25/04/2024 - Edição 540

Poder

Imprensa internacional vê oportunidade perdida de Bolsonaro em Davos

Publicado em 25/01/2019 12:00 -

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O discurso do presidente Jair Bolsonaro no Fórum Econômico Mundial em Davos no último dia 22 chamou a atenção da imprensa internacional por sua curta duração e pela falta de um conteúdo mais aprofundado sobre as plataformas do novo governo.

Veículos citaram as semelhanças entre o brasileiro e o presidente dos EUA, Donald Trump, se referindo a Bolsonaro como "Trump dos trópicos".

O jornal alemão Die Welt afirmou que o "mini-Trump brasileiro perdeu uma oportunidade única". Bolsonaro, diz a publicação, não tirou os olhos do teleprompter, evitando "deslizes retóricos". Mas, como desvantagem de tal estratégia, o jornal aponta que "nada do que Bolsonaro possa ter em termos de charme, humor ou calor veio à tona".   

O Welt avaliou que o presidente entregou uma sequência de frases vazias "em staccato", que poderiam ter sido tiradas de um guia para o fomento à economia local. 

Ao citar a curta duração da fala do brasileiro, o jornal mencionou que poucos no auditório não estavam contentes quando ele encerrou o discurso, "principalmente o próprio Bolsonaro".

O pouco tempo utilizado por Bolsonaro em Davos também foi destacado pelo jornal Süddeutsche Zeitung, que qualificou o discurso de "superficial e surpreendentemente curto".

"Trinta minutos foram reservados para ele, e foi pedido aos jornalistas que chegassem com horas de antecedência para garantir um lugar [no auditório]. Nada disso teria sido necessário: Bolsonaro sequer precisou de 15 minutos, e a sala não estava cheia", afirmou a publicação.

O diário alemão também comparou o brasileiro a Trump, afirmando que são muitas as semelhanças entre ambos e que, nos bastidores do fórum, Bolsonaro é chamado de "Trump dos trópicos".

O britânico The Guardian destacou em manchete que a estreia de Bolsonaro em Davos foi "ofuscada pelo crescente escândalo em torno de seu filho", o senador eleito Flávio Bolsonaro, desencadeado por operações bancárias suspeitas envolvendo um ex-assessor.

O jornal afirma que, enquanto o presidente se preparava para subir no palco, surgiam relatos na imprensa brasileira de que seu filho estaria ligado a um "esquadrão da morte chamado de Escritório do Crime". 

O escândalo envolvendo o senador eleito "contrasta com as afirmações de Bolsonaro em Davos de que vai liderar uma cruzada contra a corrupção e o crime organizado", diz o Guardian. Segundo o jornal, "observadores políticos e membros da plateia ficaram pouco impressionados com a chegada de Bolsonaro ao palco mundial".

O The New York Times abordou o discurso do presidente brasileiro com a manchete: "Bolsonaro é o rosto do populismo no Fórum de Davos". O jornal americano ressaltou que, com a ausência de Trump, o brasileiro foi o representante dos populistas no evento.

A publicação, que também menciona o apelido "Trump dos trópicos", diz que os dois líderes se assemelham pelo fato de alegarem ter chegado ao poder apesar de serem alvo de "ataques injustos" da imprensa.

Outra semelhança apontada pelo NYT é o fato de ambos utilizarem casacos de inverno em salas aquecidas. Trump fez o mesmo recentemente durante uma recepção na Casa Branca, onde serviu hambúrgueres a uma equipe de futebol americano que o visitou.

"Assim como Trump fez ao chegar a Davos no ano passado, Bolsonaro tentou suavizar a mensagem insurgente que o levou à presidência", disse o NYT.

"Com seus instintos nacionalistas, estilo de homem forte e histórico de declarações duras contra mulheres, gays e grupos indígenas, Bolsonaro é, de várias maneiras, a antítese de um 'homem de Davos'", afirmou o jornal, em referência ao termo que descreve as personalidades que comparecem ao encontro anual no resort alpino.  

O francês Le Monde avaliou que Bolsonaro "fez o mínimo para vender um novo Brasil em Davos", com um discurso que "não será um marco nos anais [do fórum], como foram os de alguns de seus antecessores".

O diário afirma que o interesse pelo brasileiro foi ampliado pela ausência de figuras de maior destaque como Trump, além do presidente da França, Emmanuel Macron, e da primeira-ministra britânica, Theresa May, "todos muito ocupados em administrar crises domésticas".

Ausência constrangedora

Após o discurso curto e vazio, Bolsonaro decidiu cancelar uma entrevista coletiva que concederia a jornalistas em Davos, 40 minutos antes de ela acontecer.

A equipe do Fórum foi pega de surpresa. Bolsonaro se reuniu com o presidente da Suíça, Ueli Mauer, e com o ex-premiê britânico, Tony Blair, após almoçar com investidores e apresentar os prospectos para o Brasil.

Em seguida, porém, ele tomou o caminho de volta a seu hotel em vez de se dirigir ao centro de imprensa, onde faria um pronunciamento seguido de entrevista coletiva com os ministros Paulo Guedes (Economia) e Sergio Moro (Justiça).

O assessor da Presidência Tiago Pereira Gonçalves disse a repórteres que aguardavam o presidente no hotel que o cancelamento da entrevista coletiva se deu devido à “abordagem antiprofissional da imprensa”.

Depois de a informação ser publicada, a comitiva mudou a versão duas vezes: primeiro, uma assessora e o ministro Augusto Heleno (GSI) afirmaram que o presidente quis se poupar de uma agenda carregada. Mas os demais compromissos foram mantidos. Passada uma hora, o ministro Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral) afirmou que o presidente retornara ao hotel porque precisara trocar a bolsa de colostomia que usa.

Repórteres estrangeiros —portugueses, mexicanos, suíços, alemães e chineses— ficaram estupefatos com o cancelamento do evento, comunicado oficialmente pela organização do Fórum 17 minutos após o horário em que a entrevista começaria.

A organização não ofereceu motivos para o cancelamento e pediu aos jornalistas que perguntassem à delegação brasileira —a equipe do Fórum levou quase uma hora para entender o que havia acontecido. 

A assessoria de comunicação do presidente tentara organizar uma declaração antes do encontro bilateral com o premiê italiano, Giuseppe Conte, mas o brasileiro se recusou, alegando falta de tempo.

É incomum que um chefe de Estado ou governo não dê nenhuma entrevista coletiva em Davos, evento visto como uma vitrine mundial para investidores.


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