25/04/2024 - Edição 540

Brasil

Rejeitado pelo STF, ensino domiciliar deve ser regulamentado pelo Governo

Publicado em 01/02/2019 12:00 -

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O Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos informou que vai editar uma Medida Provisória (MP) para regular o ensino domiciliar. Segundo a Aned (Associação Nacional de Educação Familiar), cerca de 15 mil jovens de 4 a 17 anos recebem hoje o chamado homeschooling. Mas a prática, embora não seja ilegal, (não é proibida expressamente por nenhuma norma jurídica, seja portaria, lei ou artigo da Constituição), não é regulamentada.

“Nós entendemos que é direito dos pais decidir sobre a educação dos seus filhos, é uma questão de direitos humanos", afirmou a ministra Damares Alves. O homeschooling é uma das 35 metas do governo Bolsonaro para os primeiros 100 dias de governo.

Para Luiz Alberto dos Santos, consultor legislativo do Senado, a formulação desta MP deveria ser feita pelo ministério da Educação, e não o de Direitos Humanos. "O tema envolve a regulamentação de questões como cadastramento dos alunos, avaliações pedagógicas e de socialização e frequência, conteúdos mínimos, fiscalização, etcétera", avalia.

Damares defende, contudo, que a atribuição é de sua pasta porque trata-se de “demanda de família e tem que sair do Ministério da Família. Claro, em parceria e anuência com o Ministério da Educação, mas a iniciativa deste ministério é legítima”, argumenta.

Na Justiça

Em setembro do ano passado o STF (Supremo Tribunal Federal) negou reconhecimento ao homeschooling. A Corte considerou que o ensino domiciliar não é meio legítimo do cumprimento do dever da família de prover educação, previsto na Constituição.

A visão do tribunal, no entanto, pode mudar caso a MP prometida pelo governo passe no Congresso e se torne lei. Isso porque seis ministros – Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Rosa Weber, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia – consideraram, em setembro, que o ensino em casa poderia ser legitimado se houvesse lei determinando diretrizes para a prática. Fachin sugeriu, inclusive, que o Congresso criasse esta regulação em um ano.

Para outros três ministros – Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello –, a prática é inconstitucional. Celso de Mello, decano da Corte, não participou daquela sessão por problemas da saúde.

À época, a Aned se declarou decepcionada com o resultado do julgamento, mas satisfeita pelo fato de que a prática não foi considerada inconstitucional, o que abre chance de aprovação do Congresso. Assim que o governo apresentar a MP – cujos detalhes ainda não foram divulgados -, o texto terá que ser aprovado em 60 dias, prorrogáveis por mais 60, para se tornar lei.

MEC reage

O secretário executivo do Ministério da Educação (MEC), Luiz Antônio Tozi, defendeu que a educação domiciliar deve complementar a educação formal e que matrículas nas escolas seguem obrigatórias. “É um incentivo à participação das famílias no processo de educação das pessoas. Disso que estamos falando nesse momento”.

Tozi defendeu que as crianças não sejam tiradas das escolas. “O homeschooling não substitui a escola, ele complementa a escola. Está na lei que [crianças e jovens de 4 a 17 anos] têm que vir para a escola. Ele complementa o processo educacional, trazendo para perto da casa dele, para dentro de onde ele mora, a questão da educação, que é algo que tem que ser valorizado pela sociedade. Os pais têm que estar sabendo e devem estar participando da formação de seus filhos”.

A declaração foi dada em coletiva de imprensa de apresentação dos dados do Censo Escolar no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).  “O homeschooling [educação domiciliar] é basicamente trazer a família para o processo educacional, o fato de poder fazer a educação completa depende até do STF [Supremo Tribunal Federal], são coisas que estão sendo discutidas na sociedade”, afirmou.

O Secretário Executivo disse que não teve acesso ao teor da Medida Provisória, e esclareceu que no âmbito do MEC, as matrículas seguem obrigatórias: "Nos contextos da política pública que cabe ao MEC, é isto que estamos fazendo".

Polêmica

A questão é polêmica. Por um lado, pais defendem que é possível educar os filhos em casa, modelo que existe em vários países. Por outro, diversas entidades se manifestaram contrárias ao processo.

O Conselho Nacional de Educação (CNE), em 2000, emitiu um parecer orientando que crianças e adolescentes sejam matriculados em escolas devidamente autorizadas. O CNE também entende que a legislação vigente enfatiza “a importância da troca de experiências, do exercício da tolerância recíproca, não sob o controle dos pais mas no convívio das salas de aula, dos corredores escolares, dos espaços de recreio, nas excursões em grupo fora da escola, na organização de atividades esportivas, literárias ou de sociabilidade, que demandam mais que os irmãos apenas, para que reproduzam a sociedade, onde a cidadania será exercida”.

Dados apresentados hoje pelo Inep mostram que o país tem cerca de 2 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos fora da escola, idade escolar obrigatória. As maiores concentrações de pessoas excluídas do sistema de ensino estão nos 4 anos de idade, com 341.925 crianças fora da pré-escola e aos 17 anos, com 915.455 jovens.

Alfabetização

Tozi destacou que o objetivo da atual gestão é melhorar o ensino básico. Um dos focos, que consta também entre as metas prioritárias, é a alfabetização. “O que está planejado já é ampliar a caixa de ferramentas do docente”, diz. Segundo ele, a pasta irá oferecer opções aos professores, ainda na formação.

Ele explica que a intenção é que métodos de alfabetização sejam trazidos para discussão. “O que importa é trazer para discussão a parte prática, de sala de aula. Usem métodos, vamos discutir a aplicação do conhecimento. Nem toda criança aprende igual com todos os métodos”, disse.

Os dados do Censo Escolar estão disponíveis para consulta na página do Inep. A autarquia disponibilizou notas estatísticas, sinopses estatísticas, microdados e indicadores educacionais.


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