28/03/2024 - Edição 540

True Colors

A Justiça que vem mais de uma década depois, mesmo que para outros alvos

Publicado em 08/04/2016 12:00 - Guilherme Cavalcante

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"Ta achando que me ofende me chamando de viado? Ofensa para mim é ser comparado a um de vocês".

Há alguns dias eu não consigo parar de pensar nesta frase. Queria ter conhecimento e coragem para pronunciá-la em algumas das dezenas de vezes que fui motivo de chacota na escola. Mas, fui vingado, no sentido mais 'tarantiniano' possível, se excluirmos as poças de sangue.

Ela foi dita por Lucas Chaves, estudante de direito em Barbacena (MG), que decidiu enfrentar os homofóbicos da sala após ter fotos compartilhadas em grupos de WhatsApp em contexto difamatório. Lucas chegou até a fazer reclamações na coordenação do curso, mas quando soube, por um amigo, que sua imagem era motivo de piada entre colegas, decidiu enfrentá-los. O resultado você vê no vídeo abaixo:

Talvez quando eu era adolescente (há cerca de 15 anos) pudéssemos considerar algo já esperado colegas pegarem minhas fotos e vídeos e saírem divulgando por aí com o objetivo de me ridicularizar, caso as tecnologias de hoje já existissem naquele tempo. Mas, em 2016, o entendimento de que isso é inadmissível já foi, inclusive, pacificado.

Lucas fez justiça com o meu passado ainda doloroso. Fez justiça com o passado de milhões de gays que sofreram bullying na escola – pessoas que fogem como o diabo foge da cruz quando inventam de reunir a turma ou criar grupos de reencontro no WhatsApp. É que para nós não há muita coisa boa a se lembrar.

No meu caso, Lucas aliviou um nó na minha garganta que há anos me atormentava. Ele disse as palavras que queria ter dito e teve a postura que eu queria ter tido. Lucas é o resultado mais claro de décadas de luta e empoderamento de uma identidade gay, nada mais que isso.

Lucas é o amigo que eu quero ter na hora do recreio.

Em sua página pessoal, ele revelou que até admirou-se com a repercussão do vídeo. Foi convidado a dar entrevistas por canais de TV, sites e revistas. Seu Facebook extrapolou no número de amizades.

"Ainda extremamente honrado com toda a repercussão causa pelo meu vídeo nas redes sociais e vendo todos que foram tocados pelas minhas palavras, meu gesto e minha atitude, resolvi criar essa página no Facebook para que as pessoas tenham melhor acesso à mim, visto que na minha página pessoal extrapolou o número de solicitações de amizade e que algumas mensagens que recebo não estão chegando até mim ou estão sendo apagadas quando atinjo certo número. Para todos que querem me mandar uma palavra de carinho ou simplesmente conversar comigo, através da página eu poderei dar uma atenção melhor à todos e, é claro, agradecer diretamente a cada um de vocês por todas as coisas incríveis que tenho lido e ouvido. Vocês são incríveis, obrigado pelo apoio e vamos continuar seguindo com essa luta que não é só minha, mas de todos nós contra toda forma de preconceito. Obrigado pelo apoio! Espalhem o amor, não o preconceito!".

Incrível é você, Lucas. Tudo que resume meu sentimento diante do seu até é gratidão. Muito obrigado.

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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