20/04/2024 - Edição 540

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O lugar mais perigoso para as mulheres é a própria casa, diz a ONU

Publicado em 04/12/2018 12:00 -

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O lugar mais perigoso do mundo para uma mulher não é um beco escuro e sem saída, um campo de batalha ou seu local de trabalho: é a sua própria casa. A afirmação é de um novo relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), que analisou os homícidios de mulheres e meninas relacionados ao gênero.

Das 87 mil mulheres assassinadas globalmente em 2017, cerca de 50 mil foram mortas por um parceiro amoroso ou familiar. Até 30 mil – 34% – dos feminicídios foram cometidos por companheiros íntimos. 

Segundo o estudo, uma mulher é morta por alguém que conhece a cada 10 minutos. E 137 mulheres são mortas diariamente por algum parente. 

Esta é uma tendência em ascensão global, apesar do surgimento de programas para erradicar a violência contra as mulheres. Em 2012, cerca de 47% de todas as vítimas de homicídio do gênero feminino foram mortas por parceiros íntimos ou familiares. Em 2017, esse número foi de 58%.

Em nível global, os homens são cerca de quatro vezes mais propensos a morrerem vítimas de assassinatos. No entanto, as mulheres ainda são as principais vítimas da maioria dos homicídios cometidos por um companheiro ou por alguém com quem se relacionam. Muitas vezes, vítimas de relacionamentos abusivos ou de assassinatos com base em religião, como os chamados "crimes de honra".

"Enquanto a maioria das vítimas de homicídio são homens, as mulheres continuam pagando o preço mais alto do resultado da desigualdade de gênero,da discriminação e dos estereótipos negativos. Elas também são mais propensas a serem mortas por parceiros e familiares", reforçou Yury Fedotov, diretor executivo do UNODC. 

A África foi considerada o continente onde as mulheres correm o maior risco de serem mortas por um parceiro ou parente, com cerca de 3,1 vítimas a cada 100 mil mulheres.

A taxa também foi alta nas Américas, com 1,6 para 100 mil mulheres, assim como a Oceania, com 1,3 e a Ásia, com 0,9, respectivamente. 

A Europa teve a menor taxa de mulheres mortas por parceiros, com 0,7 vítimas a cada 100 mil moças. 

O relatório do UNODC ressalta que há a necessidade de legislação mais dura e programas contra a violência de gênero violência a serem desenvolvidos, especialmente aqueles que "mudam as normas culturais e que afastam a masculinidade violenta dos estereótipos de gênero".

Além disso, o documento argumenta a violência poderia ser menor, caso a polícia, o sistema judiciário, serviços de saúde e sociais fossem mais eficientes.

Américas

A violência contra as mulheres perpetrada por parte do parceiro continua a ser uma violação dos direitos humanos e um problema generalizado de saúde pública nas Américas. A prevalência da violência física e/ou sexual, no entanto, varia entre os países da região. Em alguns deles, esse tipo de violência afeta 14% das mulheres com idade entre 15 e 49 anos em algum momento de suas vidas, enquanto em outros pode afetar mais de 60% da população feminina. Esses números foram destacados no último dia 29 pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) em um evento no marco do Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher.

Os dados são parte de uma revisão sistemática e uma reanálise de estimativas de pesquisas nacionais sobre a prevalência da violência por parte do parceiro contra mulheres, realizadas em 24 países da região. As informações serão publicadas na Revista Pan-Americana de Saúde Pública. O estudo também mostra que certos tipos de violência perpetrados por parceiros contra mulheres podem ter declinado nos últimos 20 anos em pelo menos sete países da região (Canadá, Colômbia, Guatemala, Haiti, México, Nicarágua e Peru). No entanto, algumas variações nos dados desses países são mínimas e alguns indicadores não mudaram de maneira linear, o que sugere que se deve ter cautela ao interpretar esses números.

“Um problema dessa magnitude só pode ser resolvido por meio de colaboração intersetorial”, disse Isabella Danel, diretora adjunta da OPAS. “O sistema de saúde deve fornecer às vítimas serviços compassivos, eficazes e acessíveis”, acrescentou. Isabella também acredita que “o setor da saúde pode se tornar um poderoso aliado por meio da coleta e análise de dados que informam políticas e ações para prevenir essa violência”.

A violência contra as mulheres tem muitas consequências para a saúde: feminicídio, doenças associadas à infecção pelo HIV, suicídio e mortalidade materna, bem como lesões, infecções sexualmente transmissíveis (IST), gravidez indesejada, problemas na saúde sexual e reprodutiva e transtornos mentais. Um problema que varia de país para país A prevalência de violência física e/ou sexual por parte do parceiro infligida em algum momento da vida varia de uma em sete mulheres (14%-17%) entre 15 e 49 anos no Brasil, no Panamá e no Uruguai, a seis em dez mulheres (58,5%) na Bolívia, de acordo com dados analisados pela OPAS. Em 12 países (Argentina, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Equador, Estados Unidos, Haiti, Honduras, Jamaica, Peru, República Dominicana e Trinidad e Tobago), esse tipo de violência afetou mais de um quarto das mulheres em algum momento de suas vidas.

Ao analisar a prevalência de violência perpetrada pelo parceiro nos 12 meses anteriores à pesquisa, os dados mostram percentuais que variam de 1,1% de mulheres no Canadá a 27,1% de mulheres na Bolívia. Entre os dados analisados, oito países ofereceram a possibilidade de comparar as mudanças nos níveis de violência por parte do parceiro ao longo do tempo. Evidências preliminares sugerem que, nos últimos 15-20 anos, tanto a violência física quanto a violência sexual nesses casos poderiam estar em declínio no Canadá, Colômbia, Guatemala, Haiti, México, Nicarágua e Peru. No caso da Nicarágua, por exemplo, a violência física entre parceiros diminuiu quase pela metade (de 11,9% em 1998 para 6,1% em 2012). No Canadá, a violência física e/ou sexual por parte do parceiro diminuiu em 50%, de 2,2% em 2004 para 1,1% em 2014.

No entanto, na República Dominicana, os relatos de violência física perpetrada por parceiros vivenciados nos 12 meses anteriores à pesquisa aumentaram. Em 2002, 9,8% das mulheres relataram terem sido vítimas de violência física perpetrada pelo parceiro no ano anterior, em comparação a 2013, quando 14,7% relataram ter sido vítimas desse tipo de violência nos 12 meses anteriores à pesquisa.

Os oito países analisados nesta parte do estudo ofereciam ao menos três pesquisas para revisão, o número mínimo necessário para avaliar mudanças ao longo do tempo. Portanto, deve-se ter cuidado ao interpretar esses dados. Outros fatores, incluindo o treinamento de entrevistadores, também podem influenciar a disposição da mulher em relatar e a qualidade dos dados. Por isso, requerem-se dados adicionais para confirmar as tendências observadas.

“As indicações de que os níveis de violência por parte do parceiro podem estar diminuindo na região reforçam a ideia de que a violência contra as mulheres pode ser evitada por meio de medidas multissetoriais sustentadas”, disse Alessandra Guedes, assessora regional de Violência Familiar da OPAS. “Esses dados também confirmam que a ação de longo prazo em um nível compatível com a magnitude do problema é necessária.

Também é vital que os ganhos sejam monitorados de perto para evitar contratempos e consolidá-los ao longo do tempo, bem como salvaguardar os direitos e a saúde das mulheres”, acrescentou. Esta análise procura superar a falta de padronização de pesquisas entre países. Mesmo assim, alguns desafios permanecem, portanto, deve-se ter cautela ao comparar os níveis de violência, particularmente entre os países. “A violência por parte do parceiro pode ser evitada”, disse Alessandra. “É vital que a coleta de dados seja aprimorada para entendermos melhor como essa violência afeta diferentes grupos de mulheres, entre eles grupos minoritários e mulheres em situação de vulnerabilidade. No entanto, os dados servirão apenas ao seu propósito quando forem usados para elaborar políticas e programas que beneficiem as mulheres da região”, concluiu.

O papel do setor da saúde Além de contribuir para a coleta de dados, o setor de saúde pode desempenhar um papel importante na resposta à violência contra as mulheres. Os provedores de saúde podem identificar mulheres expostas à violência, fornecer atendimento imediato e mitigar os danos, garantindo apoio e encaminhamento para outros setores, incluindo serviços legais e sociais. Vários estudos mostram que mulheres expostas à violência são mais propensas a procurar atendimento médico do que mulheres que não são. Isso nem sempre significa, no entanto, que as mulheres submetidas à violência confiem em um prestador de cuidados de saúde.

Por conseguinte, as iniciativas visam permitir que os profissionais de saúde identifiquem rapidamente as mulheres que sofreram violência, a fim de lhes proporcionar um maior acesso aos serviços de apoio, cuidados e encaminhamento para serviços não médicos. A OPAS está trabalhando com os países da região para treinar os profissionais de saúde para que sejam capazes de identificar as sobreviventes que visitam os estabelecimentos de saúde e fornecer a eles um atendimento de qualidade.

A Organização também está trabalhando com as autoridades de saúde para desenvolver diretrizes baseadas em evidências que possam ser incorporadas aos protocolos no nível do sistema de saúde. Também está colaborando com outros setores na prevenção da violência contra as mulheres.

 


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