19/04/2024 - Edição 540

Poder

Imprensa é alvo de Bolsonaro no Twitter a cada 3 dias

Publicado em 15/03/2019 12:00 -

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Em pouco mais de dois meses de governo, o presidente Jair Bolsonaro usou sua conta no Twitter para publicar ou compartilhar mensagens nas quais critica, questiona ou ironiza o trabalho da imprensa brasileira. Foram 29 publicações desde a posse até o último dia 11, uma média de uma vez a cada quase três dias na rede social que o presidente tem utilizado como principal meio de comunicação com a população.

Quase metade das críticas e acusações contra a imprensa que aparecem na conta de Bolsonaro é feita por meio de retuíte de aliados e familiares, como dos filhos Carlos e Eduardo e as páginas que costumam reunir simpatizantes do presidente.

Foi o caso do site Terça Livre, que no último dia 10, publicou texto que falsamente atribui à repórter do jornal O Estado de SP Constança Rezende a declaração “a intenção é arruinar Flávio Bolsonaro e o governo”, ao tratar da cobertura jornalística das movimentações suspeitas de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador e filho mais velho do presidente. 

Na noite de domingo, o próprio Bolsonaro escreveu no Twitter: “Constança Rezende, do ‘O Estado de SP’ diz querer arruinar a vida de Flávio Bolsonaro e buscar o Impeachment do Presidente Jair Bolsonaro. Ela é filha de Chico Otavio, profissional do ‘O Globo’. Querem derrubar o Governo, com chantagens, desinformações e vazamentos”.

A gravação do diálogo, porém, mostra que Constança em nenhum momento fala em “intenção” de arruinar o governo ou o presidente. A conversa, em inglês, tem frases truncadas e com pausas. Só trechos selecionados foram divulgados.

O texto publicado no Terça Livre tem como origem uma postagem no site francês Mediapart, que confirmou que as informações que serviram de base para o tuíte de Jair Bolsonaro “são falsas”. O texto original é assinado por Jawad Rhalib, que se apresenta como “autor, cineasta, documentarista e jornalista profissional”. A publicação no site brasileiro é assinada por Fernanda Salles Andrade, que ocupa cargo no gabinete do deputado estadual Bruno Engler (PSL), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Entidades

O caso envolvendo a repórter ganhou repercussão internacional e enfática reação de entidades que representam empresas de comunicação, jornalistas profissionais e a liberdade de expressão.

A Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) emitiram nota conjunta em que lamentam o ataque do presidente imprensa e à repórter Constança Rezende.

As entidades afirmaram que os ataques à repórter têm o objetivo de desqualificar o trabalho jornalístico. “Abert, Aner e ANJ assinalam que a tentativa de produzir na imprensa a imagem de inimiga ignora o papel do jornalismo independente de acompanhar e fiscalizar os atos das autoridades públicas”, diz a nota.

Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o episódio mostra por parte do presidente o “descompromisso com a veracidade dos fatos” e se caracteriza como “o uso de sua posição de poder para tentar intimidar veículos de mídia e jornalistas”.

Presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga afirmou que o ataque é um atentado à liberdade de imprensa. “O presidente e seus seguidores tentam intimidar os profissionais jornalistas por meio de agressões verbais e ameaças”, declarou.

Integrantes do governo Bolsonaro não quiseram comentar o caso.

Ataques de Bolsonaro reforçam polêmicas em redes sociais e frustram auxiliares

O presidente frustrou o núcleo militar próximo dele ao criar mais uma polêmica. Na avaliação de auxiliares do presidente, ele gerou uma agenda negativa em semana considerada crucial para o início da tramitação da reforma previdenciária na Câmara.

Após a repercussão negativa de vídeo compartilhado por ele com imagens obscenas no carnaval, Bolsonaro chegou a sinalizar a assessores que evitaria temas sensíveis em suas mídias digitais. O aceno, contudo, não durou nem uma semana.

O tom belicoso frustrou tanto o núcleo militar, que defende a adoção de uma postura moderada do presidente, como a equipe econômica, que tenta criar uma agenda positiva para favorecer a proposta de mudança das aposentarias.

A crítica é compartilhada por deputados federais de partidos identificados com o novo governo. Em caráter reservado, avaliam que o momento era do presidente evitar desgastes desnecessários e adotar um foco único de defesa da reforma previdenciária.

O ex-presidenciável João Amoêdo (Novo), que votou em Bolsonaro no segundo turno, foi um dos que expuseram a crítica: "O tweet do presidente Bolsonaro sobre a jornalista do Estadão tenta deixar de lado o que importa: o esclarecimento dele e do senador Flávio sobre o caso Queiroz".

Nas palavras de auxiliares presidenciais, Bolsonaro não deveria "gastar seu capital político com assuntos menores". Eles reconhecem, porém, que o temperamento dele é irrefreável e que, apesar de já ter sido recomendado posição menos agressiva, dificilmente mudará enquanto tiver o filho Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) como espécie de consultor.

Em entrevista a jornalistas, o porta-voz, Otávio Rêgo Barros, afirmou desconhecer quem tem as senhas de Bolsonaro, mas disse apenas que ele é responsável pelo conteúdo que é publicado em suas contas pessoais.

Em janeiro, foi publicado um decreto que atribuía à assessoria especial da Presidência da República a responsabilidade pela administração das redes particulares do presidente. Esse trecho, no entanto, foi revogado do texto em novo decreto, publicado fevereiro. O governo não esclareceu quem hoje faz o trabalho de alimentar as redes pessoais de Bolsonaro.

No último dia 11 foi publicada no Diário Oficial da União a nomeação do coronel Didio Pereira de Campos para o cargo de diretor do Departamento de Publicidade da Secretaria de Publicidade e Promoção da Secretaria de Comunicação Social.

O plano é que ele comande uma nova estrutura chamada Comunicação Global, responsável pelo monitoramento das redes sociais, publicidade oficial e criação de conteúdo da Presidência da República.

O militar é ex-chefe da assessoria de imprensa do Exército e foi indicado pela equipe do ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Santos Cruz. Ele chega após diagnóstico da equipe do presidente de que a comunicação oficial precisava ser melhorada.

Com a sua chegada, a gestão das mídias digitais, que estava subordinada à secretaria de imprensa, deve passar a ser controlada pela nova estrutura, assim como a área de publicidade, que estava sem um gestor específico desde o início do governo.

O coronel é descrito como um militar de perfil moderado e técnico. Apesar de sua entrada na equipe de comunicação, a estrutura geral continuará a ser chefiada por Floriano Amorim, indicado ao posto por Carlos Bolsonaro.

Após a divulgação da informação pelo jornal Folha de SP, Bolsonaro chamou a reportagem de "fake news". Mais tarde, em uma nova mensagem, disse que ela induz "o leitor a associar meu perfil pessoal à notícia". A reportagem dizia que o coronel deve coordenar o monitoramento das redes oficiais da Presidência, não a conta dele.


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