28/03/2024 - Edição 540

Poder

Para ministra das Mulheres, Família e Direitos Humanos gravidez é problema e mulher nasceu para ficar em casa

Publicado em 07/12/2018 12:00 -

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O presidente eleito, Jair Bolsonaro, escolheu Damares Alves para o Ministério das Mulheres, Família e Direitos Humanos. A pasta vai abrigar a Funai (Fundação Nacional do Índio), que hoje está na Justiça.  Trata-se da segunda mulher indicada para o primeiro escalão do próximo governo. Além de Alves, Bolsonaro confirmou a deputada Tereza Cristina para o Ministério da Agricultura.

O anúncio da ministra foi feito pelo futuro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, ao lado do deputado federal eleito Julian Lemos (PSL-PB), que foi por três vezes alvo da Lei Maria da Penha, acusado de agressão pela irmã e pela ex-mulher.

Damares é advogada e atualmente é assessora no gabinete do senador Magno Malta (PR-ES). O parlamentar capixaba é amigo de Bolsonaro e chegou a ser cotado para o Ministério da Cidadania, mas a ideia foi abandonada após críticas de apoiadores.

Logo depois de ter sido anunciada por Onyx, ela prometeu garantir que as mulheres ganhem o mesmo salário que os homens. "Nenhum homem vai ganhar mais que uma mulher nessa nação desenvolvendo a mesma função. Isso já é lei e o Ministério Público está aí para estar fiscalizando. Se depender de mim vou para porta da empresa que o funcionário homem desenvolvendo papel igual à mulher está ganhando mais. Acabou isso no Brasil", declarou.

Damares se disse tranquila em relação a incorporação da Funai. "Funai não é problema, índio não é problema. Funai não é problema neste governo, o presidente só estava esperando o melhor lugar para colocar a Funai. E nós entendemos que é o Ministério de Direitos Humanos porque índio é gente. E o índio precisa ser visto de uma forma como um todo. Índio não é só terra, índio também é gente", afirmou. Ela disse estar qualificada para assumir a Fundação por seu histórico com indígenas, citando ter participado de uma CPI no fim da década de 1990.

Sobre Direitos Humanos, pasta que Bolsonaro antes dizia que extinguiria, Damares disse que, em sua gestão, dará continuidade à políticas que estão dando certo, mas não citou exemplos. Segundo a futura ministra, haverá valorização de políticas públicas voltadas à infância e à vida. Ela prometeu ainda dar protagonismo a pessoas excluídas das ações do governo. Como exemplo, citou ciganos, mulheres ribeirinhas e quebradoras de coco.

Damares é educadora, pastora evangélica e advogada.Ela definiu a pauta LGBT como delicada e complexa, mas prometeu uma conciliação de defensores da causa com setores conservadores da sociedade. "A pauta LGBT é muito delicada, mas a minha relação é muito boa, dá para gente ter um governo de paz entre o movimento conservador, movimento LGBT e os demais movimentos", afirmou.

Probleminha

Damares Alves afirmou ser contra a legalização do aborto e disse que a gravidez é "um problema que dura só nove meses", enquanto interromper a gestação caminha ao lado da mulher "pela vida inteira".

"Se a gravidez é um problema que dura só nove meses, o aborto é um problema que caminha a vida inteira com a mulher", declarou Damares após sair de reunião com o presidente eleito na sede do governo de transição, em Brasília.

Para ela, o aborto será admitido apenas em casos previsto em lei. Hoje o aborto é permitido no Brasil quando a gravidez é resultado de estupro, gestação na qual há risco de morte para o feto ou para a mãe e no caso de anencéfalos —liberado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Pastora evangélica, a nova ministra ressaltou que sua pasta não vai tratar do tema aborto e lidará somente com assuntos relacionados à vida."Essa pasta não vai lidar com o tema aborto, vai lidar com proteção de vida e não com morte", disse Dalamares. 

“Eu sou contra o aborto. ​Nenhuma mulher quer abortar. Elas chegam até o aborto porque, possivelmente, não foi lhe dada nenhuma outra opção. A mulher aborta acreditando que está desengravindando (sic), mas não está".

Em uma década, o SUS gastou R$ 486 milhões com internações para tratar quadros de complicação do aborto, sendo 75% deles provocados. De 2008 a 2017, 2,1 milhões de mulheres foram internadas —os dados constam de relatório do Ministério da Saúde.

Damares disse ainda que são necessárias "políticas públicas de planejamento familiar" para que a interrupção da gravidez não seja tratada como um "método anticonceptivo".

Mulher nasceu para ser mãe

A mulher nasceu para ser mãe, seu papel mais especial, e dizer que elas estão em guerra com os homens é uma lorota feminista. É assim que a pastora –ministra versa sobre o feminismo em entrevista gravada no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, para um site conservador do Rio Grande do Norte, o Expresso Nacional. 

Suas pautas se alinham às da bancada que diz falar no Congresso em nome dos evangélicos. Ao Expresso Nacional, por exemplo, afirmou que a ideologia de gênero é "morte, é morte de identidade", além de condenar o aborto e a legalização das drogas. "O menino abestado por maconha e abusado não vai liderar uma nação, é massa de manobra, […] não tem senso de crítico."

Com carreira profissional hiperativa, ela diz que, ao contrário do que feministas propagandeariam, é possível, sim, ser do lar e do mercado de trabalho. "Me preocupo com ausência da mulher de casa", diz a pastora da Igreja Quadrangular, que brinca em seguida: amaria passar a tarde deitada na rede, "e o marido ralando muito, muito, muito para me encher de joias". Compara a imagem materna com a da galinha com seus pintinhos embaixo da asa.

Ela já disse ter sido uma sobrevivente da pedofilia, após ter sido estuprada aos seis anos. O ataque a teria deixado incapaz de engravidar.​ O assunto, portanto, tem sua atenção máxima, diz. Para abordar os perigos virtuais, compartilha a história de uma menina que queria procurar na internet trança embutida, escreveu "transa" e teria entrado em choque com o que viu.

O problema, segundo ela, começa com bandas típicas do celeiro progressista, como a roqueira gaúcha Bidê ou Balde?, que tem a música "E Por Que Não?", que vai assim: "Eu estou adorando/ Ver a minha menina/ Com algumas colegas/ Dela da escolinha". O grupo chegou a homologar um acordo numa Vara da Infância que os impede de executar a canção novamente.

Atuação evangélica

A futura ministra é desde 2015 assessora parlamentar do senador Magno Malta (PR), uma das principais figuras da bancada evangélica. Até então com salário líquido de 4.408 reais, virou ministra no lugar que muitos imaginavam pertencer a seu chefe. Apoiador de primeira hora de Bolsonaro, Malta não esconde seu ressentimento com o presidente eleito por ter sido preterido na montagem da Esplanada. Assim como ocorreu com a escolha do titular da Educação, Ricardo Vélez, Bolsonaro passou por cima de aliados no Congresso Nacional, que reclamaram nos bastidores de terem sido ignorados pelo presidente eleito na seleção. As queixas agora viraram públicas: "Se até o momento ficava claro alguma ingratidão com o Magno Malta, agora chegou a ser afronta. Acho que ele [Bolsonaro] erra em convidar e ela [Damares] erra em aceitar. Não foi uma coisa muito bem conduzida", diz o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM), aliado de Malta no Congresso

A ligação de Damares com aliados do presidente eleito é anterior ao vínculo com o senador pelo Espírito Santo. Antes, ela trabalhou para o deputado federal Arolde de Oliveira (PSD), senador eleito pelo Rio de Janeiro cujo sucesso nas urnas em outubro se deveu, em grande parte, ao suporte do clã Bolsonaro. "Ela foi minha assessora durante uns quatro anos. Saiu em 2014 e nós negociamos com o senador Magno Malta para ela continuar fazendo o mesmo trabalho lá", conta Oliveira. "É uma advogada muito atuante, uma educadora, e é pastora. Então os valores e princípios dela são aqueles valores judaico-cristãos", acrescenta.

O deputado diz ter convidado Damares para auxiliá-lo após ter acompanhado o seu trabalho como colaboradora da frente parlamentar evangélica. Antes de trabalhar para Oliveira, ela foi chefe de gabinete de outro expoente da bancada neopentecostal na Câmara, o deputado federal João Campos (PRB). O parlamentar, pré-candidato à presidência da Câmara e autor do polêmico projeto da cura gay, diz que a militância de Damares em temas caros aos evangélicos a tornou conhecida no meio religioso. "Na medida em que foi se dedicando a esses temas, ela foi ficando conhecida e passou a ser solicitada a fazer palestras nos mais diversos Estados do Brasil", relata Campos.

Na Internet, é possível encontrar vídeos em que Damares afirma que "a ideologia de gênero é um grande maltrato contra as crianças do Brasil" e que "estão desconstruindo a identidade biológica" delas. Em sites especializados para o público evangélico, a pastora também é citada com certa frequência, denunciando, por exemplo, o que considera uma "guerra contra a família" promovida nas escolas brasileiras. Nesta quinta, porém, a futura ministra prometeu fazer “um governo de paz entre o movimento conservador, o movimento LGBT e os demais movimentos.”


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