26/04/2024 - Edição 540

Poder

Ex-assessor de Flávio Bolsonaro falta de novo a depoimento

Publicado em 22/12/2018 12:00 -

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O policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), faltou pela segunda vez, na sexta-feira (21), a depoimento no Ministério Público do Rio de Janeiro para explicar a movimentação atípica de R$ 1,2 milhão em sua conta.

A Promotoria afirmou que a defesa do PM disse que ele “precisou ser internado na data de hoje, para realização de um procedimento invasivo com anestesia, o que será devidamente comprovado, posteriormente, através dos respectivos laudos médicos”.

Queiroz já havia faltado na quarta-feira (19) a depoimento no Ministério Público em razão de "urgência médica".

O MP-RJ afirmou que vai sugerir ao presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), André Ceciliano (PT), o comparecimento de Flávio Bolsonaro no dia 10 de janeiro para prestar esclarecimento sobre o caso. 

Os familiares de Queiroz e outros assessores de Flávio Bolsonaro citados no relatório foram chamados a depor no dia 8.

Relatório do Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) apontou que Queiroz movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017  —entre depósitos, saques e transferências.

O órgão considerou atípicos o volume e a forma com que as operações foram feitas. O alerta do Coaf, contudo, não significa a identificação de uma prática criminosa. A promotoria apura a origem e o destino do dinheiro movimentado.

Os dados do relatório apontam coincidências entre as datas de pagamento de salários da Alerj, depósitos em espécie na conta de Queiroz e saques em dinheiro pelo policial militar. A suspeita é que o policial militar fosse o responsável por recolher parte do salário dos funcionários de Flávio Bolsonaro —prática em alguns gabinetes do Legislativo. O senador eleito nega essa hipótese.

O caso foi revelado há 15 dias sem que uma explicação para a movimentação financeira do policial militar fosse dada.

Bolsonaro afirmou há duas semanas que o ex-assessor havia dado uma versão “bastante plausível” para as entradas e saídas de dinheiro em sua conta. Contudo, não divulgou a linha de defesa do PM por, segundo disse, não poder se responsabilizar por ela.

“Quem tem que dar explicação é o meu ex-assessor, não sou eu. A movimentação atípica é na conta dele”, declarou ele esta semana.

A única explicação dada até o momento refere-se ao cheque de R$ 24 mil emitido por Queiroz para a futura primeira-dama Michelle Bolsonaro, o presidente eleito Jair Bolsonaro afirmou que o valor se refere ao pagamento de uma dívida de, no total, R$ 40 mil.

A reportagem visitou três endereços em nome do policial militar, sem conseguir localizá-lo. Foi também a uma padaria que ele costumava tomar café da manhã na zona oeste. Funcionários afirmaram que o cliente assíduo não aparece no local desde a divulgação do relatório.

Queiroz é amigo de Jair Bolsonaro há 30 anos. Foi o presidente eleito quem indicou o policial militar para atuar como motorista do filho na Alerj. Ele foi nomeado em 2007 e deixou o gabinete no dia 15 de outubro deste ano.

O Grupo de Atribuição Originária em Matéria Criminal da Procuradoria-Geral da Justiça investiga no total 21 deputados e 75 assessores que tiveram o nome citado em relatório do Coaf. A lista inclui parlamentares de 12 partidos.

De acordo com o MP-RJ, alguns deputados procuraram o órgão espontaneamente para prestar esclarecimentos.

O caso de Flávio Bolsonaro será encaminhado a um promotor de primeira instância após assumir sua cadeira no Senado, em razão do fim do foro privilegiado definido pelo Supremo Tribunal Federal.

Em nota, a assessoria de imprensa do senador eleito afirmou que “não é investigado, e não fez nada de errado”.

“[Flávio Bolsonaro] Estará à disposição das autoridades competentes, por ser o principal interessado na elucidação dos fatos”, diz a nota.

Pelo Twitter, o senador eleito voltou a afirmar que quem deve dar explicações é Queiroz. "Pela enésima vez, não posso ser responsabilizado por atos de terceiros e não cometi nenhuma ilegalidade".


Desconfiança no Congresso

A falta de explicações para o caso alimenta desconfianças no Congresso. Parlamentares preveem que a oposição usará a situação para pressionar Jair Bolsonaro no início do ano.

Até no entorno da família Bolsonaro soou pouco convincente a alegação de que ele precisou ser internado às pressas.

Uma pessoa próxima dos Bolsonaro diz que Flávio não voltou a conversar com o ex-assessor após encontrá-lo no início do mês, logo que as suspeitas do Coaf vieram à tona. Na época, Flávio considerou as explicações plausíveis.

Motorista atípico

De duas, uma: ou o clã Bolsonaro bolou uma estratégia genial, capaz de causar inveja às almas mais encrencadas da política, ou meteu-se numa tática desastrosa, enfiando a conta "atípica" de um motorista desgovernado para dentro do Palácio do Planalto.

A defesa de Queiroz alegou que ele teve de ser internado para "realização de um procedimento invasivo com anestesia". Que procedimento? A defesa não informou. Nome do hospital? Nada. O médico? Nem sinal. Laudas e atestados? Quem sabe na semana que vem. Falsa ou verdadeira, a motivação não atenua as consequências. Enquanto Queiroz não abre o bico, continuam penduradas na conjuntura as palavras mais recentes de Bolsonaro sobre a encrenca:

1) "Temos um problema pela frente no caso do ex-assessor nosso que está com movimentação atípica. Deixo bem claro aqui: eu não sou investigado, meu filho Flávio Bolsonaro não é investigado. E, pelo que me consta, o senhor…, esse ex-assessor nosso será ouvido pela Justiça na semana que vem. A gente espera que ele dê os devidos esclarecimentos para o que vem acontecendo."

2) "Agora, se algo estiver errado —seja comigo, com meu filho ou com o Queiroz— que paguemos a conta deste erro. Não podemos comungar com erro de ninguém."

3) "O que a gente mais quer é que seja esclarecido o mais rápido possível, que sejam apuradas as responsabilidades —se é minha, se é do meu filho, se é do Queiroz. Ou de ninguém. Afinal de contas, o Queiroz também não estava sendo investigado."

Bolsonaro tem razão quando diz que "temos um problema pela frente". Quanto a quem está ou não sob investigação, recomenda-se ao capitão que se atualize. Fabrício Queiroz é investigadíssimo. Seu silêncio, por ensurdecedor, levou à fogueira o deputado estadual Flávio Bolsonaro (agora senador eleito).

O primogênito do novo presidente foi convidado pelo Ministério Público a depor no dia 10 de janeiro. Terá de explicar por que oito de seus assessores realizavam depósitos regulares na conta tóxica de Queiroz em datas contíguas ao dia do pagamento na Assembleia Legislativa do Rio.

Logo, logo o próprio Jair Bolsonaro terá de explicar em termos mais convincentes os R$ 24 mil que migraram da conta "atípica" do amigo Queiroz para a conta da futura primeira-dama Michelle Bolsonaro. Soou inverossímil aquele lero-lero de que seria parte do pagamento de um empréstimo não-declarado de R$ 40 mil. Que foi parar na conta da mulher por falta de tempo do marido-presidente para ir ao banco.

Conforme já foi comentado aqui, o "faz-tudo" Queiroz pode seguir duas trilhas quando sua saúde ou a conveniência dos Bolsonaro permitir que preste depoimento. Numa trilha, o correntista toca fogo nas próprias vestes. Noutra, incendeia o circo da dinastia Bolsonaro. Por ora, as únicas novidades disponíveis sobre o caso são as seguintes: 1) O correntista piromaníaco continua sumido. Já lá se vão 15 dias. 2) O espetáculo da autocombustão foi transferido para os primeiros dias da Presidência de Jair Bolsonaro.


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