18/04/2024 - Edição 540

Meia Pala Bas

Cinco truques simples e estranhos para demonizar um protesto

Publicado em 12/06/2015 12:00 - Rodrigo Amém

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Você está lá, cuidando do seu negócio. Aí alguém descobre que suas crenças, seu estilo de vida ou sua fonte de renda são extremamente prejudiciais e nocivas a um (ou vários) grupo de pessoas. Em pouco tempo, os protestantes estão carregando cartazes e narizes de palhaço e marchando até a sua porta. O que fazer? Não se preocupe meu amigo. A clássica fórmula de demonização das dissidências continua viva, efetiva e amplamente empregada. Governos, clérigos e milionários em geral sabem que podem confiar nesses macetes de discurso para transformar qualquer reivindicação legítima num delírio de um grupo de desequilibrados. Confira.

1 – Espere que um dos protestantes cometa um crime.

É uma questão de tempo e, quanto maior o número de manifestantes, menos tempo você terá que esperar. Um milhão de pessoas nas ruas exigem reformas sociais? Ótimo. Rapidinho algum deles vai fazer uma bobagem. Aí você pode atribuir aquela transgressão ao movimento como um todo. E ninguém leva a sério exigências de um bando de criminosos, não é?

2 – Ache um exemplo de sucesso entre os protestantes.

Para essa manobra, você precisa de: um negro numa posição de poder, um homossexual de ampla aceitação popular, uma mulher com voz de comando. Prontinho. Não dá mais pra falar em preconceito e discriminação, não é? Muito pelo contrário! Pra que cotas?! Pra que lei anti-homofobia?! Pra que Maria da Penha?

3 – Acuse os protestantes de buscar publicidade.

Nada transforma a imagem de um protesto como a insinuação de que "são um bando de desocupados querendo aparecer". Aparentemente, nada irrita mais a família brasileira do que alguém buscando atenção da mídia. Isso num país onde Big Brother é uma paixão nacional. Vai entender.

4 – Concentre-se nos membros mais exóticos e desagradáveis do grupo.

Lembre-se: o segredo é não lidar com as demandas, mas com as pessoas mais radicais entre aqueles que as fazem. Um debate racional e ponderado com os membros mais centrados do grupo não é do seu interesse. Mas chamar aquelas protestantes de peito de fora em praça pública de hippies despudoradas é garantia de curtidas e compartilhamentos.

5 – Insista que qualquer mudança, por menor que seja, vai destruir o mundo.

É a famosa falácia da porteira. Se você fizer alguma concessão, qualquer que seja, vai abrir a porteira. Aí, não tem como fechar. Se você permitir que casais homossexuais partilhem os mesmos benefícios de um casal heterossexual, como garantir que um homem não se case com um bode? Com 18 bebês? Como impedir a destruição da família brasileira? Você sabe, é claro, que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Mas, fazendo bastante barulho, não há grito de protesto que não vire burburinho. E burburinho a gente abafa. 

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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