19/04/2024 - Edição 540

Brasil

Redução de danos em debate

Publicado em 18/04/2019 12:00 -

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E a Política Nacional sobre Drogas do governo Bolsonaro continua repercutindo. Para o Conselho Federal de Psicologia, o decreto que instituiu a nova PNAD põe fim à estratégia conhecida como “redução de danos”, que prevê que nem todas as pessoas têm condições de parar o uso de drogas abruptamente, pelo menos não nos estágios iniciais do tratamento.

No lugar, coloca como único caminho terapêutico a abstinência. Hélio Schwartsman compara na Folha: “Há políticas públicas que são ‘one size fits all’ (de tamanho único) e outras que não são. (…) Se o sujeito é um dependente pesado e tem inclinações religiosas, o internamento numa comunidade terapêutica com vistas a alcançar a abstinência tende a ser uma boa pedida. Se, porém, a cessação total do hábito já se demonstrou uma meta irrealizável para aquele paciente ou se ele rejeita a espiritualidade das comunidades terapêuticas —grande parte delas é ligada a igrejas—, pode-se adotar uma abordagem menos ambiciosa, que procure reduzir o número de episódios de uso e diminuir os impactos negativos para a saúde. (…) Os serviços de saúde precisam oferecer alternativas para todos os perfis de usuário. Priorizar um tratamento é antirrepublicano, pois acaba excluindo parte dos pacientes.”

A pesquisadora Dayana Rosa falou sobre o contexto do tema não só por aqui, mas internacionalmente. É que no fim de março, aconteceu uma sessão especial da ONU para tratar do tema das drogas. Apesar de, mais uma vez, o documento final falar sobre a meta de “promover ativamente uma sociedade livre do abuso de drogas”, internamente, a discussão sofisticou-se. E revela, inclusive, paradoxos. O Brasil, por exemplo, patrocinou junto com dez países uma resolução que promove a prevenção da transmissão do HIV em mulheres que usam drogas, através da Profilaxia Pós-Exposição, a PEP. O texto foi considerado um avanço. Ao mesmo tempo, no âmbito doméstico, veio a nova PNAD. Mas, ela lembra, essa guinada é resultado de uma articulação que só recentemente ganhou musculatura no governo federal, tendo começado a dar as caras com a nomeação de Valencius Wurch ainda na gestão de Marcelo Castro (os riscos aí eram mais ligados ao retorno da hospitalização como eixo do cuidado aos transtornos mentais) e, depois, com a chegada de Quirino Cordeiro Jr., nome ligado à Associação Brasileira de Psiquiatria.

Para Dayana, além das contradições na nova PNAD (o texto, por exemplo, prevê a necessidade de realização de pesquisas, num momento em que tornou-se público que uma das maiores pesquisas científicas sobre uso de drogas no país ficou engavetada desde 2016 porque a conclusão é que o país não vive uma “epidemia” de uso de drogas), a estratégia de redução de danos é resiliente.

“A RD nunca precisou de lei para se fazer acontecer e não será agora. O acontecimento redução de danos não se restringe à troca de seringas e distribuição de camisinha, foi e segue sendo um fenômeno de novas possibilidades de percepções do mundo, novas possibilidades de mundo, ou ‘apenas’ novas possibilidades. O crack, que chegaria para bagunçar as estratégias da RD, potencializou ainda mais esse mecanismo, moldou políticas e empurrou o debate para frente.”


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