18/04/2024 - Edição 540

Poder

Governo promete R$ 10 mi por semestre a parlamentar pró-reforma, dizem deputados

Publicado em 31/05/2019 12:00 -

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O governo Jair Bolsonaro fez uma nova proposta de direcionamento de verbas do Orçamento em troca de apoio à reforma da Previdência, afirmam deputados. 

Segundo membros de partidos do centrão a oferta agora é de R$ 10 milhões extras por semestre, para cada deputado fiel, totalizando um acréscimo de R$ 40 milhões até 2020 na verba que os congressistas podem manejar no Orçamento. 

Segundo deputados e líderes ouvidos em condição de anonimato, nesta semana o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) iniciou uma ronda com líderes partidários para tentar selar acordo. A promessa de liberação de todo o dinheiro até 2020 visa atrair mais deputados, tendo em vista que esse é o ano das eleições municipais.

O governo precisa de 308 dos 513 votos para a aprovação na Câmara da reforma da Previdência, prioridade legislativa de Bolsonaro em 2019.

O repasse será feito direto do ministério de escolha dos parlamentares para o município, e o parlamentar apadrinhará a obra.

Congressistas confirmaram que a alocação dos recursos virá de remanejamento interno da pasta, com a atrelação política ao voto do parlamentar: ou seja, deputados que não votarem pela Previdência não poderão beneficiar as obras de seus municípios.

O valor oferecido a líderes partidários que aportarem votos de seus deputados é de R$ 80 milhões, o dobro a ser apadrinhado por deputados das bancadas.

As negociações ainda não foram feitas com todos os partidos, mas o governo afirma ter intenção de tratar do assunto com todos aqueles que não fazem parte da oposição e poderiam vir a integrar uma eventual base. 

Segundo deputados, porém, o governo também tem conversado com parlamentares no "varejo", em alguns casos passando por cima de líderes das bancadas. E membros da articulação com o Congresso enviaram cobranças a partidos para que enviassem listas de como as bancadas haviam decidido alocar os recursos.

O documento entregue às bancadas faz referência a um projeto de "Plano de Políticas Públicas – Fase 1/2019". Os ministérios que poderão enviar recursos para os programas são as pastas da Agricultura, Desenvolvimento Regional, Saúde, Educação e Cidadania.

Dentro de cada ministério, o parlamentar poderá escolher o programa em que alocará as despesas. Na Educação, por exemplo, existem programas de compra de veículos para transporte escolar e reformas e adequação de infraestrutura de escolas. 

Já na pasta da Agricultura, poderão ser feitas compras de equipamento agrícola, conservação de estradas, e enviados recursos para programas de agricultura familiar, por exemplo. 

Em dezembro, Onyx havia dito a políticos de diversos partidos que que a partir deste ano o governo vincularia explicitamente o nome de deputados e senadores a obras federais tocadas com recursos obtidos por ele por meio de emendas parlamentares. As menções personalizadas incluiriam placas dispostas nos canteiros federais.

Os recursos não são vinculados às emendas parlamentares a que os deputados têm direito. Hoje, os congressistas podem direcionar para seus redutos eleitorais, anualmente, R$ 15,4 milhões das verbas federais, por ano.

Segundo governistas, os primeiros R$ 10 milhões serão empenhados –jargão orçamentário que significa que o recurso foi reservado para aquele fim– pelo governo ainda neste semestre, antes da votação da reforma, como forma de "boa fé" entre governo e deputados. 

Em abril Onyx havia oferecido R$ 10 milhões anuais em recursos extras, para cada parlamentar, em troca de apoio à Previdência. 

Uma das principais promessas de campanha de Bolsonaro foi acabar com o chamado "toma lá, da cá", que é a prática de negociar cargos e verbas federais, entre outras benesses da máquina pública, em troca de apoio no Congresso.

Apesar de ter montado a maior parte de seu ministério sem negociação com líderes partidários, o governo tem mantido a prática de direcionamento de verbas a aliados e da nomeação de apadrinhados de congressistas em cargos de segundo escalão, em troca de apoio legislativo.

Quando se revelou a intenção do governo de colocar nome dos parlamentares nas placas das obras, ainda no período de transição, a maioria dos especialistas disse que a medida afronta o princípio constitucional da impessoalidade na gestão pública.

No meu bolso não

Velhos adversários políticos no DEM, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e de Onyx Lorenzoni, deixaram as diferenças de lado em nome da reforma da Previdência. Os dois também têm algo em comum: nenhum deles abriu mão do PSSC (Plano de Seguridade Social dos Congressistas), a previdência especial que dá aos parlamentares a possibilidade de se aposentar com o salário integral, hoje de R$ 33,6 mil.

De acordo com um levantamento da ONG Ranking dos Políticos com dados fornecidos pela Lei de Acesso à Informação, a maioria dos deputados e senadores desta legislatura renunciou à aposentadoria especial, principalmente os parlamentares de primeiro mandato.

Dos 513 deputados da Câmara, 175 optaram pelo PSSC, 34% do total: 49 dos 275 novos parlamentares (18%) e 126 dos 238 reeleitos (53%). No Senado, seis dos oito reeleitos optaram pelo PSSC (75%); enquanto apenas 2 dos 9 senadores que chegaram pela primeira vez ao Congresso aderiram à aposentadoria especial (22%).

É o caso da senadora governista Soraya Thronicke (PSL-MS), segundo quem o PSSC é "superavitário". "É descontado mensalmente 11% sobre o valor total do meu salário. Além disso, é exigida uma idade mínima de 60 anos e 35 anos de tempo de contribuição, iguais para homens e mulheres, sem distinção."

Portanto, não há o que se falar em 'aposentadoria especial' para senadores. […] Se recebemos acima do teto, é porque contribuímos muito acima desse teto. E, não necessariamente, vamos nos aposentar recebendo o valor total do salário.
Senadora Soraya Thronicke (PSL-MS)

Soraya foi a única dos quatro senadores de seu partido a optar pelo benefício, que tem o MDB, legenda de maior bancada (com 13 no total), como o que mais optou pelo PSSC.

"A gente não fez uma comparação com a legislação passada, mas o que a gente percebeu foi um efeito manada em razão da reforma da Previdência", diz o diretor-executivo do Ranking dos Políticos, Renato Dias. "Muitos deles abriram mão do benefício e mandaram a informação para ganhar pontuação extra no ranking."

Maia e Onyx são dois dos 175 deputados que não renunciaram ao benefício, embora estejam na linha de frente na defesa pela reforma previdenciária. Onyx é o homem no governo destacado por Bolsonaro para articular a reforma com o Congresso. Em fevereiro, disse que a mudança "não retira direito de ninguém, ao contrário, há um olhar muito fraterno por conta do processo que está sendo construído".

Procurado, o ministro-chefe da Casa Civil não respondeu à reportagem. Maia, que é visto como adversário por boa parte do governo, disse em palestra em Nova York, em abril, que defende a reforma "por convicção pessoal". "A agenda prioritária do Brasil é reestruturar as despesas públicas, e a maior despesa é a Previdência." Procurado, Maia também não respondeu.

Para Dias, do Ranking, a adesão de Onyx e Maia ao benefício "surpreende". “Eles estão fazendo a articulação pela reforma. Eles deveriam dar o exemplo, cortando na própria carne. Quando eles não abrem mão, eles também dão um recado à sociedade. Hoje, a média de aposentadoria de um deputado é de R$ 19 mil”, afirma.

Com funciona o PSSC?

No Brasil, os parlamentares podem optar pelo Regime Geral da Previdência, feito para trabalhadores da iniciativa privada, ou pelo PSSC, que existe desde 1999. Com ele, ex-deputados e ex-senadores podem se aposentar aos 60 anos de idade e 35 de contribuição, cinco a menos do que propõe a reforma da Previdência. Para completar esse tempo, o parlamentar também pode somar à contribuição feita antes do mandato, em empregos no setor público e privado.

Para chegar ao valor exato, divide-se os anos de contribuição por 35. Com dois mandatos (oito anos), o deputado terá direito a 8/35 avos do salário, aproximadamente R$ 7.600, 31% acima do teto para quem contribuiu para o INSS (R$ 5.839,45). "Em média, o brasileiro se aposenta com R$ 1.548", diz o advogado Nazário Nicolau, presidente da Comissão de Direito Previdenciário dos Servidores Públicos da OAB-MG e diretor do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário).

Quando o deputado ou senador aposentado volta a exercer qualquer mandato federal, estadual ou municipal, ele não pode acumular aposentadorias, então o benefício é suspenso. É o caso dos senadores Alvaro Dias (Podemos-PR) e Aécio Neves (PSDB-MG).

"O senador Alvaro Dias abre mão da aposentadoria de ex-governador a que tem direito. Em 28 anos, deixou de receber R$ 10 milhões", explicou sua assessoria de imprensa. "Na campanha presidencial, ele defendeu esse tipo de conta individualizada capitalizada para toda a população."

Em nota, Aécio lembra que "contribui com o plano de previdência parlamentar desde 1987, portanto, há mais de 30 anos". "Como ex-governador de Minas, ele abriu mão da aposentadoria, benefício à época concedido aos ex-chefes do Executivo."

Procurados, os deputados Ivan Valente (PSOL-SP) e Arlindo Chinaglia (PT-SP), que também aderiram ao PSSC, não responderam à reportagem.

O Plano de Seguridade dos Congressistas substituiu o sistema anterior de aposentadoria parlamentar, o IPC (Instituto de Previdência dos Congressistas), extinto em 1997. Naquele regime, era possível se aposentar com 26% do salário após oito anos de contribuição e 50 anos de idade.

"Tecnicamente, o parlamentar deveria estar vinculado ao INSS", defende o advogado do IBDP.

O especialista explica que a Constituição admite apenas três formas de previdência: o Regime Geral, Regime Próprio dos Servidores e a Previdência Militar. Além delas, qualquer um pode optar pela aposentadoria complementar, a previdência privada. "Tanto é verdade que o parlamentar que não opta pelo PSSC está automaticamente vinculado ao Regime Geral", diz Nicolau.

Essa é a opinião da própria OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Para a instituição, o exercício de um mandato temporário não pode ser confundido com o exercício de cargo público. "O mandato é um instrumento transitório de representação, não sendo admissível a profissionalização da função de parlamentar", diz a entidade.

Para ter direito ao benefício, deputados e senadores contribuem mensalmente com 11% do salário mensal, enquanto o Tesouro Nacional arca com outros 11%. "No final das contas é a sociedade quem complementa o recolhimento aos parlamentares", diz o advogado. "Mesmo que exista o superávit, a questão é a perspectiva futura. Ocorre que o fundo é recente; existe desde 1999."


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