26/04/2024 - Edição 540

Poder

Senado decide desengavetar projeto que proíbe o aborto e matéria volta à CCJ

Publicado em 15/02/2019 12:00 -

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

O Plenário do Senado Federal aprovou no último dia 12, por maioria de votos, desengavetar um projeto que proíbe o aborto em qualquer situação, o que torna mais rígida a legislação brasileira atual. Agora a matéria, que havia sido arquivada, volta à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e deve ser discutida pelo colegiado nas próximas semanas.

O texto desarquivado é uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), de autoria do ex-senador Magno Malta (PR-ES), que foi apresentada em 2015 e garante "a inviolabilidade da vida desde a concepção". Por conta disso, senadores do PT tentaram barrar seu desarquivamento e chegaram a propor que a matéria fosse retirada de pauta, mas acabaram vencidos.

Atualmente, a interrupção da gravidez só pode ser feita pelo Sistema Único de Saúde, nas 20 primeiras semanas de gravidez, quando a mulher é vítima de violência sexual, se há risco de vida para a mãe ou o se o feto é anencéfalo. Defensores da medida dizem que a PEC não afeta estes casos, apenas veda novas exceções, como a que será discutida no STF.  

Responsável pela coleta das assinaturas para desengavetar a proposta, o senador Eduardo Girão (Pode-CE) negou que seu objetivo seja dificultar ainda mais a possibilidade de mulheres realizarem abortos. Ele e outros senadores que apoiaram a medida justificaram que a ideia é que o Senado defina os termos da lei, sem a "interferência" do Supremo Tribunal Federal. O senador disse que apresentará uma emenda à proposta garantindo as atuais exceções previstas para o aborto legal.

A iniciativa tem como objetivo se antecipar a um outro julgamento no Supremo, previsto para maio, em que os ministros analisarão ação que tenta abrir mais uma condição para aborto legal no País, incluindo a possibilidade para grávidas infectadas com zika.

Em 2012, Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que grávidas de fetos sem cérebro poderiam optar por interromper a gestação com assistência médica. Na época, por 8 votos a 2, os ministros definiram que o aborto em caso de anencefalia não é crime. 

Voz das mulheres

Sete a cada 10 brasileiras acreditam que a decisão sobre a interrupção da gravidez cabe somente à mulher, indica pesquisa da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) em parceria com o Datafolha. Outras 25% disseram que a questão deve ser decidida pelas leis da sociedade. 

A pesquisa Expectativa da Mulher Brasileira Sobre Sua Vida Sexual e Reprodutiva: As Relações dos Ginecologistas e Obstetras Com Suas Pacientes entrevistou 1.089 mulheres de 16 anos ou mais de todas as classes sociais, em todo o país.

A Febrasgo destacou que não é nem contra nem a favor do aborto, mas luta pela descriminalização.

“Nós entendemos que essa é uma decisão da mulher. E isso está alinhado ao que 70% das mulheres pensam. Nossa legislação é da década de 40 e manda prender a mulher que faz o aborto e qualquer pessoa envolvida em ajudar essa mulher”, lembrou o presidente da Febrasgo, César Eduardo Fernandes.

Ele diz que a orientação da entidade é a de que os médicos não soneguem a informação e orientação sobre os prós e contras no momento em que forem indagados pela paciente que manifestar desejo bem discutido.

“Mas a decisão não nos cabe e nem devemos induzi-la a tomar uma ou outra decisão. O problema começa quando ela nos pergunta para onde a encaminhamos porque não temos para onde encaminhar”, acrescenta. 

Pesquisa anterior do Datafolha, divulgada em agosto do ano passado, mostrou que 59% da população brasileira, incluindo homens e mulheres, é contra mudanças na lei atual do aborto. 

O levantamento também apontou que pelo menos 5,6 milhões de brasileiras não costumam ir ao ginecologista-obstetra, 4 milhões nunca procuraram atendimento com esse profissional e outras 16,2 milhões não passam por consulta há mais e um ano. O resultado mostra que 20% das mulheres com mais de 16 anos correm o risco de ter um problema sem ao menos imaginar. 

Entre as mulheres que já foram ao ginecologista, seis a cada dez (58%) são atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), enquanto 20% passam pelo médico particular e outras 20% têm plano de saúde. Quando questionadas sobre qual especialidade médica é a mais importante para saúde da mulher, 68% citam a ginecologia, principalmente por mulheres que usam atendimento particular ou convênio. Em seguida, mencionam clínica geral e cardiologia.

“Sete em cada dez mulheres têm o ginecologista como seu médico de atenção para cuidar da especialidade e para cuidar da saúde de um modo geral. Não é diferente em outros países. É como se a ginecologia fosse a porta de entrada da mulher para a assistência básica de saúde. É muito comum a mulher que tem problemas que não são propriamente ginecológicos marcar consulta com o ginecologista e ele encaminhar para outro especialista”, explicou o presidente da Febrasgo.

O levantamento mostra ainda que nove de cada dez brasileiras costumam ir ao ginecologista – principalmente as que utilizam atendimento particular e convênio. Metade delas vai ao médico, sendo metade uma vez ao ano. Já 2% não têm frequência definida, 5% nunca foram e 8% não costumam ir.

Quando se trata do acesso ao ginecologista entre aquelas que já passaram por consulta, a média da idade para a primeira vez é de 20 anos e os motivos foram a necessidade de esclarecer algum problema ginecológico (20%), a gravidez ou a suspeita dela (19%) e a prevenção (54%). Normalmente quem as motivou a procurar o médico foram mulheres próximas (57%), a mãe (44%) ou mesmo a iniciativa própria (24%).

“Nós entendemos que a razão da primeira consulta não deveria ser por problemas ginecológicos ou gravidez. Acredito que falta da parte dos educadores e dos médicos esclarecer que a mulher deve ir na primeira consulta assim que iniciar seu período de vida menstrual ou até antes disso para entender quais são os eventos de amadurecimento puberal que ela tem para que possa ter noção de como deverá ser a sua habitualidade menstrual, para receber orientação sobre doenças sexualmente transmissíveis, iniciação sexual, métodos contraceptivos”, ressaltou Fernandes.

De acordo com as informações da pesquisa, entre aquelas que não costuma ir ao ginecologista, as razões mais alegadas são 'não preciso ir, pois estou saudável (31%)' e 'não considero importante ou necessário ir ao ginecologista (22%)'. Há ainda aquelas que dizem não ter acesso ao médico ginecologista ou não haver esse especialista na localidade onde residem (12%), ter vergonha (11%), ou não ter tempo (8%).

Relação médico-paciente

Todas as brasileiras entrevistadas (98%) consideram importante que o ginecologista dê acolhimento, realize exames clínicos, dê atenção, aconselhe, passe confiança e forneça informações claras. Nove em cada dez dizem estar satisfeitas com esses atributos em seus médicos.

“Esse é o dado que mais nos envaidece. Os números são extremamente favoráveis à atenção dos ginecologistas. Essa é uma especialidade que precisa ser resgatada, porque ela é fundamental para a boa assistência à mulher. Claro que há especialistas que merecem condenação, mas essa não é a realidade da maioria dos ginecologistas e obstetras”, disse o presidente das Febrasgo.

Em uma situação de parto, 89% declararam que se sentiriam seguras com a assistência de um ginecologista/obstetra, percentual que cai para 54% se o atendimento fosse feito por um plantonista, 49% se fosse uma doula, 43% se fosse uma enfermeira e 42% caso o parto fosse acompanhado por uma parteira.

“Existe uma confusão conceitual por parte das pessoas, especialmente da mulher, com relação ao que é uma boa assistência ao parto. Então, ela pede à doula, que não é profissional de saúde, apesar de ser importante para oferecer suporte emocional e físico. Mas a doula não pode fazer o parto. Quem pode fazer o parto é uma enfermeira com formação obstétrica, desde que acompanhada por um médico”, afirmou Fernandes.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *