papel. Aécio propõe que o licenciamento seja feito com base no Zoneamento Econômico e Ecológico (ZEE), mapa que delimita as zonas ambientais e atribuição de usos e atividades compatíveis segundo as características de cada uma delas.

Dilma diz que pretende aprofundar a modernização do licenciamento fortalecendo a coordenação entre o governo federal, estados e municípios. Ela afirma que o processo já está em curso com a implementação da Lei Complementar 140, criticada por ambientalistas por supostamente enfraquecer o papel do Ibama. Marina, por sua vez, se compromete apenas em simplificar o licenciamento.

Água , aquecimento, Código Florestal e Carbono

Com relação à gestão da água, Marina diz ser preciso estimular o uso sustentável desse recurso renovável. Ela também fala em criar uma política de acesso a água potável e na proteção dos mananciais usados no abastecimento das cidades, bem como em retomar o programa de revitalização da Bacia do Rio São Francisco, cujas obras de transposição estão em pleno vapor.

Dilma promete tratar a segurança hídrica como prioridade. E Aécio se compromete com a universalização do acesso a água de qualidade para consumo humano e agricultura familiar. Hoje 85% da população está interligada na rede de abastecimento de água.

Tema sempre citado quando Dilma foi lançada candidata nas últimas eleições por conta da Conferência das partes da ONU sobre Mudanças Climáticas em Copenhague (COP-15), o aquecimento global e negociações internacionais para que governos cortem suas emissões de gases estufa voltará à tona em 2015, com a COP-21 em Paris. Lá os países terão de aprovar um regime global de corte de emissões a partir de 2020.

Os três candidatos propõe uma economia de baixo carbono, mas sem detalhar ações que levariam a esse cenário.

Sobre esse assunto, Marina diz que, se eleita, aprofundará os planos setoriais de mitigação e adaptação de mudanças climáticas que o atual governo criou. Dilma fala em manter os compromissos já assumidos de redução de emissões. Em 2009, o então presidente Lula estabeleceu a meta de reduzir entre 36% e 39% as emissões previstas para 2020. Além disso, Dilma promete acelerar a implementação dos planos setoriais e realizar “forte engajamento” do Brasil nas negociações internacionais junto à ONU. Aécio diz que criará um Mapa Brasileiro das Vulnerabilidades Sociais às Mudanças Climáticas e uma política pública de redução dos riscos de desastres. Ele também promete implementar mecanismos de reutilização do gás metano dos aterros sanitários. O metano é um dos mais nocivos à camada de ozônio.

Os três também falam em caminhar para uma economia de baixo carbono, mas sem detalhar ações que levariam a esse cenário. Além disso, Dilma pretende, por exemplo, implementar regras previstas no novo Código Florestal, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), mapa que todos os produtores estão obrigados a fazer de suas terras delimitando as áreas protegidas e as de produção. Aécio quer investir em fontes renováveis de energia, política de educação ambiental e pagamento por serviços ambientais prestados por quem preserva a floresta. Marina também promete diversificar as fontes renováveis de energia, como solar e eólica, e pagamento por serviços ambientais. E ainda sobre a necessidade de implantar os planos de manejo dos parques nacionais.

Inconsistente

Para especialistas, as propostas são genéricas. O pesquisador Paulo Barreto, da ONG Imazon, avalia que o programa do PSB é o mais avançado, seguido pelo do PSDB. Ele considera o programa de Dilma ruim.

“O programa de Marina é o mais avançado por apresentar algumas metas e especificar alguns dos instrumentos. Assume o compromisso de desmatamento líquido zero, embora não tenha especificado uma data. O programa do Aécio é o segundo mais avançado, incluindo a meta para acesso universal a água potável e também ampliar as energias renováveis e programas de eficiência energética. O programa da Dilma é opaco, pois muitos dos itens ambientais supostamente estariam no item Manutenção do compromisso com a redução de emissões”, diz Barreto, pontuando que Dilma não fez um bom governo na área ambiental.

O ambientalista Mario Mantovani, da SOS Mata Atlântica, concorda que as propostas são superficiais. “Faltam propostas concretas para implementação, como indicadores, prazos, metas, fontes de recurso. Os três abordam o licenciamento ambiental, mas não é possível saber se as propostas representarão avanços ou retrocessos”, argumenta ele.

A exemplo do que fizeram em 2010, ONGs ambientalistas preparam uma carta compromisso para entregar aos candidatos com pontos que a comunidade verde considera importantes. Na eleição passada, Marina, Serra e Dilma assinaram a carta, que previa o comprometimento de cada um em não aceitar que o novo código florestal, que à época estava tramitando no Congresso, implicasse em redução das áreas que obrigatoriamente os proprietários rurais têm que manter protegidas dentro de suas terras.

O Pior

O geógrafo Mario Mantovani trabalha há cerca de dez anos como uma espécie de "lobista da natureza" no Congresso Nacional. Diretor de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, ele tenta influenciar os projetos relacionados ao tema e coordena informalmente a chamada Frente Parlamentar Ambientalista, fórum com adesão de 187 dos atuais congressistas para debater assuntos da área em reuniões semanais.

Militante da causa desde 1973, conhecido como um dos mais ativos ambientalistas do país, Mantovani diz que a presidente Dilma Rousseff faz o "pior governo da história" para o meio ambiente.

Aécio Neves, por sua vez, tem umpé ficado na defesa do segmento do agronegócio. Recentemente afirmou ser preciso superar a "falsa contradição" apontada por ambientalistas com a "questão ambiental". Na avaliação do presidenciável tucano, "não existe nada mais antiambiental e nada mais antiecológico do que a pobreza e do que a miséria".

A cientista política Cristiana Losekann afirma que Marina Silva, apesar de sua agenda ambientalista, terá um grande desafio de sustentar suas posições: “Evocar as palavras não implica no comprometimento efetivo com seus sentidos. A presença de Marina Silva como uma concorrente de peso nessas eleições é importante por colocar em evidência este tema e por obrigar os outros candidatos a responder a essas questões. Mas, ela própria terá um grande desafio de sustentar suas posições e responder com maior clareza qual o seu projeto de política ambiental em um contexto de economia capitalista”.


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