19/03/2024 - Edição 540

Especial

O incrível homem que derreteu

Publicado em 09/04/2019 12:00 -

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Envolto em contínua crise política e sem assistir a uma melhora na economia, Jair Bolsonaro (PSL) registra a pior avaliação após três meses de governo entre os presidentes eleitos para um primeiro mandato desde a redemocratização de 1985. Mas 59%, segundo o Datafolha, ainda acreditam que ele fará uma gestão ótima ou boa. O presidente completou cem dias de mandato na última quarta-feira (10).

Segundo o instituto, 30% dos brasileiros consideram o governo de Bolsonaro ruim ou péssimo, índice semelhante ao daqueles que consideram ótimo ou bom (32%) ou regular (33%). Não souberam opinar 4% dos entrevistados.

O instituto ouviu 2.086 pessoas com mais de 16 anos em 130 municípios nos dias 2 e 3 de abril. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Antecessores de Bolsonaro nas mesmas condições tiveram melhor desempenho. Fernando Collor (então no PRN) era reprovado por 19% em 1990, enquanto Fernando Henrique Cardoso (PSDB) marcava 16% de índices ruim ou péssimo em 1995. Os petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, alvos frequentes de críticas do atual presidente, eram mal avaliados apenas por 10% e 7% da população ao fim dos primeiros três meses de governo. Na série histórica, Dilma é quem teve numericamente a melhor avaliação a esta altura do mandato, com 47% de ótimo/bom em 2011.

Não se comparam aqui os primeiros trimestres de presidentes reeleitos, pois suas imagens já passaram pela exposição de todo um governo além dos três meses: Lula se mantinha com uma rejeição confortável (14%), FHC amargava 36% e Dilma já começava a viver o inferno político que a derrubaria do cargo em 2016, com 60% de ruim e péssimo.

Os vices que assumiram desde a redemocratização também não são comparáveis —a aferição de Michel Temer (MDB) não foi feita, enquanto Itamar Franco tinha 11% de ruim/péssimo nesse intervalo.

Antes da posse, 65% esperavam que Bolsonaro fizesse um governo ótimo ou bom, 17%, regular, e 12%, ruim ou péssimo. Os índices já eram os piores entre os presidentes eleitos para primeiro mandato desde a redemocratização. Agora, a expectativa é positiva para 59%, mediana para 16% e negativa para 23%.

Nesses primeiros meses, Bolsonaro viveu diversos episódios de desgaste político: a investigação sobre milícias envolvendo o gabinete de seu filho Flávio na Assembleia do Rio, as candidaturas de laranjas de seu partido, os entrechoques entre militares e a ala do governo sob influência do escritor Olavo de Carvalho, a crise no MEC, a troca de farpas com o Congresso e a dificuldade no encaminhamento da reforma da Previdência.A economia segue em ritmo lento, e a taxa de desemprego subiu em relação ao trimestre passado —está em 12,4%.

Assim, para 61% dos ouvidos, Bolsonaro fez menos do que se esperava no exercício do cargo. Já 13% consideram que ele fez mais, enquanto 22% avaliam que ele fez o que era esperado. Entre os descontentes, a predominam pessoas mais pobres e menos escolarizadas.

Nessa comparação, ele também perde para os primeiros mandatos de Lula e de Dilma, que tiveram o mesmo tipo de mensuração pelo Datafolha. Em 2003, o petista fez menos do que poderia para 45%, e em 2011 a ex-presidente pontuou 39% no quesito.

A aprovação de Bolsonaro é maior entre os homens (38%) do que entre as mulheres (28%).

O comportamento do presidente, que se envolveu em polêmicas como a divulgação de um vídeo pornográfico para criticar o que seriam abusos nas ruas durante o Carnaval, é avaliado como correto por 27% dos ouvidos.

Já outros 27% acham que Bolsonaro na maioria das vezes se posiciona de forma adequada, mas às vezes não. No lado negativo, 20% pensam que na maioria das vezes o presidente é inadequado, e 23% dizem que ele nunca se comporta como o cargo exige.

Há sinais de alerta para o bolsonarismo em dois grupos que apoiaram consistentemente o então candidato durante a campanha de 2018.

Os que ganham mais de 10 salários mínimos e os que têm curso superior registram numericamente também a maior rejeição ao governo até aqui: 37% e 35%, respectivamente, avaliam a gestão como ruim ou péssima.

Esses grupos também registram a maior aprovação, 41% (empatada tecnicamente com os 43% dos que ganham de 5 a 10 salários mínimos) e 36% de ótimo/bom (empatada tecnicamente com os 33% de quem tem ensino médio), indicando assim uma polarização entre o eleitor mais elitizado.

Os mais pobres (até 2 salários mínimos) são os menos contentes, com 26% de ótimo e bom.

Já o eleitorado evangélico (34% da população) segue mais entusiasmado com o presidente, que é católico, mas foi batizado por um pastor e é fortemente associado ao setor. Acham o governo até aqui ótimo ou bom 42% desse segmento, índice que cai a 27% entre católicos (50% dos brasileiros).

Brancos são os que mais aprovam Bolsonaro (39%), enquanto pretos e pardos são os que mais desaprovam (29% para cada um dois grupos).

Ainda não há uma reversão na divisão geográfica do apoio ao presidente. O Sul, sua principal fortaleza em 2018, deu a maior aprovação a ele neste levantamento: 39% (empatado com os 38% do Centro-Oeste/Norte), contra 22% de desaprovação.

O Nordeste é a região que mais rejeita o governo, com 39% de ruim/péssimo e 24% de ótimo/bom. Também lá existe a menor expectativa positiva: 50%.

Aprovação a Bolsonaro alcança 62% entre seus seguidores em rede social

A avaliação do governo apresenta forte oscilação entre as pessoas que seguem o presidente em redes sociais e as que utilizam esses serviços mas não o seguem.

Quando foram pesquisados apenas os entrevistados que seguem o presidente em redes sociais (Twitter, Facebook e Instagram), a aprovação (ótimo/bom) dele salta para 62%. Entre os usuários das redes que não acompanham os perfis de Bolsonaro, a taxa de ótimo/bom é de 23%.

Os usuários de redes sociais, incluindo também o WhatsApp, somam 71% dos entrevistados e os que seguem Bolsonaro são 16% do total, de acordo com o instituto.

Desde a época da campanha, Bolsonaro aposta na estratégia de se comunicar diretamente com seus apoiadores e simpatizantes por meio das redes —gerenciadas por seu filho e vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ).

O presidente também costuma exaltar o papel das redes na comunicação política ao mesmo tempo em que critica notícias a seu respeito veiculadas na mídia profissional.

Em março, Bolsonaro passou a fazer uma transmissão semanal ao vivo no Facebook, em que se pronuncia com ministros e trata de assuntos diversos, de lombadas eletrônicas à importação de bananas.

O elevado apoio entre seus seguidores, no entanto, sugere um diálogo com quem já tem tendência a apoiá-lo, o que pode se tornar arriscado como tentativa de angariar ou manter popularidade.

Bolsonaro tem 10,8 milhões de seguidores no Facebook, 3,95 milhões no Twitter e 11,3 milhões no Instagram, números que ele ampliou desde a vitória na eleição de 2018.

Para o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, as manifestações nas redes socais ajudam a dar satisfação a um público com escolaridade mais alta que pode se tornar crítico se entender que o novo governo não mostra serviço. “De fato, ele tem falado para convertidos nas redes sociais”, afirma Paulino.

A aprovação de Bolsonaro entre usuários de redes no geral tende a ser parecida com a da população como um todo, ainda de acordo com a pesquisa. A taxa de ótimo/bom vai de 32% entre todos os entrevistados para 34% entre usuários desses serviços, que incluem os do WhatsApp —variação dentro da margem de erro.

O levantamento mostrou que uma faixa da população com tendência a apoiar mais o presidente utiliza pouco esses meios: os idosos com mais de 60 anos. Esse grupo representa 19% do total pesquisado, mas soma apenas 9% dos usuários das redes e aplicativos.

Sem comentários

O presidente afirmou que não vai "perder tempo para comentar pesquisa do Datafolha". Bolsonaro, que acredita em um complô dos principais institutos de pesquisa contra ele, ficou especialmente mordido com uma questão que apontou que 58% dos entrevistados consideram-no muito inteligente, enquanto 39% acham ele pouco inteligente. Pois, no mesmo período de governo, Lula marcou 69% e 24% e Dilma 85% e 9%, respectivamente. Naquela época, seus governos contavam com boa aprovação.

O presidente adora repetir João, capítulo 8, versículo 32 ("Conhecerei a Verdade e a verdade vos libertará"), mas talvez não reflita muito sobre as várias possibilidades dessa passagem bíblica. Não deveria desprezar informação, mesmo aquela que o desagrade. E deveria também ler Eclesiastes, capítulo 1, versículo 2 ("Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade"). Para trabalhar com essa insegurança toda.

Bolsonaro tem o direito de não comentar. Mais do que isso: seria muito bom para a sua administração, a maioria do país e a saúde de seus assessores se ele se furtasse de fazer comentários que não contribuem para a solução dos problemas nacionais. Temos certeza que, em muitas ocasiões, seu silêncio faria a bolsa subir, o dólar cair e as cerejeiras desabrocharem fora da estação.

O IBGE aponta para 13,1 milhões de desempregados. Ao invés de dizer que isso foi uma herança de administrações passadas (sim, ele não é o culpado por esse número) e apontar propostas para aquecer a economia e gerar emprego, resolve reclamar da metodologia do cálculo de desemprego do IBGE.

O país ostenta quase 64 mil mortes violentas por ano. Ao invés de dialogar com a população mais afetada por isso, ou seja, os mais pobres, construindo políticas para o enfrentamento da criminalidade, resolve mandar celebrar o golpe militar, negando a existência da ditadura, que matou, torturou, estuprou e criou modelos de repressão estatal que estão vigentes até hoje nas periferias das grandes cidades e no Brasil profundo.

O Ministério da Educação foi paralisado por ele ter nomeado um profissional não-qualificado para o comando da pasta após sugestão de um polemista de extrema-direita que acredita que o problema educacional é mais para uma fictícia mamadeira de piroca do que para o aumento nos investimentos. Ao invés de ter substituído rapidamente o ministro e os pupilos do polemista, preferiu brigar com os livros de História dizendo que o nazismo era de esquerda e criticar cartilhas distribuídas para adolescentes cuidarem da saúde de seus corpos porque havia ilustrações de órgãos sexuais.

Bolsonaro não quer "perder tempo" comentando a pesquisa que mostra uma queda consistente em sua aprovação, mas "perde tempo" comentando golden shower no Carnaval e distribuindo fake news sobre jornalistas, como a que atingiu uma repórter do jornal O Estado de S.Paulo. Questão de prioridade, presumo.

Enquanto não perceber que é ele o principal problema do governo e agir como presidente de toda a República e não apenas do Twitter, a reta de aprovação continuará descendente. Pois é isso o que acontece quando se culpa o termômetro pela febre e os outros pela própria insuficiência.

O Congresso Nacional e o poder econômico estão de olho. Se a aprovação cair demais, permanecendo apenas o bolsonarismo-raiz mais alguns grupos religiosos ao seu lado, ele terá que ceder poder à força se quiser continuar no cargo, tornando-se um boneco de ventríloquo – para usar uma expressão de seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro. Lembrando que presidentes não são cassados por crimes de responsabilidade, mas porque perderam o chão político.

Refém de Moro

Enquanto isso, o desempenho do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, alcança 59% de ótimo e bom no mesmo Datafolha, sendo a figura mais bem avaliada do governo.

Pode-se dizer que isso se deve a Moro carregar o capital acumulado durante a atuação como o principal juiz federal da operação Lava Jato, considerando que o pacote legislativo que propôs contra o crime organizado e a corrupção tem sido alvo de críticas por aumentar a letalidade policial, seguindo em marcha lenta no Congresso. Mas vale lembrar que Bolsonaro, tendo sido eleito com 55% dos votos válidos, ostentava 49% de ótimo e bom em janeiro, passando para 39% em fevereiro e 34% em março, segundo o Ibope. Mesmo considerando que sua função é naturalmente mais desgastante que a de seu subordinado, é uma derrocada que impressiona.

O que acontece quando um ministro, que já era mais popular que o presidente, torna-se ainda maior que ele por conta da queda de aprovação do eleito? Ele continuará servindo feliz e sorridente como pilar de sustentação ao governo e fiador de suas lambanças ao mesmo tempo que toca as pautas de seu interesse? O incômodo gerado mutuamente será resolvido com uma indicação ao Supremo Tribunal Federal em 2021? Se o ministro aprender a fazer política, isso pode significar, lá na frente, o fim da relação ou um apoio forçado para as eleições presidenciais de 2022? Ou o presidente se torna refém do ministro?

Jair Bolsonaro convidou três pessoas para servirem de fiadores de seu governo. Além de Sérgio Moro, colocou Paulo Guedes, à frente do ministério que reúne economia, planejamento, orçamento, indústria, comércio, desenvolvimento e trabalho. E entregou o Gabinete de Segurança Institucional ao general da reserva Augusto Heleno Pereira, que organiza a ala militar. Seja pelo nome, seja pela função que exercem, não saem a menos que queiram.

Com o convite a Moro, Bolsonaro queria, além de reforçar apoio no naco da sociedade do centro à direita, criar um anteparo para que denúncias de corrupção envolvendo seu governo não colassem tão facilmente. Ou seja, usá-lo para "lavagem de marca". Desde então, consegui até que Moro flexibilizasse a opinião sobre a gravidade do crime de "caixa 2", indo contra o que havia dito antes, ao aceitar o perdão do outrora deputado federal e agora ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, diante de "sincero" arrependimento.

Mas Bolsonaro tem feito questão de mostrar que a "carta branca" que prometeu a Moro funciona se ele seguir sua cartilha, não tendo o ex-juiz a liberdade nem para indicar uma suplente de conselho sem a anuência do chefe e de sua militância nas redes sociais, como foi o caso de Ilona Szabó. Nada que gere ruído passa sem o amém do Planalto.

Depois do arranca-rabo público com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, mostrou que ainda engatinha para entender como funciona a política. Mas a sua entrada no Twitter – com a já antológica publicação em que postou uma foto com uma folhinha de calendário  para provar a data – mostra que está disposto a aprender. Para quê? Essa é a grande pergunta a ser respondida em 2021, 2022 ou 2026.

Trincheiras cavadas ajudariam a proteger o governo de ataques, pensou a equipe de Bolsonaro. O problema é que se muros altos cercados de fossos inexpugnáveis criam uma fortaleza também constroem uma prisão. Tudo depende do ponto de vista. Bolsonaro escolheu um nome que não pode demitir, o que faz dele comandante e prisioneiro.

Moro controla a Polícia Federal e o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Tem acesso a investigações em curso. Como, por exemplo, aquelas que teriam identificado corrupção na apuração da execução da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes. Ou aquelas que analisam as relações de poder da milícia no Rio de Janeiro. Ou ainda as que mapeiam os laranjais usados por políticos do PSL, entre eles o ministro do Turismo, Márcelo Álvaro Antônio.

Até agora, Bolsonaro é refém de sua própria incapacidade gerencial (que coloca pessoas desqualificadas em cargos importantes por sugestão de astrólogos, cria briga de rua com o então ministro Gustavo Bebianno nas redes sociais e é incapaz de entender o que é o presidencialismo de coalizão), mas também dos esqueletos que sua família abriga no armário (das denúncias contra o senador Flávio Bolsonaro ao apoio dado a milícias) e de sua crença que foi ungido para a missão de levar o país de volta ao passado. Ou seja, refém de si mesmo.

A depender do que aconteça daqui para frente, pode se tornar também refém de quem o observa do prédio vizinho, o Ministério da Justiça.

Bolsonaro cumpriu até agora só 1/3 de metas para 100 dias

Bolsonaro não conseguirá cumprir todos os objetivos que elencou para os cem primeiros dias de mandato. Em documento, divulgado no final de janeiro, a Casa Civil ressaltou que, em uma realização inédita, a gestão atual se comprometia a alcançar “metas objetivas” dentro do prazo estipulado.

Na lista de medidas que não serão finalizadas até esta semana há iniciativas como, por exemplo, a independência do Banco Central, a reestruturação da EBC (Empresa Brasil de Comunicação) e a redução de tarifas do Mercosul.

Ao todo, o Palácio do Planalto estabeleceu 35 objetivos para os cem dias. Segundo levantamento, 20% do total não têm previsão de ser alcançado. No restante, 34% já foram realizados e anunciados e 46% estão em fase de implementação.

Parte das metas não cumpridas até aqui ainda podem ser efetivadas, pois bastam medidas burocráticas, como assinaturas de decretos. Estão nesse rol de ações que ainda têm chances de migrar do papel para a realidade, por exemplo, a mudança na capa do passaporte brasileiro ou a campanha de prevenção ao suicídio. São medidas já formatadas que uma mera assinatura tornará realidade.

Já outras têm menos chances de serem efetivadas a tempo, como a criação do programa Alfabetização Acima de Tudo, do Ministério da Educação, engolfado em uma crise interna que pode levar à queda do ministro Ricardo Vélez Rodríguez, e o aumento da cobertura vacinal, que depende de ações coordenadas com estados e municípios.

Sem previsão de ser estabelecida, a proposta de independência formal do BC (Banco Central) está paralisada na Câmara dos Deputados. Com a eleição do presidente, houve sinalização por parte do Executivo e do Legislativo de que a iniciativa teria avanço, mas segue travada.

Atualmente, há uma espécie de acordo implícito de que o BC toma ações de política monetária com autonomia, com o compromisso do governo de não interferir nas decisões, mas a diretriz não é oficial.

Alvo de críticas de Bolsonaro desde a campanha eleitoral do ano passado, a EBC entrou nas metas do governo com uma proposta de racionalização da estrutura da estatal.

De acordo com o governo, o projeto de reestruturação da EBC foi iniciado, com a revisão de contratos e a nomeação de um novo presidente, mas a medida só deve ser implementada de fato no segundo semestre, conforme estimativa feita pelo ministro da Secretaria de Governo, Santos Cruz.

Outra meta proposta, a redução da tarifa do Mercosul ainda está em negociação com Paraguai, Uruguai e Argentina. Internamente, o Palácio do Itamaraty acredita que o objetivo deve ser alcançado até o final do ano, mas ainda sem uma data definida.

Prometido também para o período, o estabelecimento de critérios para o exercício de cargo de dirigente de bancos federais ainda está em discussão no Ministério da Economia e na Casa Civil. Em estágio semelhante está a racionalização de estruturas e processos ministeriais, iniciativa que passa por estudo para avaliar seu alcance.

O intercâmbio de informações entre instituições de ensino superior e escolas públicas para o ensino de ciências, iniciativa também elencada na relação de metas, ainda está com os editais de convocação na “fase de preparação”, segundo o Ministério de Ciência e Tecnologia.

Os ministérios da Economia e da Justiça foram os que conseguiram cumprir mais metas até o momento. Antes mesmo de completar os cem dias, eles concluíram e anunciaram sete objetivos, entre eles o pacote anticrime, o decreto de flexibilização do porte de armas, a medida provisória das fraudes do INSS, o corte de funções comissionadas e o decreto que endurece regras para realização de concursos.

Apesar de ser considerada a prioridade do governo neste primeiro semestre, a reforma previdenciária não foi incluída na relação de metas. A expectativa da equipe econômica é de aprová-la no Congresso Nacional até julho, mas a previsão é considerada de difícil cumprimento.

O aproveitamento das metas em 100 dias

20% não têm previsão de ser alcançado

34% já foram realizados e anunciados

46% estão em fase de implementação, podendo ou não ser cumpridos até quarta (10)

Metas para os 100 dias de governo Bolsonaro

Não cumprirá

Integrar universidades e escolas públicas para ensino de ciências

Reduzir tarifas do Mercosul

Reestruturar a Empresa Brasileira de Comunicação

Racionalizar estruturas e processos ministeriais

Independência do Banco Central

Critérios para dirigentes de bancos federais

Treinar servidores para evitar corrupção

Cumprido

Criar “Tinder do Emprego”

Atendimento eletrônico de devedores

Ampliar prazo para programa de agricultura familiar

Combater fraudes nos benefícios do INSS

Extinção de 21 mil cargos e funções comissionadas

Condicionar concursos a medidas de eficiência

Fazer privatizações no setor de transportes

Editar decreto de facilitação da posse de armas

Enviar pacote anticrime ao Congresso

Recompor efetivo da Operação Lava Jato

Lançar Plano Nacional para Combate ao Lixo no Mar

Criar regras para ocupação de cargos de confiança

Em implementação

Criar 13º do Bolsa Família

Modernizar Bolsa Atleta

Implantar Centro de Tecnologias de Dessalinização

Lançar Plano Nacional de Segurança Hídrica

Criar programa Alfabetização Acima de Tudo

Medida sobre conversão de multas do Ibama

Lançar campanha de prevenção ao suicídio e à automutilação

Regulamentar Lei Brasileira de Inclusão

Regulamentar educação domiciliar

Mudar capa do passaporte brasileiro

Aumentar a cobertura vacinal

Instituir a Política Nacional de Gestão Turística

Viabilizar o leilão do excedente da cessão onerosa

Intensificar inserção econômica internacional

Apresentar agenda para promover ética nas escolas

Criação do Comitê de Combate à Corrupção

Dez curiosidades do Datafolha sobre a avaliação de Bolsonaro

MULHERES SÃO MAIS CRÍTICAS AO PRESIDENTE

O levantamento aponta divergências de opinião entre homens e mulheres em diversos questionamentos sobre o desempenho de Jair Bolsonaro em seus primeiros meses no cargo.

A diferença na avaliação é dez pontos percentuais entre entrevistados que consideram o governo ótimo ou bom: cai de 38% entre os homens para 28% entre as mulheres.

A nota média dada aos primeiros meses de governo, por exemplo, é de 5,7 entre homens e 5,1 entre mulheres.

Entrevistadas do sexo feminino também tendem a considerá-lo menos trabalhador, mais autoritário e mais despreparado.

Na campanha eleitoral de 2018, pesquisas de opinião já apontavam uma resistência maior do eleitorado feminino à candidatura do então presidenciável do PSL.

CARACTERÍSTICAS PESSOAIS

Em uma sequência de 11 itens, o Datafolha fez perguntas específicas sobre características pessoais e sobre o modo de atuação de Bolsonaro.

Algumas respostas mostram forte visão crítica sobre o presidente. Consideram que o presidente "trabalha pouco" 50% dos entrevistados, ante 42% que acham que ele trabalha muito. Para 57%, ele é autoritário, e 49% o classificam como antiquado.

Entre itens positivos, 58% disseram que o presidente é "muito inteligente" e 52% o consideram como preparado.

DESALENTO ENTRE DESEMPREGADOS

O recorte da pesquisa de acordo com a ocupação dos entrevistados indica diferenças entre grupos da população.

Os índices de avaliação ótimo/bom de Bolsonaro passam de 22% entre desempregados que procuram emprego para 36% entre assalariados registrados.

A taxa é ainda mais alta entre quem se declarou empresário: 57% consideram o novo governo ótimo ou bom.

APOIO MAIOR ENTRE IDOSOS

O recorte etário sugere diferenças expressivas entre entrevistados ouvidos pelo Datafolha. Entre idosos com 60 anos ou mais, consideram o novo presidente da República muito inteligente 63% dos entrevistados, ante 55% dos jovens de 16 a 24 anos.

Essa tendência crítica entre os mais jovens também ocorre em questionamentos sobre autoritarismo, sinceridade e humildade do mandatário.

RACHA NA ELITE

A pesquisa Datafolha mostra uma polarização em faixas de entrevistados com alto poder aquisitivo e elevada escolaridade.

É entre entrevistados com curso superior que Jair Bolsonaro consegue aprovação mais alta —36% de ótimo ou bom—, mas também é onde a crítica é mais alta —35% de "ruim/péssimo".

Ao ouvir entrevistados com renda familiar mensal de mais de dez salários mínimos, a taxa de avaliação "regular" do presidente encolhe: é de 20%. Nesse estrato, 41% consideram o governo ótimo/bom e 37% acham ruim/péssimo.

BASE NO INTERIOR

Quando os dados da pesquisa são filtrados de acordo com a natureza do município (se são de regiões metropolitanas ou no interior dos estados), também é possível notar diferenças de avaliação do governo.
Bolsonaro tende a ter mais apoio em municípios do interior. 

A nota média dada ao governo, por exemplo, cai de 5,6 no interior para 5,1 em regiões metropolitanas.
Tendência parecida há quando se observa o porte do município. Entre aqueles com até 50 mil habitantes, a nota do governo é 5,7. Nos que possuem mais de 500 mil, cai para 4,9.

APOIO CONVICTO

Os números do Datafolha mostram tendência de pouca fuga do apoio entre os eleitores mais convictos do capitão reformado no ano passado.

Quem declarou que seu partido de preferência é o PSL deu nota média de 8,3 à gestão do atual presidente.
Entre os entrevistados que declararam voto em Bolsonaro em 2018, 96% consideram que daqui para frente ele fará um governo ótimo ou bom.

Os otimistas também são 27% entre os eleitores do petista Fernando Haddad.

VOTO DECLARADO NO ANO PASSADO

O Datafolha perguntou em quem os entrevistados votaram na eleição de 2018. Os que declararam voto em Jair Bolsonaro são 52% homens e 48% mulheres. Os eleitores de Fernando Haddad (PT) são 59% mulheres e 41% homens.

No caso de votos branco, nulo ou nenhum candidato, 60% são mulheres e 40% são homens.

NORDESTE CRÍTICO

Na região em que teve seu pior desempenho na eleição de 2018, Bolsonaro também tem problemas de avaliação.

Disseram que em nenhuma situação ele se comporta como um presidente deveria se comportar 28% dos entrevistados no Nordeste, ante 20% no Sul e Centro-Oeste/Norte.

Entre os nordestinos, 61% consideram que ele trabalha pouco, ante 42% no Sul. Quando questionados se o presidente fez até agora menos do que se esperava, 68% concordaram com a afirmação no Nordeste, ante 54% no Sul.

VICE POUCO CONHECIDO

Mesmo entre eleitores de Jair Bolsonaro a taxa de conhecimento do vice-presidente, Hamilton Mourão, não é elevada. 

Entre entrevistados que declararam voto no atual presidente, só 43% responderam corretamente o nome do vice.

O índice geral é de 37%. Entre entrevistados com escolaridade fundamental, a proporção desce para 19%.

Para a direita não, para baixo

É falsa a impressão de que Jair Bolsonaro leva o governo para a direita. Puxa-o para baixo. Sem oposição, Jair desperdiçou os primeiros cem dias criando problemas para Bolsonaro. A fatura da inépcia começa a ser cobrada.

Na campanha eleitoral, Bolsonaro não tinha um programa de governo nítido. Ele dispunha de um bordão —"Brasil acima de tudo, Deus acima de todos"— e de um versículo do Evangelho de João —"Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará." Descobre agora que, embora Deus esteja em toda parte, o demônio controla o Planalto quando não há uma diretriz. Percebe que a verdade à luz do gabinete presidencial não é a mesma ao sol das filas onde se desesperam 13 milhões de desempregados.

Para prevalecer nas urnas, bastou a Bolsonaro surfar na onda do antipetismo e enrolar-se na bandeira antissistêmica. Instalado no Planalto, enviou duas reformas ao Congresso —previdenciária e anticrime— e disse que sua parte estava cumprida. Aliviado, passou a distribuir caneladas em potenciais aliados. Entre eles o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, dono da pauta de votações. Com 28 anos de experiência parlamentar, Bolsonaro não havia notado que o pior tipo de ilusão que pode acometer um presidente é a ilusão de que preside.

A ideia de que o Planalto manda e o Congresso obedece custou o mandato de Dilma Rousseff. O custo da impopularidade de Bolsonaro não será apenas político, mas financeiro. Diante do declínio da credibilidade do presidente junto ao eleitorado, o preço do reconhecimento da legitimidade de sua Presidência no Legislativo vai subir. Mantida a curva descendente do índice de popularidade, a cotação do apoio ficará pela hora da morte. A negociação não se dará no atacado, mas no varejo, projeto a projeto.

Há muitas providências óbvias que Bolsonaro precisaria adotar para fechar o dreno que sorve o seu prestígio. Por exemplo: fechar a usina de polêmicas, regulamentar os hábitos da filhocracia, tomar distância dos rolos que assediam o primogênito Flávio, desligar Olavo de Carvalho da tomada, trocar o elenco da ala circense da Esplanada (MEC, Itamaraty e Direitos Humanos), higienizar certos ministérios (o Turismo é um bom começo) e fazer política a sério. Mas isso não é o suficiente.

Quando Bolsonaro conseguir parar de conspirar contra si mesmo, terá de dedicar-se a atividades menos estéreis do que falar mal dos outros e elogiar a ditadura militar. Quem sabe encontre tempo para tarefas menores como, digamos, trabalhar. Do contrário, é melhor "jair se acostumando" com os índices de popularidade duros de roer. O capitão foi eleito para resolver problemas, não para se tornar um problema.

A legitimidade de um governante, quando desacompanhada da credibilidade que vem com os resultados, é como o amor do Soneto de Fidelidade, de Vinicius de Moraes: não é imortal, posto que é chama. É infinita enquanto dura. Mantida a marcha atual, as ruas logo ordenarão: "Pra baixo, volver!"

O homem que derreteu

A queda na popularidade de Jair Bolsonaro era esperada. O fenômeno é universal, atingindo democraticamente todas as gestões. O que talvez tenha surpreendido é a intensidade com que a avaliação do presidente se desmilinguiu.

Há dois fatores que ajudam a entender o derretimento. O primeiro é que o governo é mesmo um caos. Despreparo e foco nas coisas erradas resumem bem esses três meses iniciais. O segundo é que há um descasamento entre as ideias defendidas pelo presidente e as preferências do eleitorado. Isso já ficara claro na pesquisa Datafolha de janeiro, que mostrou que a maioria das bandeiras do dirigente —coisas como Escola sem Partido, política ambiental, indígena, facilitação do porte de armas— era rejeitada pelos eleitores, por margens às vezes graúdas.

Basicamente, as pessoas votaram em Bolsonaro não pela pauta que ele propôs, mas por ele ter sido o candidato que melhor encarnou o papel de antípoda do PT e do próprio sistema político, percebido como corrupto pela população.

Bolsonaro não vai mudar. É da natureza do neopopulista insistir na retórica inflamada, apostando em criar inimigos, mesmo que imaginários, para agregar aliados. O problema é que essa tática antissistema se torna meio autofágica quando se é governo, isto é, quando se está no centro mesmo do sistema.

Talvez o presidente consiga, aos trancos e barrancos, atravessar os quatro anos de mandato, se não houver uma piora notável da economia. Mas, se vier uma deterioração, em especial se a inflação de alimentos voltar a subir, o jogo muda, e a impopularidade pode tornar-se letal.


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