26/04/2024 - Edição 540

Poder

Se governo continuar como está acaba em seis meses, diz Olavo de Carvalho

Publicado em 22/03/2019 12:00 -

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Diante de uma plateia de cerca de cem fãs e representantes da direita americana, no Trump International Hotel, o guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho, afirmou que até hoje não sabe quais são as ideias políticas do presidente Jair Bolsonaro, mas que o apoia por ele ser "um homem honesto e não ser ladrão". 

O escritor voltou a atacar a imprensa, dizendo que "todos os jornalistas são viciados em drogas" e que a mídia é culpada pela imagem de Bolsonaro de fascista e violento. Ele foi homenageado por Steve Bannon, ex-estrategista do presidente Donald Trump, com uma exibição do documentário sobre sua vida, "Jardim das Aflições".

"Mesmo se o Bolsonaro fosse dono de um bordel ele seria menos perigoso que o [candidato petista] Fernando Haddad, por isso o povo votou nele, não por causa de suas ideias políticas, que até hoje não sei quais são; ele fala de um assunto ou outro, mas nunca vi uma concepção geral, uma ideologia", disse.

"Eu não sei quais são as ideias políticas dele [Bolsonaro]. Conversei com ele quatro vezes na vida, porra", afirmou a jornalistas. Na saída, Olavo mostrou-se pessimista com o futuro do Brasil e disse que, se o governo continuar como está por mais seis meses, acabou."

"O presidente está de mãos amarradas. Não sou capaz de prever [até onde vai], mas, se tudo continuar como está, já está mal. Não precisa mudar nada para ficar mal, é só continuar isso mais seis meses e acabou", afirmou.​​

Olavo foi apresentado por Bannon à plateia como peça importante para o que ele chama de "O Movimento", grupo de governos populistas de direita em ascensão em países como Brasil, EUA, Hungria e Itália. "Olavo não é importante apenas para o Brasil, ele tem uma importância no contexto mundial do movimento populista de direita, é um pensador seminal", disse.

Bannon disse que conhecia Olavo por seus vídeos e por uma discussão fascinante que o escritor teve com Aleksandr Dugin, estrategista do presidente russo, Vladimir Putin. "Mas só fiz a peregrinação até a casa do Olavo, na qual conheci a impressionante biblioteca dele, há pouco tempo, e ele mora na minha cidade, Richmond!"

O deputado Eduardo Bolsonaro, líder do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, também não economizou nos elogios ao guru, "uma das pessoas mais importantes da história do Brasil". "Olavo de Carvalho é uma inspiração, e sem ele Jair Bolsonaro não existiria", disse Eduardo, que assistiu concentrado ao filme de cerca de 1h20 de duração.

Os principais alvos do escritor, na sessão de perguntas após a exibição e na conversa com jornalistas, foram a mídia e o vice-presidente, Mourão. 

"Se o Bolsonaro fosse um homem assim violento, fascista, por que ele seria tão amado pelo povo? Essa foi uma imagem criada pelos jornalistas. E é a imagem passada pela imprensa internacional", afirmou. "A mídia é louca, todos os jornalistas são viciados em drogas."

Eduardo Bolsonaro também alfinetou a imprensa. "Olhem o Twitter da Folha, tem poucos seguidores, existem umas pessoas que ninguém conhece que têm muito mais seguidores, porque eles sempre falam a verdade. O poder está com a gente. As pessoas não acreditam na imprensa. Quando as pessoas me param na rua para tirar fotos, elas não acham que eu sou racista, nazista, homofóbico e xenófobo."

Até o último dia 17 o perfil da Folha no Twitter tinha 6,568 milhões de seguidores. O do presidente Jair Bolsonaro tinha pouco mais de 3,755 milhões e o de Olavo de Carvalho, 129.421 seguidores.

O escritor afirmou que o presidente está cercado de traidores e declarou que despreza o vice-presidente, general Hamilton Mourão. Segundo Olavo, Mourão "é estúpido" e tem uma "vaidade monstruosa".

"O Bolsonaro vai viajar, ele assume temporariamente, e a primeira coisa que faz é ir para São Paulo ter uma conversa política com Doria. Esse cara não tem ideia do que é ser vice, só sabe sobre sua vaidade monstruosa. Você acha que ele pediu permissão do presidente para ir a São Paulo? Eu não o crítico, eu o desprezo."

Para Olavo, Mourão se elegeu com falsidades. "Assim que foi empossado, ele mudou 180 graus: foi para o outro lado em aborto, desarmamento, não quer derrubar o [ditador venezuelano Nicolás] Maduro. "Ele também acusou o vice de ter mentalidade golpista. 

"O Mourão disse isso: 'Nós voltamos ao poder por vias democráticas'. Como 'voltamos'? Quem está no poder é o Bolsonaro, não vocês. Agora eles acham que estão no poder. E isso o que é? Golpe. É uma mentalidade golpista. Essa concepção, que é a do Mourão, é uma concepção golpista. Não sei se o golpe vai acontecer, já aconteceu, não estou em Brasília, não sei. Estou com o cu na mão pelo Brasil, não por mim. Eu estou velho, posso morrer, não ligo, porra".

Ele avalia ainda que os principais auxiliares do presidente —da ala militar do governo—​ são má influência e têm atuado para prejudicar Bolsonaro desde o início do mandato. 

"Ele [Bolsonaro] deveria parar de ouvir maus conselhos. Ele é um homem sozinho, não pode confiar naqueles que os cercam, na mídia, ele tem que confiar no povo."

A exibição foi organizada pelo financista Gerald Brant, um dos primeiros apoiadores de Bolsonaro em Wall Street e fã de Olavo. Entre os convidados, estavam Sebastian Gorka, que foi vice-assistente de Trump, e Thomas Shannon, que foi embaixador no Brasil e terceiro no Departamento de Estado.

Apesar de ter indicado dois ministros, Ricardo Vélez (Educação) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores) —e estar em constante disputa com a ala militar ligada a Bolsonaro—​, Olavo nega que tenha qualquer tipo de influência no governo. Segundo ele, isso é "pequeno, vil e miserável" diante de suas ambições.

"Eu quero mudar o destino da cultura do Brasil, décadas ou séculos à frente. Esse é meu sonho, o governo que se foda, eu estou cagando para o governo. Eu sou Olavo de Carvalho, não preciso do governo, minha filha. Eu sou um escritor, falo direto com meu público, não preciso de um cargo do governo."

Olavo disse ser mentira que tenha interferido nas demissões e nomeações no Ministério da Educação. "Só falei com (Velez) duas vezes: uma vez para parabenizá-lo, quando foi nomeado, e a segunda para mandar tomar no cu", disse. "Eu sugeri o nome dele para a Educação, e encheram o ministério de picaretas." 

Famoso pelo temperamento forte, ele bateu boca com um jornalista do Financial Times durante coquetel após exibição do filme. Indagado sobre o significado da visita de Bolsonaro aos EUA, Olavo disse que a ajuda americana é importante para que o Brasil não seja vendido pela China, e que os americanos vão comprar mais produtos brasileiros.

Confrontado com a informação de que o Brasil e os EUA têm uma pauta de exportação semelhante, e seriam concorrentes, Olavo afirmou: "Os dois produzem a metade dos alimentos produzidos no mundo. Eles podem fazer uma aliança para vender comida para todos", disse.

Questionado se isso não constituiria um cartel, explodiu. "Eu não chamei de cartel. Você está pondo palavras na minha boca, você está distorcendo, você é maldoso, você é um mentiroso, você é um mentiroso", gritou e saiu. "Não quero mais falar com você, você é mentiroso." Na saída, perguntado por jornalistas se estava otimista sobre o governo, afirmou que não, porque a mídia inteira, nas suas palavras, quer matar Bolsonaro, e o presidente não tem direito de defesa.

"Isso é um golpe de Estado, vocês não estão entendendo? A classe jornalística, todos vocês", afirmou diante dos repórteres.

Ainda de acordo com o escritor, Bolsonaro não tem reagido ao que ele chama de "fake news" por cautela dos militares que estão no governo.

"Ele não reage [às notícias falsas contra ele] porque aquele bando de milico que os cerca é um bando de cagão que têm medo da mídia."

Análise

Olavo de Carvalho afirmou que o presidente "deveria parar de ouvir maus conselhos". Olavo tem razão.

Bolsonaro ouve muitos maus conselhos. Contudo, os que causam mais danos ao seu governo não são os oriundos da ala militar da cúpula federal, que Olavo considera má influência para o presidente, mas aqueles postados nas redes sociais pelo próprio escritor ou transmitidos por seus pupilos – alguns dos quais pertencentes ao núcleo do poder.

A indicação do nome dos ministros das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e da Educação, Ricardo Vélez Rodrígues, que têm criado constrangimentos para o governo federal com discursos e ações carregados de pirotecnia ideológica (como os que criam riscos à venda de soja para a China e os que pedem a gravação de crianças sem consentimento dos pais nas escolas), mas com pouco resultado prático, são dois exemplos.

Após mais de dois meses sem nenhum projeto de vulto na Educação, Vélez foi convencido a reduzir as insanidades ideológicas para fazer o ministério andar. Isso passou pela demissão de ex-alunos de Olavo de Carvalho – que partiu para o ataque. A reação do escritor também provocou baixas, incluindo o secretário executivo, com a benção de Bolsonaro. Como consequência de ter ganho a antipatia do antigo padrinho, Vélez perdeu a pouca autonomia que tinha e seu próprio emprego subiu no telhado. Essa foi a polêmica mais recente em que se envolveu, mas não será a última.

Enquanto isso, generais da reserva na cúpula do governo agem discretamente para reduzir o impacto das repercussões negativas causadas pelas declarações de Bolsonaro guiadas exatamente por más influências, além de corrigir e evitar não apenas as barbeiragens presidenciais (como a declaração de que a democracia era um concessão das Forças Armadas ao país), como também riscos que podem ser causados por alguns auxiliares de posições radicais. Como o próprio chanceler, cria de Olavo, na questão venezuelana.

O vice-presidente, Hamilton Mourão (detestado pelo escritor), e os ministros-chefes do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, e da Secretaria de Governo, Carlos Alberto Santos Cruz, entre outros, têm desempenhado esse papel e sido criticados por isso.

O governo herdou 64 mil mortes violentas por ano e 12,7 milhões de desempregados, mas ainda não apresentou nenhum projeto para garantir segurança pública e gerar empregos formais que esteja à altura desse desafio. Além disso, tem uma polêmica Reforma da Previdência para discutir com o Congresso Nacional, mas principalmente, com a população – que é a razão do sistema de aposentadorias e de seguridade social. Também tem uma Reforma Tributária pela frente, para reduzir as desigualdades e injustiças fiscais e facilitar a vida das empresas, entre outros tantos projetos de interesse dos brasileiros – tanto os que votaram nele quanto os que não.

Um presidente deve ouvir conselhos de todas as partes, mas – ao final – agir pensando no bem comum e não em sua popularidade nas redes sociais. Bolsonaro escolheu visitar Donald Trump para agradar sua base ideológica, mas precisa tomar cuidado. Porque alegrá-la não vai resolver os problemas do país, mas apenas retardar o seu desgaste se o país continuar girando em falso, em uma guerra contra Moinhos de Vento comunistas.


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