16/04/2024 - Edição 540

Ágora Digital

O flautista e os ratos

Publicado em 26/02/2020 12:00 - Victor Barone

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A convocação do presidente Jair Bolsonaro de manifestações contra as instituições democráticas, usando para isso a imagem de generais, foi um ataque direto contra o Estado Democrático de Direito. As manifestações, marcadas para 15 de março (data do quinto aniversário do primeiro grande protesto pelo impeachment de Dilma Rousseff), traz pautas como o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal e a cassação ou prisão de suas lideranças. Ambos os poderes têm servido como freios e contrapesos a ações radicais e inconstitucionais de Bolsonaro.

Bolsonaro age como um “Flautista de Hamelin”, fazendo soar sua flauta, cuja melodia apela para tudo de pior que as sociedades modernas acumularam nos últimos 100 anos – do racismo à xenofobia, do anticientificismo à homofobia –  para que os ratos e ratazanas sintam-se empoderados o suficiente para colocar de fora dos esgotos seus focinhos.

Dizia a mensagem de Bolsonaro: "Ele foi chamado a lutar por nós. Ele comprou a briga por nós. Ele desafiou os poderosos por nós. Ele quase morreu por nós. Ele está enfrentando a esquerda corrupta e sanguinária por nós. Ele sofre calúnias e mentiras por fazer o melhor para nós. Ele é a nossa única esperança de dias cada vez melhores. Ele precisa de nosso apoio nas ruas. Dia 15.3 vamos mostrar a força da família brasileira. Vamos mostrar que apoiamos Bolsonaro e rejeitamos os inimigos do Brasil. Somos sim capazes, e temos um presidente trabalhador, incansável, cristão, patriota, capaz, justo, incorruptível. Dia 15/03, todos nas ruas apoiando Bolsonaro.”

Diante da repercussão negativa, o presidente tentou relativizar:

Apesar de tímidas e intimidadas, as instituições ensaiaram reações. Três ex-presidentes da República publicaram reações nas redes sociais.

Lula, também pelo Twitter, chamou o gesto bolsonarista de “autoritário” e também cobrou uma reação das autoridades.

"O Congresso Nacional tem sido tímido nas reações a ataques do presidente da República, mas não é mais possível adiar uma ação enérgica do parlamento em defesa da democracia. Se o Congresso não reagir agora a Bolsonaro, será tarde demais mais para frente", disse Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na Câmara dos Deputados.

A declaração vai ao encontro do que disse o ministro do STF Celso de Mello. À coluna de Monica Bergamo, na Folha de S.Paulo, afirmou que isso mostra "a face sombria de um presidente da República que desconhece o valor da ordem constitucional, que ignora o sentido fundamental da separação de Poderes, que demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do altíssimo cargo".

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, divulgou uma nota oficial em que, sem citar o governo nem o presidente Jair Bolsonaro, diz que “sociedades livres e desenvolvidas nunca prescindiram de instituições sólidas para manter a sua integridade”. “Não existe democracia sem um Parlamento atuante, um Judiciário independente e um Executivo já legitimado pelo voto. O Brasil não pode conviver com um clima de disputa permanente. É preciso paz para construir o futuro. A convivência harmônica entre todos é o que constrói uma grande nação”, diz o ministro.

Também sem citar o nome do presidente Jair Bolsonaro ou o vídeo compartilhado por ele convocando ato contra o Congresso, o ministro do STF Gilmar Mendes afirmou que “nossas instituições devem ser honradas por aqueles aos quais incumbe guardá-las”.

O ex-ministro Ciro Gomes (PDT-CE) cobrou, na noite de terça-feira, 25, que “todos aqueles que prezam pela democracia” reajam à convocação feita por Bolsonaro na última terça. Ele citou nominalmente o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). “É criminoso excitar a população com mentiras contra as instituições democráticas e sem causa nenhuma, a não ser sua agenda anti-pobre, anti-produção e entreguista de nossas riquezas aos estrangeiros. Vamos lutar pela preservação da Constituição e pelo Brasil!”, escreveu o ex-candidato à Presidência.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB) lamentou os vídeos compartilhados pelo presidente Jair Bolsonaro.

Adversário derrotado por Jair Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018, Fernando Haddad usou suas redes sociais para criticar sua atitude de divulgar pelo WhatsApp vídeos de mobilização para o protesto contra o Congresso e em seu próprio apoio. Para o petista, o presidente pode ter cometido “crime de responsabilidade”.  “Bolsonaro, ao que tudo indica, cometeu crime de responsabilidade previsto na Constituição que jurou respeitar mas, certamente, nunca leu”, escreveu Haddad em seu Twitter.

A deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP) fez post onde afirma ser “grave a denúncia de que o Presidente enviou um vídeo convocando a população p/ um ato contra o Congresso”. A deputada diz também que, “se confirmado, merece o repúdio de todos que defendemos a democracia”. Os internautas, no entanto, corrigiram prontamente Tabata Amaral, lembrando a ela que o ato não é caso de “repúdio”, mas sim de “impeachment”. Uma internauta lembrou ainda que a manifestação de Tabata era um “recado de Jorge Paulo Lemann ao capitão”.

A ex-candidata à Presidência Marina Silva (Rede-AC) cobrou o posicionamento de membros do Congresso sobre o que chamou de “uma convocação nitidamente golpista” feita pelo presidente Jair Bolsonaro em grupos de WhatsApp.

A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) divulgou nota condenando o presidente. De acordo com os juristas, o ato representa um atentado contra a Constituição e o livre exercício dos poderes constituídos, o que configura crime de responsabilidade conforme previsto no art. 85 da Carta. Em nota, a ABJD diz entender que a “investida contra as instituições sinaliza um golpe contra a democracia de nosso país, indicando uma ruptura, e requer, de toda a sociedade, uma posição firme que exija respeito ao Poder Legislativo e todos os seus membros”.

Em meio ao tumultuo causado na política brasileira por causa da convocação feita pelo presidente Jair Bolsonaro para ato contra o Congresso e o STF, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP) questionou se alguém iria chorar se caísse uma bomba de hidrogênio no Congresso. Pela rede social, a jornalista compartilhou um vídeo de 2018, em que o então deputado Jair Bolsonaro afirma que “se caísse uma bomba H no Parlamento, pode ter certeza, haveria festa no Brasil”.

Bolsonaro vem, sucessivamente, testando seus limites e a capacidade de resposta das instituições e da sociedade. Por exemplo, no dia 28 de outubro do ano passado, um vídeo postado nas redes sociais do presidente o comparou a um leão acossado cercado de hienas (animais carniceiros e que comem cocô), causando repúdio. Elas representavam o STF, os partidos políticos, os advogados da OAB, os bispos católicos da CNBB, a imprensa, entre outros. O leão era salvo por um outro, identificado como "conservador patriota" e, depois, trocavam afagos. Ministros do Supremo reagiram com irritação. No dia seguinte, Bolsonaro pediu desculpas, afirmando que o vídeo foi publicado por terceiros. Seu filho, Carlos Bolsonaro, retrucou – segundo ele, havia sido o próprio presidente. Como consequência, um grupo de manifestantes cercou o carro do ministro Dias Toffoli, dois dias depois, bateu na lataria e estendeu uma faixa "Hienas do STF".

Entre os Bolsonaro, o desprezo pelas instituições democráticas parece ser coisa de família. "Se houvesse uma bomba H no Congresso, você realmente acha que o povo choraria?", perguntou um dos filhos do presidente, Eduardo, recentemente em seu Twitter. O mesmo Eduardo Bolsonaro já tinha declarado, em 2018, que "se quiser fechar o STF […] manda um soldado e um cabo."

"Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos… e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!" A declaração de Carlos Bolsonaro, postada em seu Twitter, em setembro do ano passado, foi prontamente rechaçada por políticos de vários matizes ideológicos e pela OAB.

Essas e tantas outras declarações do clã Bolsonaro, como a de seu outro filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, defendendo um novo AI-5, não causariam tanto arrepio se o governo de seu pai não tivesse comportamentos autoritários e manifestasse desprezo por instituições democráticas.

Para Paulo Arantes, um dos mais importantes pensadores brasileiros, que formou décadas de filósofos na Universidade de São Paulo, em conversa com este blog no final do ano passado, no limite, Bolsonaro vai tornar as instituições flexíveis às necessidades de acúmulo de seu poder. E já teria feito isso com a Receita Federal, o Coaf, a Procuradoria-geral da República, a Polícia Federal. Questionado se o presidente odeia a democracia, Arantes cravou: "Odiar a democracia pressupõe que ele tem um conhecimento a respeito da natureza intrínseca daquilo que está enfrentando. Ele não está nem aí, isso não existe para ele. Para ele, isso é alguma idiossincrasia vocabular de jornalista, mais nada".

Vale lembrar: faz parte do repertório dos populistas acusar as instituições democráticas de não os deixarem governar plenamente. Todos fazem isso para enfraquecer o sistema democrático que os fez ser governo. Geralmente é um pretexto para acabar com o sistema democrático de "pesos e contrapesos", criado para equilibrar os poderes e essencial para o pleno funcionamento das instituições democráticas. Coisas que os populistas não querem.

Agora soam os alarmes. O STF, como também o Congresso, perderam uma ótima oportunidade para mostrar que há linhas vermelhas que ninguém pode cruzar no sistema democrático. Foi no dia 17 de abril de 2016, na votação pela abertura do impeachment de Dilma Rousseff, que o então deputado Jair Bolsonaro declarou: "Em memória do coronel Brilhante Ustra, o meu voto é sim." Ninguém quis punir Bolsonaro, naquela época, por ter atravessado a linha vermelha que separa a barbárie da civilização. Não punir tal ato foi o sinal claro de que tudo é permitido. Assim, abriu-se o precedente para denegrir a democracia brasileira e suas instituições. Ao mesmo tempo, a transgressão do dia 17 de abril de 2016 deu início à candidatura presidencial de Bolsonaro. Ao não defenderem a honra da presidente Dilma Rousseff e, ao mesmo tempo, da democracia brasileira, o Congresso e o STF plantaram a semente. Desde então, estão colhendo o que plantaram. E no próximo dia 15, a colheita deverá ser grande.

CARNAVAL DEMOCRÁTICO

A Estação Primeira de Mangueira trouxe um dos mais contundentes carros alegóricos da história do Carnaval carioca, na noite do último dia 23. Um Jesus Cristo negro e jovem, com cabelo platinado, crucificado e crivado de balas. Ao seu lado, um negro, um indígena, uma mulher e um representante da população LGBTQI.

"A Verdade vos Fará Livres" foi o samba-enredo. A passagem do Novo Testamento, presente em João, capítulo 8, versículo 32, é a mesma citada – a torto e direito – por Jair Bolsonaro em sua campanha eleitoral de 2018. Contudo, ela rareou dos discursos presidenciais na mesma proporção que os nomes do faz-tudo da família, Fabrício Queiroz, e do miliciano recém-falecido, Adriano da Nóbrega, apareciam ao lado do de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, em denúncias e investigações.

O desfile trouxe críticas não apenas ao presidente, mas também ao naco fundamentalista cristão da sociedade, que não deve ser, em hipótese alguma, confundido com a maioria dos evangélicos. Maioria que não espera um "messias de arma na mão".

A Verdade é que Cristo morre, todos os dias, santos ou profanos, através do genocídio de jovens negros nas periferias das cidades. Mas também no assassinato de indígenas, camponeses e trabalhadores, no campo, e de mulheres e da população LGBTQI, em qualquer lugar. Para o conforto de muitos dos que se autointitulam "homens de bem".

Caso nascesse nos dias de hoje, Jesus seria qualquer um dos representados no carro alegórico acima. E o mundo o mataria em seu nome.

Considerando que Jesus foi transgressor em sua época, se ele voltasse à Terra seria tudo aquilo que é considerado inferior, marginal, blasfêmico ou de segunda classe. Ou você acha que ele viria coberto de ouro e moraria nos Jardins ou na Barra da Tijuca?

Se houver um Deus, ele ou ela não morrerá de vergonha por causa daqueles que tocam a vida da forma que os faz mais felizes. Mas por conta dos que lançam preces e cantam musiquinhas para louvar seu nome – para, logo depois, censurar, ofender, cuspir, bater, esfolar e matar também em sua honra.

Esse Deus ou Deusa deve pensar que falta amor no mundo, mas também falta interpretação de texto. Pois está escrito no Evangelho de João, capítulo 3, versículo 17: "Deus enviou o seu filho ao mundo não para condenar o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por meio dele".

Se Jesus voltasse defendendo a mesma ideia central presente nas escrituras sagradas do cristianismo (e que, por serem tão simples, são descumpridas) e andando ao lado dos mesmos párias com os quais andou, seria humilhado, xingado, surrado, alfinetado e explodido. Seria chamado de mendigo e de sem-teto vagabundo, olhado como subversivo, alcunhado como agressor da família e dos bons costumes, violentado e estuprado, rechaçado na propaganda eleitoral obrigatória em rádio e TV, difamado nas redes sociais, censurado pela Justiça. Teria seu barraco queimado e toda sua vida transformada em cinzas em uma reintegração de posse. Seria finalizado como comunista, linchado num poste pela população em nome da fé e das tradições. Receberia socos e pontapés dos hoje autointitulados sacerdotes – uma parte dos supostos representantes dos interesses de Deus na Terra, que afirma lutar pelo direito de expressar suas crenças, quando quer o privilégio de vomitar seu ódio diante daquilo que acha que pode ameaçar seu controle sobre o povo. E, ao final, alguém ainda tiraria uma selfie ao lado de seu corpo morto para postar no Instagram.

"Eu tô que tô dependurado
Em cordéis e corcovados
Mas será que todo povo entendeu o meu recado?
Porque, de novo, cravejaram o meu corpo
Os profetas da intolerância
Sem saber que a esperança
Brilha mais na escuridão

Favela, pega a visão
Não tem futuro sem partilha
Nem Messias de arma na mão"

Nem desenhando fica tão claro.

Por Leonardo Sakamoto

Quando historiadores forem estudar o nosso tempo no futuro (e espero que, no futuro, historiadores não tenham sido trocados por gestores de grupos de WhatsApp), irão descrever ações populares de resistência à burrice e à ignorância como fundamentais para impedir que a sociedade mergulhasse de cabeça nas trevas. Isso foi visto pelo desfile da Estação Primeira de Mangueira e da São Clemente, no Rio de Janeiro, mas também no da Águia de Ouro, em São Paulo, que homenageou Paulo Freire, suscitando debates sobre o educador em pleno Carnaval. A escola de samba do glorioso bairro da Pompeia ganhou seu primeiro título do Grupo Especial no último dia 25.

Com o enredo "O Poder do Saber – Se saber é poder, quem sabe faz a hora, não espera acontecer", a Águia de Ouro trouxe a história do conhecimento para o Anhembi. Estampado em um livro à frente de um dos carros alegóricos, "Não se pode falar de educação sem amor. Viva Paulo Freire!". O suficiente para lembrar a importância do pernambucano, visto internacionalmente como um dos principais educadores do mundo, mas eleito pelo atual governo como um de seus piores inimigos. Aliás, duas coisas no carro alegórico devem assustar gente no entorno de Jair Bolsonaro. Primeiro, o poder emancipador de uma educação lapidada com amor. E, claro, livros. Que as luzes do Carnaval sigam iluminando os demais dias do ano.

Por Leonardo Sakamoto

DESTAQUES DO CARNAVAL CIDADÃO

A Acadêmicos de Vigário Geral brilhou com um carro alegórico com um palhaço Bozo vestido com a faixa presidencial e terno e fazendo gesto de “arminha” com a mão, numa alusão ao presidente Jair Bolsonaro. O enredo da escola era “O Conto do Vigário”, que ao mesmo tempo alude ao nome da escola e à expressão que designa enganação, trapaça.  Em outra ala, batizada de “Bloco Sujo”, a escola fez mais crítica política ao apresentar integrantes vestidos de palhaços e carregando estandarte com as palavras “educação”, “cultura”, “saúde” e “democracia”.

Marcelo Adnet, de presidente no alto do carro, encena a "flexão de pescoço" que Jair Bolsonaro tornou famosa — e a Sapucaí explode em risos e aplausos. A cena explica o ótimo desfile que abriu a metade final da maratona das escolas de samba. Com seu "Conto do vigário", a representante da Zona Sul apresentou algumas das críticas mais bem realizadas do ano. Especialmente a parte final, que encantou a plateia.

Já no Sambódromo em São Paulo, no desfile do Grupo Especial, a atual campeã, Mancha Verde, fez críticas diretas a Damares Alves, ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, e Paulo Guedes, ministro da Economia. A escola paulistana levou à avenida uma ala inteira em referência à famosa frase de Damares de que “meninos vestem azul, meninas vestem rosa”. Uma fantasia em um carro alegórico também chamou a atenção do público: uma empregada doméstica usando orelhas do Mickey com um enorme passaporte na mão, em referência à recente declaração de Guedes de que, quando o dólar estava mais baixo, “empregada doméstica estava indo pra Disney, uma festa danada”.

Os filhos do presidente logo saíram em defesa do pai e de seu governo no Twitter. Enquanto o vereador do Rio Carlos Bolsonaro criticou o “pessoalzinho financiado pelo pelo tráfico de drogas”, referindo-se às escolas de samba, o deputado federal Eduardo Bolsonaro replicou um tuíte do cantor Roger Moreira.

Diversos foliões foram às ruas do país dispostos a zoar o presidente Jair Bolsonaro, seu governo e até mesmo seus eleitores. Tiaras “sai bolsominion”, empregadas que foram à Disney, ‘xoxota de Bolsonaro’, “fiscal de cu” entre muitas outras fizeram sucesso em todas as regiões do país. Com a ajuda do internauta Kallil Oliveira, a foto selecionou algumas. Veja abaixo:

O cantor Tomaz Miranda, um dos fundadores do trio elétrico do bloco Simpatia é Quase Amor, aproveitou o microfone da GloboNews, que estava ao vivo, e gritou “Fora, Bolsonaro”. O repórter Pedro Neville acompanhava o bloco quando surgiu o protesto inesperado contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Neville não perdeu o rebolado e continuou narrando a transmissão como se nada tivesse acontecido.

https://www.youtube.com/embed/VmwLUFUV-5Q

Sob ameaça da deputada estadual bolsonarista Clarissa Tércio (PSC), que mandou a polícia prender mulheres do bloco que cometessem “crime de ato obsceno”, as feministas do Vaca Profana protagonizaram uma linda cena em Olinda, Pernambuco. Em vídeo de Ana Catarina Mousinho, dezenas de mulheres, muitas com os seios à mostra, cantam a música Anunciação, de Alceu Valença, de mãos dadas.

Em publicações no Facebook, a deputada bolsonarista fez ameaças ao bloco feminista, que classificou como “pervertidos”. “Ainda que surjam opiniões contrárias de alguns pervertidos, continuarei fiel a família de bem do Brasil que não aceita essa depravação. O pedido de policiamento é legítimo, pois esse tipo de manifestação infringe a lei (artigo 233 do código penal)”, publicou Clarissa no dia 22.

Há anos o bloco ocupa as ruas de Olinda com mulheres com seios à mostra reivindicando liberdade. “Se carnaval tem uma permissividade, por que quando chega na mulher isso é barrado?”, questionou a idealizadora Dandara Pagu, em entrevista ao site Leia Já.

O CARNAVAL DO “CALA A BOCA JÁ MORREU”

Nem na ditadura militar os governantes conseguiram tapar a boca dos que gritavam nas ruas durante o carnaval. O medo em diversas fases da ditadura inibiu o que muitos brasileiros pareciam dispostos a expressar – e por medo não o fizeram. Mas a crônica da época não guarda lembrança de censura bem-sucedida, ou de prisões, ou de cancelamentos.

“Abra a porta desse armário

Que não tem censura pra me segurar

Abra a porta desse armário

Que alegria cura, venha me beijar” (Daniela Mercury)

Os episódios mais notáveis de tentativa malsucedida de intervenção no carnaval aconteceram no final do século XIX e no início do seguinte. Em 1892, por causa de um surto de febre amarela, o carnaval foi proibido. Aconteceu assim mesmo. Em 1912, um gênio do governo teve a ideia de adiar o carnaval devido à morte do Barão do Rio Branco, o papa da diplomacia brasileira. Os cariocas pularam o carnaval na data prevista e, meses depois, também na data marcada pelo governo.

Carnaval é irreverência, anarquia, liberdade. E tais coisas nunca são a favor de tudo o que está aí. Sempre foi assim e assim será. Tanto mais quando o país atravessa “tempos estranhos”, segundo o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo. “Cala a boca já morreu”, decretou a ministra Cármen Lúcia, também ministra do Supremo, no julgamento da ação sobre a inconstitucionalidade de autorização prévia para biografias. Morreu, embora muitos não se conformem com isso. Outra vez morreu quando as escolas de samba abriram o desfile na Marques de Sapucaí, no Rio.

A Estácio de Sá, criticou a destruição do meio ambiente para extrair minérios, tema sensível ao governo.

“Favela, pega a visão

Não tem futuro sem partilha

Nem Messias de arma na mão

Favela, pega a visão

Eu faço fé na minha gente

Que é semente do seu chão” (Samba da Mangueira)

A Unidos do Viradouro, empolgou as arquibancadas ao exaltar o empoderamento feminino e homenagear as mulheres que lutaram para construir o Brasil. Seu samba enredo foi o mais bonito e o mais cantado nas arquibancadas. A Mangueira apresentou o enredo mais politizado. A foto da menina Ágatha Félix, de 8 anos, morta no ano passado durante uma ação policial no Complexo do Alemão, estampou o manto do Dom Sebastião dos Pobres do figurinista Leonardo Diniz levado à avenida para Paraíso do Tuiuti. O último carro da escola homenageou vítimas da violência e do descaso do governo do Rio com a segurança pública. A Acadêmicos da Grande Rio cantou: “Pelo amor de Deus, pelo amor que há na fé, eu respeito seu amém, você o meu axé”. A União da Ilha do Governador foi no mesmo embalo: “A voz do rancor não cala meu povo, não! Sou mãe! Dignidade é meu destino”. E a Portela, a maior colecionadora de títulos, amanheceu advertindo:

“Índio pede paz mas é de guerra

Nossa aldeia é sem partido ou facção

Não tem “bispo”, nem se curva a “capitão”

Quando a vida nos ensina

Não devemos mais errar

Com a ira de Monã

Aprendi a respeitar a natureza, o bem viver

Pro imenso azul do céu

Nunca mais escurecer”.

FRASES DA SEMANA

“Bolsonaro, que faz um discurso da moralidade, é um corrupto. Ele, que ocupa a presidência da República do Brasil, desviava o pouco que havia no seu gabinete. Tinha seis funcionários fantasmas que assinavam recibo e ele botava o dinheiro no bolso”. (Ciro Gomes, PDT-CE)

“Salvação, sim. Salvadores, não”. (Ruy Barbosa, jurista, político, escritor, diplomata, coautor da constituição da Primeira República e membro fundador da Academia Brasileira de Letras) 

A gravíssima conclamação, se confirmada, revela a face sombria de um presidente q desconhece o valor da ordem constitucional, ignora o sentido da separação de poderes e demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do cargo que exerce”. (Celso de Mello, ministro do STF)

“Sou defensor da liberdade de expressão, valor importante na Democracia. Mas como cristão não creio ser razoável usar a figura de Jesus, filho de Deus, da forma que a escola de samba Mangueira fez. Respeitem os cristãos”. (General Luiz Ramos, ministro da Secretaria de Governo)

“Não adianta mandar o cara tomar aqui, tomar ali, gente. O negócio é ir pra rua. É bobagem, a gente não tem que mandar nada, tem que ir para a rua, é na rua que a gente faz a reviravolta, nas ruas!”. (Elza Soares, cantora) 

“Temos leis que regulam a greve no Brasil. Agora, as pessoas questionam, mas as forças de segurança têm direito à greve? Direito à greve é direito à greve”. (Damares Alves, ministra Da Mulher e dos Direitos Humanos, em oposição à Constituição que proíbe greve de forças armadas) 

Com informações de Leonardo Sakamoto, Josias de Souza, Ricardo Noblçat, Reinaldo Azavedo, Carta Capital, Outra Saúde, Sul 21, o Globo, BR-18, Folha de SP, Fórum, Veja, Dora Kramer, BRPolítico, Vera Magalhães, Marcelo de Moraes e Radar

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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