27/04/2024 - Edição 540

Poder

Toffoli abre inquérito para apurar fake news e ameaças contra ministros do STF

Publicado em 15/03/2019 12:00 -

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O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, anunciou a abertura de um inquérito para investigar a existência de fake news, ameaças e denunciações caluniosas, difamantes e injuriantes que atingem a honra e a segurança dos membros da corte e de seus familiares.

No início da sessão plenária de quinta-feira (14), Toffoli afirmou que o inquérito apurará as infrações “em toda a sua dimensão”. A investigação tramitará em sigilo e ficará sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes, que poderá requerer à presidência da corte a estrutura necessária para o trabalho.

“Tenho dito sempre que não existe estado democrático de direito, democracia, sem um Judiciário independente e sem uma imprensa livre. Este Supremo Tribunal Federal sempre atuou na defesa das liberdades, e em especial a liberdade de imprensa, em vários de seus julgados”, disse Toffoli antes de anunciar a apuração.

O escopo do inquérito, aberto de ofício por Toffoli, é bem amplo. Entre possíveis alvos da apuração estão procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba que teriam, no entendimento de alguns ministros, incentivado a população a ficar contra decisões do Supremo, como Deltan Dallagnol e Diogo Castor. 

A divulgação de informações falsas contra a honra de ministros há meses vem preocupando o tribunal.

No final do ano, o Supremo reformulou seu esquema de segurança, com a compra de armas não letais (armas de choque e spray de pimenta) que até então não eram utilizadas. Também foram comprados 14 carros blindados para os magistrados.

O ato de instaurar um inquérito sem ser provocado por um outro órgão é incomum no Judiciário, mas, segundo o tribunal, existem precedentes. No ano passado, a Segunda Turma do STF abriu, também de ofício, um inquérito para apurar o uso de algemas na transferência do ex-governador Sergio Cabral (MDB-RJ) do Rio para o Paraná.

Na quinta-feira (14), a coluna Painel mostrou que, liderados por bolsonaristas, grupos de WhatsApp que tinham sido desativados após a campanha voltaram a operar. A retomada coincidiu com o apelo da cúpula do Congresso para que o presidente religasse, em nome da reforma da Previdência, a rede de contatos que o ajudou a chegar ao Planalto.

Além de textos de defesa da medida, as comunidades elegeram um alvo comum: o Supremo. Montagens pedem o “fim do STF”, apontam “a toga contra o povo” e chamam os ministros de criminosos. Além do tom de protesto, mensagens que circulam nesses grupos disseminam informações falsas sobre a função, o funcionamento e os membros do STF.

Uma das postagens chega a afirmar que a corte tem “clientes como o BNDES”, e que “OAB e Judiciário estão aparelhados com essa máfia comunista e o narcotráfico de toda a América Latina”. “O STF só pode ser derrubado com uma ação efetiva e massiva do povo. O governo não pode os tirar de lá (sic)”.

Reações

A notícia da abertura da investigação pelo ministro Toffoli causou reações imediatas —contrárias e favoráveis à medida. 

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) divulgou nota em apoio à decisão do ministro e afirmou que solicitará à Polícia Federal que investigue se ataques contra advogados brasileiros foram feitos pelas mesmas pessoas que investem contra o STF.

"A apuração dos fatos é fundamental para o esclarecimento dos ataques e para a possível punição dos responsáveis por essas verdadeiras milícias digitais, que minam os pilares de nossa sociedade", diz a nota. 

Já o procurador da República Bruno Calabrich escreveu em sua conta no Twitter que o ato do STF é preocupante. "Preocupante a notícia de instauração de inquérito pelo STF por críticas ao tribunal. De muitas, duas questões: (a) foro por prerrogativa de função é definido pelo agente, não pela vítima; (b) investigação pelo Judiciário é inconstitucional (violação ao princípio acusatório)", disse.

Na quarta, a relação entre os ministros da corte e procuradores se mostrou tensa. Toffoli disse na sessão que enviaria à Corregedoria do Ministério Público Federal uma representação contra o procurador Castor, da Lava Jato, que escreveu em um artigo para o site O Antagonista que os ministros preparavam um "novo golpe" contra a operação.

Esse golpe seria a determinação de enviar investigações de corrupção e lavagem de dinheiro, quando relacionadas a caixa dois, à Justiça Eleitoral, e não à comum, como queriam os procuradores –o julgamento foi encerrado nesta quinta no Supremo, com placar desfavorável ao pleito da Lava Jato. 
Para o professor de direito constitucional da FGV-SP Roberto Dias o Supremo não tem competência para abrir um inquérito. 

"A meu ver o Supremo não deveria fazer a própria investigação. Deveria na verdade requisitar que os órgãos encarregados de investigação, como a Polícia Federal e a própria Procuradoria-Geral da República, pudessem fazer", diz.

Segundo ele, o pedido de investigação para investigar crimes de ameaça, calúnia ou difamação é legítimo. 

Outro especialista em direito, que não quis ser identificado por já ter trabalhado com um dos ministros do STF, chamou de inusual o fato de a investigação não ter um escopo definido.

Assim como Dias, ele afirmou ser compreensível que o Judiciário se sinta institucionalmente atacado em vista de movimentos como a CPI chamada de Lava Toga. Porém o caminho mais natural teria sido requerer à PGR a instauração de uma investigação, cujo relator seria distribuído aleatoriamente.

Irritação

Toffoli anunciou que vai entrar com uma representação no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e na corregedoria do Ministério Público Federal (MPF) contra o procurador da República Diogo Castor, da força-tarefa da Operação Lava Jato.

Toffoli se irritou, durante o julgamento sobre a competência da Justiça eleitoral para conduzir inquéritos de investigados na Operação Lava Jato, ao tomar conhecimento, por meio do advogado Ricardo Pieri Nunes, das críticas feitas pelo procurador em artigo publicado no site O Antagonista.

No texto, o procurador questiona a capacidade da Justiça eleitoral para julgar casos relacionados a corrupção e diz que os tribunais são compostos por indicados políticos. Ainda no artigo, Castor diz que o STF ensaia um “novo golpe à Lava Jato”. De acordo com o procurador, a Justiça eleitoral "historicamente, não condena ou manda ninguém para prisão".

O presidente do Supremo disse que a corte eleitoral não pode sofrer ataques de integrantes da força-tarefa da Lava Jato. "Farei e anuncio uma representação ao Conselho Nacional do Ministério Público e a corregedoria do Ministério Público Federal em razão dos ataques desse procurador à Justiça Eleitoral. Não é admissível esse tipo de ilação. Críticas no debate jurídico, críticas a respeito do posicionamento técnico-jurídico, da linha jurídica, isso é necessário, faz parte da dialética. Agora, a calúnia, a difamação, a injúria não serão admitidos", disse Toffoli.

De acordo com procuradores da força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF), o julgamento poderá ter efeito nas investigações e nos processos que estão em andamento nos desdobramentos da operação, que ocorrem em São Paulo e no Rio de Janeiro, além do Paraná. A punição prevista para crimes eleitorais é mais branda em relação aos crimes comuns.

Para a Lava Jato, um eventual resultado negativo para o MPF poderá "acabar com as investigações”. Segundo o procurador Deltan Dallagnol, o julgamento afetará o futuro dos processos da operação.
No entanto, ministros do STF consideram que os argumentos dos procuradores são extremados. Para o ministro Marco Aurélio, a decisão não terá grande impacto na investigação. "Não esvazia em nada a Lava Jato, é argumento extremado, que não cabe."


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