Poder
Publicado em 19/04/2019 12:00 -
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A desarticulação política do governo no Congresso põe em risco pontos-chave da reforma administrativa proposta pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), como a transferência do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para o Ministério da Justiça e a migração da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Mulher, da Família e Direitos Humanos.
A avaliação é repetida por líderes do chamado centrão, cujo apoio é crucial para a aprovação da medida provisória 870. No total, o texto recebeu 539 emendas, algumas delas do próprio PSL, partido de Bolsonaro.
A reestruturação proposta pelo governo enxuga de 29 para 22 o número de pastas e cargos com status ministerial. Dois dos pontos mais polêmicos são o fim do Ministério do Trabalho, cujas atribuições foram distribuídas em três pastas (Economia, Justiça e Cidadania), e a transferência da Cultura para o Ministério da Cidadania.
Com a prioridade voltada às negociações para aprovar a reforma da Previdência, a MP foi relegada a segundo plano na Câmara. Só no último dia 10 foi instalada a comissão mista que vai analisar pontos da proposta e colocar medidas em audiência pública.
O prazo para evitar que a MP caduque termina em 3 de junho. Em condições normais, não estaria apertado. No entanto, o clima entre Executivo e Legislativo não anda dos melhores: no último dia 15, o governo sofreu uma derrota na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), que decidiu inverter a pauta e votar a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) do Orçamento impositivo antes da reforma da Previdência.
Agora, líderes de partidos do centrão veem pouco tempo hábil para evitar que a MP perca validade.
“Está apertado, tem um mês e meio para passar na comissão e nas duas Casas, e não é fácil. Vamos ver”, afirma Arthur Lira (PP-AL).
Augusto Coutinho, líder do Solidariedade, avalia que o governo deixou atrasar muito a votação da medida. “É perigoso. O governo vai ter que se mobilizar bem para conseguir votar essa matéria”, diz.
“A verdade é que a MP estava meio esquecida, ninguém falou nada e o governo foi esquecendo. O governo me parece que não está cumprindo o dever de casa, e vai passar por dificuldade. Acho que vai ser um desafio. Vai ser uma coisa embaraçosa para o governo se não conseguir votar essa matéria", afirma Coutinho.
José Nelto (GO), líder do Podemos na Câmara, diz que o governo não está articulando com o Congresso. “Começou agora, timidamente. Tem que realmente articular, conversar e mostrar que essa reforma administrativa que ele está propondo é a melhor para o país."
Se a medida não passar, volta a composição de ministérios do governo de Michel Temer (MDB), incluindo a restauração do Ministério do Trabalho e o da Cultura. A criação e extinção de ministérios precisam ser autorizadas por lei.
O enxugamento de ministérios é um dos pontos contestados por lideranças independentes. Para o deputado Wellington Roberto (PR-PB), o governo deveria manter a proposta de reduzir o número para 15, como defendido por Bolsonaro durante a campanha eleitoral.
“Acho que a gente deveria voltar à situação inicial de que ele defendia 15 ministérios. A gente pode reduzir, já que estamos com contenção de gastos”, afirma.
Nelto, do Podemos, também defende essa tese. “Eu só acho que o governo, na campanha, fez o compromisso com 15 ministérios. Tem sete a mais. O governo tem que sentir que discurso de campanha é diferente de administração”, critica.
Entre os parlamentares, é praticamente consenso que um dos pontos mais críticos é a manutenção do Coaf sob o guarda-chuva do ministro Sergio Moro.
“Tem que voltar o Coaf para o Ministério da Fazenda. Eu estou vendo que não está dando certo com o Ministério da Justiça. A Funai também, na Agricultura, não está dando certo. Você tem que mexer em pontos para ajustar os ministérios”, defende Nelto. “Não adianta colocar uma área que é incompatível no ministério, acaba provocando ruídos, uma guerra entre os próprios ministros.”
Já Wellington Roberto, do PR, diz que a ideia do Congresso é respeitar a independência do Coaf. “Até porque achamos que é poder demais concentrado num só ministro. Não é que ele não tenha competência de tocar, é questão de concentrar nas mãos de uma pessoa só.”
Também está em debate desfazer mudanças adotadas por Bolsonaro relacionadas à Funai.
O presidente transferiu para o Ministério da Agricultura a demarcação de terras indígenas.
Essa atribuição era da Funai, e líderes da Câmara querem tirar essa função que hoje está com a ministra Tereza Cristina (Agricultura) e devolvê-la para a Funai, que voltaria a ser vinculada ao Ministério da Justiça.
Enquanto essas medidas encontram apoio no centrão, outras acabam tendo na oposição as únicas vozes de respaldo. A extinção do Ministério do Trabalho é um exemplo. Emendas de deputados do PDT, PT e PSOL, por exemplo, pedem a recriação da pasta.
“Eu acredito que a MP vai passar, mesmo o governo totalmente desarticulado, o Rodrigo [Maia, presidente da Câmara], o Congresso Nacional vai dar um jeito de passar algumas questões. Mas outras vamos brigar para que não passe, como o Ministério do Trabalho, que é nossa principal pauta”, afirma André Figueiredo, líder do PDT na Câmara.
Entenda a reforma administrativa
Principais pontos
– Corta de 29 para 16 o número de ministérios; cria quatro pastas com status ministerial —Casa Civil, Secretaria de Governo, Secretaria-Geral, GSI— e dois cargos com status de ministro: advogado-Geral da União e presidente do Banco Central
– Extingue o Ministério do Trabalho e distribui atribuições entre Economia, Justiça e Cidadania
– Economia herda atribuições dos antigos Ministérios da Fazenda, Planejamento e Indústria, Comércio Exterior e Serviços
– Cultura perde o status de ministério e vai para baixo do Ministério da Cidadania
– Transfere para o Ministério da Agricultura a demarcação de terras indígenas e quilombolas, antes sob Funai e Incra
– Serviço Florestal Brasileiro, que fazia parte do Ministério do Meio Ambiente, vai para a gestão do Ministério da Agricultura
O que deve passar, mas com dificuldade
Extinção do Ministério do Trabalho
Migração da Cultura para o Ministério da Cidadania
O que corre risco de cair
Funai – A MP transferiu a Fundação Nacional do Índio para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Os deputados querem que o órgão volte para o Ministério da Justiça
Coaf – Parlamentares defendem que saia do guarda-chuva do Ministério da Justiça e volte para o Ministério da Economia. A transferência para a Justiça é vista como uma concentração de poderes em um só ministro —no caso, Sergio Moro
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